Tabu com Bruno Nogueira: "Quando nasci os meus olhos eram enormes, podiam rebentar. Conseguia ter alguma visão, mas aos 23 anos fiquei sem ver totalmente"

Joana Beleza Joana Beleza 4/4/23 - Episode Page - 1h 9m - PDF Transcript

Bem-vindos ao Tabu, um programa onde nos rimos sobre assuntos que vocês provavelmente acham que não são para rir.

Vou passar esta semana com quatro pessoas cegas e juntos vamos tentar perceber se é ou não possível rir da cegueira.

Desculpem, foi uma pesteira para o alho.

Vamos só para... Desculpem, eu não consigo. Mal até para ali, ok? Quando quiserem para de leite.

Tabu é algo proibido, interdito, um assunto que não se pode ou não se deve falar.

Mas aqui no podcast Tabu não há tabus.

Nem de assuntos, nem de fazer humor com eles.

Há quem acha corajoso, mas também há quem acha polémico, escandaloso e controverso.

Já o novo Peugeot 408 não tem nada de polémico, escandaloso ou controverso.

Este espaço publicitário é por isso um rar momento deste programa em que podemos todos estar de acordo

com a perfeição das suas proporções, a harmonia das suas linhas, o brilho da sua performance.

Marc conteste Drive num concessionário pajú e com provio. Mas primeiro, ou seja, este episódio.

Coisas como espalhar manteiga.

Isto é um tema muito polémico.

Muito delicado na minha vera.

Não sei se é a palavra, mas é delicado exatamente.

Mas delicado porque vocês não conseguem sentir a quantidade.

Mas não estás a espalhar. E eu ainda tenho a particularidade que não gosto de encontrar muita manteiga junto, tá?

E então, normalmente, se eu estivesse sozinha, é seguro que não como bom como manteiga.

E é delicado porque cada vez que eu vou a algum sítio, é delicado porque tenho que estar sempre a pedir alguém para espalhar a manteiga.

Jonto.

Você não quer estar espalhando a manteiga no teu pão?

Não, eu quero. Se me apetecer para um outro...

Nunca acho que espalhe a manteiga.

Não peça qualquer um.

Sim, claro. Exato.

E vocês também sentem aquela coisa de postarem na presença de alguém cego.

Falarem de uma maneira diferente, ou mais alto, porque acham que são surdos também.

Mas é curioso.

Ou com condescendência.

Com condescendência, sim.

É, mas depois falam com uns coisas gritos, é um bocado...

Mas essas pessoas não sabem isso.

Não sabem uma série de coisas que era bom saberem agora através de vocês.

A discrimição positiva também tem-se essa...

Como é que é essa a discriminação?

É dizer... Pai, é tu, imagina.

A discriminação é para fazer tudo.

Pegas na faca e faz assim.

Espectacular.

Quando eu fui levar a vacina do Covi, começou a falar comigo, oh lá, então...

Vou fechar a manguinha para cima.

Você já estava drogada?

Acho que é isso. Tenho 32.

Ah, parece uma miúda.

E depois para a minha mãe, oh olha, se ela tiver dores dele...

Oi, a toa está?

Olha, eu entro que tenho que estar dando a coração aos que é isso.

Não sei se faz mal ou não.

Pai, é assim.

Ai, ai...

Um bocadão vomitar.

Tá aqui uma cadela. Não sei se estás a par disto.

Gostou. Minha cadela guia. Acompanha-me para todo lado.

Há oito anos.

São os teus olhos, não é?

Sim, é como se fosse uma pessoa, entre aspas, que me ajuda e que me guia para sítios,

aliviar-me de coisas e te posto.

Já salvou-se de situações complicadas?

Já a mãe pediu várias vezes a atravessar a estrada quando não devia.

Acho que se às vezes não fosse ela.

E se eu não confiasse tanto nela, já me tinha acontecido coisas.

Queria começar a perguntar qual é a tua deficiência.

Ou seja, o que é que te aconteceu?

Não sei se prefereis que se chama de deficiência,

se há outro tempo deixe-me mais confortável.

Eu nasci com o glaucoma, com o gênico.

Tipo a doença dos velhos, mas em criança.

Os meus olhos estavam enormes e podiam reventar-te.

Foi operado várias vezes para abaixar a tensão ocular.

Consegui ainda ter visão.

Mamas, cores e luzes e formas disso durante a minha infância e até ser adulto.

E depois, aos 22 e 23, fiz uma operação,

trouxe planto de córnea para tentar tirar a mácula toda que eu tinha na córnea por causa do glaucoma.

Mas a coisa não correu... Então, era um risco.

Era um 50-50, perdi.

E fiquei sem ver totalmente, do outro esquerdo.

E o outro já não via nada.

Sente que até lá o que tu vias era...

Era formas, luzes.

Dava para jogar alguns jogos de computador.

Dava para ver a televisão que tu conseguias.

Sim, não com o detalhe que tu veias.

Claro.

Mas conseguia ver algumas coisas.

Aprendi a ver com aquilo.

Aprendi a interpretar aquelas formas e aquelas luzes para coisas.

Fiz muita coisa, fiz.

Ainda com isso, acho que aproveitei bem a visão que tinha.

Não consegui distingir uma pessoa pela cara.

Sim.

Percebes?

Às vezes consegui distingir pelo cabelo.

Ou isso, se alguém que eu conhecesse muito bem.

E a tua família, como é que reagiu essa perda de visão?

Porque há dois caminhos, não é?

Ou se tornam ultra-protetores?

Ou então, preparam-te para a vida?

A minha mãe, até, é a parte da pessoa que fez as duas coisas.

Por um lado, produzi muita coisa,

mas por outro também me proporcionava um monte de experiências.

Se calhar, outras crianças não tiveram.

E os tuas pais tentavam que tu desafiasse os obstáculos mais?

Sim, mais.

Mas com muitas experiências diferentes.

Eu lembro de ter 10, 12 anos e conduzir uma mota d'água.

Ou andar de bicicleta.

Sim.

Percebes?

E tive sorte?

Tive sorte, também é preciso.

Sorte com o quê?

Sorte com a família.

Com a educação que tive, com isso tudo.

E a minha avó deixou de trabalhar para tomar conta de mim, em criança.

Desstimulavam-me até o infinito.

Ok, houve muita coisa que eu não pude fazer, não é?

Mas também houve outras que eu fiz e isso não devia.

Eu lembro de fazer uma corta-metragem com os amigos meus.

E eu filmei partes porque não havia mais nenhum gajo para filmar,

porque eu estava... era o exártor.

E ter perdido alguma informação,

eu acho que tive mais dificuldade em aprender certas coisas,

porque eram sempre preciso adaptações e é pai para muito que se tente

há coisas que escapam.

E a socializar com outras crianças?

Eu acho que não.

Eu nunca me senti completamente excluído por pessoas em particular.

Havia exclusão, claro, que senti discriminação em muita coisa.

Às vezes até inconsciente dos miúdos.

Agora, se meninos maus a fazerem male,

eu acho que não, até porque eu minimamente sabia me defender disso.

Houve coisas que me gostaram, as primeiras...

as primeiras coisas que os miúdos.

Imagina, uma menina que tu gostas e ela diz que não gosta de ti.

Eventualmente tu achas que é porque...

porque é chego.

Para ti, essa era a única resposta.

Não seria necessariamente a única resposta,

mas está sempre, menos na adolescência, não é?

Como qualquer coisa que...

ela deve gostar do outro, porque eu vou até canar.

Não sei o que ver.

Não sei o que ver, e levar-la para si,

e fazer as coisas todas, e ver como é que ela está mais...

mais giro ou mais feia.

Você tem que aprender a lidar com isso, não é?

Agora, não é isso.

Faça com que haja recursos,

ou que seja, pelo menos seja a razão, diria essencial a isso, não.

Não acho.

Até porque se for, também não queres essa pessoa, né?

Claro.

Bem, Margarida, eu vou tentar explicar-te a casa,

e se tu queres, eu vou me sentir muito culpado,

mas não vai acontecer.

Aqui temos...

pode-te vir para aqui para a frente.

Queres que eu chamo o cão, não é?

Sim, pode-te ser.

Temos uma menina de grau aqui, que é um...

Ok, eu dou conta.

Tu desceso, descaso, eu dou conta.

Que é uma oliveira que tens que passar ao adireto à esquerda.

Quer dizer isso?

Que é a pessoa.

Diria para nós quando é olivante.

Tens quatro portadas de vidro,

vamos tentar entrar pela que está aberta.

Viras à esquerda, à direita é a sala,

e à esquerda, para aqui, para onde estamos aí,

tens um corredor com vários quartos,

e o teu é aqui, o primeiro à esquerda já,

que à direita tens a casa de bem-mal,

entras no quarto.

Ok.

Aí vais ter um banquinho.

Um banquinho, e as sanitas há de ser...

É aqui à tua esquerda.

No pédio de luz, né?

Exato.

Exato.

E à esquerda, é o lavatório.

Lavatório.

É lá o fome, e à tua frente está as toalhas,

os toalhés.

É aquilo que tu muito queria explicar-te.

Porque é uma tigelinha para comer.

Não, não.

É um mini bar.

O outro é um quadrilétrico.

Ah, isso é louco.

Cadê?

Olha lá.

Olha lá ver se não foste logo lá.

Olha lá.

À tua esquerda tens a cama.

Já vais sentir-la aí.

Exato.

Pará-se-lão.

A televisão.

Ok.

E há uma caminha que fizeram um procão.

Oh.

Ah, que engraçada.

Você já tiveram relações com pessoas que vêm em pessoas cegas?

Sim.

Todos?

Não.

Eu nunca tive relações com pessoas cegas.

Ok.

Então podem fazer uma avaliação...

Imediata.

Imediata de vez em vez de uma pessoa ao longe.

Exato.

Que trocas a olhar.

Essa coisa que querias desperta uma química.

Perdes isso?

Não tem.

Tem muitas outras coisas que vão apurando mais do que eu.

Três certamente.

Então tu não vais a um café e está ali alguém sozinha.

Desculpe.

Posso me sentar?

Posso te conhecer?

Não.

Posso te conhecer?

Não.

Mas não faz isso.

Eu lembro de seguir a primeira vez com a minha cadela.

E um colega meu começou a chamar a minha cadela Pussy Magna.

Ah.

Chamou-lhe o quê?

Confesso.

Pussy Magna.

Ah, pois.

Pois.

O que eu não falo em inglês é um Iman de...

Pipi.

Pipi.

É.

Tu, ao contrário das outras três pessoas,

é a única pessoa que já nasceu cega.

Sim.

O que é que fez com que tu nascesse cega?

Há um nome que é...

Eu sei dizer muito bem,

mas caralho tu dizes com mais propriedade.

Ah.

A Maurose, congénita de Leber.

De Leber.

De Leber.

Eu sabia que era de Leber.

Tenho a ver com as células da retina que não funcionam.

Portanto, nunca viste?

Não.

Tinhas alguma percepção luminosa?

Tenho percepção luminosa.

Ok.

Ah.

O que aconteceu foi que descobriram aos dois meses que eu não via.

Quando os bebés nascem, fazem os testes com as luzes.

E eu reagi.

Ah.

O que depois a minha mãe percebeu foi que eu não seguia os movimentos dela.

E então foi aí que se percebeu.

Tens ideia de como é que foi a reação de tua família?

Ficou toda a gente muito mal.

Eu sei que houve muito choro.

Muito...

Não é?

Caiu-lhes tudo ao chão.

Eu fui a primeira filha.

Nunca ninguém espera uma coisa assim.

Houve muitas tentativas de procurar o que é que se podia fazer.

Curas, operações.

Graças a Deus que não me lembro de nada disso, não é?

Sim.

E destiram essas operações?

Não, não.

Não há operações nenhuma.

Ok.

Até porque não havia mesmo nada a fazer.

Falou sem ir à Cuba.

Felizmente, nunca foi nada dissavante.

Porque, na verdade, eu considero que estou bem assim.

E acho que ia ser só chato e desagradável para mim.

Mas tu sentiste esse peso alguma vez a tua família te fez sentir esse peso?

Não, não, não.

Quando perceberam que não havia mesmo nada a fazer, aceitaram a questão.

E a partir daí foi sempre já uma coisa muito normal.

E como é que foi para ti, não tendo a visão, ir descobrindo o mundo?

Isso é uma pergunta muito interessante.

Porque, na verdade, eu acho que é mais ou menos como acontece para as pessoas com visão.

Não é?

É da mesma maneira.

Tenho outros sentidos.

Os meus pais sempre me incentivaram a fazer coisas, a mexer na lama,

a cair se fosse preciso, a brincar na rua com os outros meus.

Portanto, foi igual aos outros, mas sem visão, não é?

Nunca senti que me tentassem por dentro de uma bolha nem nada disso.

Tu andaste em duas escolas, pelo menos, não é?

Andaste, primeiro, numa escola dita, normal.

E depois foste para Alan Keller, que é de ensino de grato.

Tu entre uma e outra sentiste a diferença no tratamento com ti?

Sim.

Na medida em que, no Alan Keller, não é?

Havia mais cegos.

Era uma escola que tinha tudo aquilo que era necessário.

Mas foi onde eu notei que havia mais uma separação entre os cegos e os normas visuais

do que nas outras escolas, onde era só eu, não é?

Os cegos acabavam por estar um bocado mais uns com os outros.

Era uma coisa que eu não gostava.

Enquanto que nas outras escolas onde andei, isso nunca foi uma questão.

Aliás, quando passei para o ensino secundário,

os problemas que tive por causa da minha cegueira foram mais

ao nível dos professores do que, provavelmente, dos meus colegas.

E que problemas eram esses?

Houve professores que ficaram muito preocupados.

Havia muitas reuniões com a minha mãe.

Como é que nós vamos lidar com esta pessoa?

Devíamos ter formação especial para lidar com estas pessoas.

Havia uma professora que queria a educação física,

que eu usasse uma corda para correr.

Eu normalmente ia de braço-dade com alguma colega,

ou de mão dada, porque é mais fácil.

E ela dizia que não, tinha que ser com uma corda,

porque era assim que os atletas olímpicos,

ou paralímpicos, não é?

Faziam e era assim a forma correta e evidenciava mais a diferença

que na altura em que uma pessoa é adolescente,

e isso me ensinou a ser diferente.

Obrigado, boa noite.

Parem, parem, eu não mereço, eu não mereço.

Bem-vindos, hoje falamos de cegos.

Queria dizer que eu até estou convido

de eles terem conseguido vir cá até os quatro,

porque eu estava esperado de vos ter de ir apanhar tipo Pokémon,

espalhados pela cidade.

Tanto uma grande salva de palmas para estas quatro topeirinhas

que chegaram aqui.

Bom, para começar, tenho aqui uma adivinha para vocês,

que atenção, é o humor diferente,

foja aquilo que eu acredito, mas eu acho também importante

a ver este tipo de humor em horário nobre,

também para atrair aquele público que tirou no ano ou ano à noite.

O que é que vai?

O que é?

Vamos descer esta piada.

Como é que se chama?

Um bacalhau que se pode comer com as mãos.

Um bacalhau.

Abra ela.

Obrigado.

Viram?

Enfim, faz falta, é um humor que não ofende,

não dá direto a lambadas,

que é importante que os tempos correm.

Há tantas pessoas que se usam sobre cegos.

Por exemplo, o pior cegue é aquele que não quer ver.

Já ouviram isto?

Hum, será que é mesmo o pior?

Será?

Será que o pior cegue não é aquele que diz?

Tira mesmo a bebê que eu opanho.

Vai!

Ah, quase.

Mais uma expressão que é

não tem dinheiro para mandar cantar um cego.

Mas quem é que quer gastar dinheiro com isto?

Não faz sentido.

Se eu tivesse dinheiro, eu não pagava um cego para cantar.

Se eu tivesse dinheiro, eu não pagava um cego

para fazer os cem metros barreiras.

Ah, c***.

Ah, c***.

Também queria perguntar aos meus convidados

o que é que vocês estão a achar deste podcast?

Agirmo?

Porque para eles é tudo um programa de rádio.

Portanto, se amém sentirem, querem saber o trânsito,

é para levantem o braço, que eu digo.

Também vou vos dizer o que é que me irritem nos cegos,

que é, eu acho que eles são mal formados.

Nos olhos.

Mas, também, moralmente,

por exemplo, eles conseguiram arrajar uma desculpa para o assédio.

O que é?

Então, o senhor estava a palpar?

Não, não.

Não, não.

Estava só a ver se esta carruagem faz ligação com a linha azul.

Mas o senhor está agarrado às minhas mamas?

Pois estou, pois estou,

porque o senhor não me disse se isto tem ligação com a linha azul.

Então, mas nós estamos no continente de amadora?

Não, não foi isso que eu perguntei.

Então, o que é que...

Não dirão, fiz os dois.

E no pipi, fiz.

Foi por causa da igualdade de género.

Eu nasci com baixa visão do olho direito.

E já completamente cega do olho esquerdo.

Depois, mais tarde, por volta dos 13, 14,

é que fiz uma cirurgia e seguei também do olho direito.

Mas, atualmente, não consigo ver nem luzes,

nem, pronto, só saber assim um bocadinho de álcool.

Às vezes, tendo a ver assim um bocadinho melhor.

E vejo projetores, não é?

Sim, ilusas e cores.

Sim, e pessoas a voar?

Não, isso não.

Eu nasci com um problema que se chama glaucoma,

que é a retenção de líquidos no globo ocular,

que faz aumentar a pressão ocular

e que, por norma, por consequência, leva à cegueira.

O meu processo de aceitação da cegueira foi relativamente rápido.

Como é que se conta isso só aos pais?

Eu acho que eu nunca contei.

Tipo, eu não estou a ver.

Eu acho que eles foram percebendo,

porque os meus irmãos então punham algumas coisas à frente,

tipo, a ver se eu batia ou não.

Por exemplo, perguntavam-me imensas vezes,

era as cores das roupas.

E eu pegava nas roupas como se fosse vê-las mais perto.

E, como eu me lembrava...

Da textura.

Da textura e do material.

E não sei o que.

Estava quase sempre nas cores.

Mas, claro, que não era sempre, não é?

E por que que não contaste logo?

Porque eu acho que eu tinha muito medo da reação deles.

Tinha muito receio que eles ficassem sem saber

como lidar com a situação.

Embora fosse um pensamento estúpido,

porque a minha irmã também é cega.

Portanto, eles já tinham experiência com ela,

mas é como se eu tivesse medo

de que repercussões é que isso tivesse neles.

Querias-te poupá-los dessa...

Sim.

E afarça o drogopai 15 dias.

Eles começaram logo a tapar.

Como é que isso influenciou o teu crescimento?

Em termos de infância, eu acho que, tipo,

até ali aos 10, sentia que conseguia fazer

as coisas todas... qualquer outra criança fazia.

Tive sempre colegas espetaculares

e nunca me fizeram sentir a diferença.

Claro que tinha ajustes, por exemplo.

Eu não conseguia ver pouco a adram

e usava uma espécie de um monóculo.

Tinha isso e tinha, por exemplo,

uma lupa pequenina de mão

quando precisava de consultar o dicionário

ou quando havia coisas mais específicas,

por exemplo, os mapas.

Acho que só mais tarde,

quando começou assim mais o processo de cegueira,

quando transitei de escola do primeiro ciclo

para o segundo ciclo, já eram mais alunos.

E alguns deles, obviamente, que nunca tinham contactado,

aliás, era única na escola com deficiência.

E houve, assim, algum caso de bullying

dos cientistas que têm alterado a tua maneira

de encarar a docência ou a infância?

Logo, imediatamente na altura que ceguei.

Em termos da minha turma, foi-se superfiste,

mas havia um rapaz, um muito específico,

que aquilo se começou a tornar incomportável.

Portanto, até ao dia que, efetivamente,

eu me passei um bocado e respondi-lhe.

Não correi muito bem, ele ficou com um dente partido.

E eu fiquei com os meus pais a terem que ir à escola.

Era tudo relacionado com a questão da cegueira,

era, por exemplo, eu entrava em algum sítio

e muitas vezes ele dizia assim,

olha, chegou a cega, olha, lá vem a bolinha de golf,

por causa do meu olho.

Depois ele dizia sempre uma do género,

alguém liga a luz, senão ela não vai saber onde está.

E isto, sempre, sempre, sempre, sempre.

E depois ele começou a acumular, acumular, acumular.

E tu desce de um banano?

Sim.

E foi em plena biblioteca da escola,

porque ele estava sentado no sofá e eu entrei e pensei,

está mesmo ali a jeito que ele, dali, não vai sair rápido.

Claro que a panela podia ser assustada.

Eu tinha que ter assustada que assustava-se não,

então quer dizer, depois...

Valhar humilhação, se falhasse?

Já, tanto comigo, se eu depois falhasse não podia ser.

E ele estava sentado e como é que tu sentiste que ele estava mesmo ali?

E ele estava sempre pela voz.

E eu ir passei, passei, tipo assim, um bocado ao lado.

Você se fala mais?

E ele ainda se estava a rir, e eu comecei, tipo, a picar,

aquela coisa de, vai lá, fala mais, fala mais,

para eu dizer a certeza.

E eu depois obviamente já estava furiosa,

acho que ainda ele partiu os óculos,

aquilo foi assim uma coisa completamente...

fora, eu acho que perdi completamente o controle.

E sabes o que é que é mais divertido?

É que as bananas agora deve estar a ver isto.

Provavelmente, provavelmente.

Não sei se ele se lembra, se já foi.

Lembra-se, lembra-se.

Provavelmente vai que ainda...

Se leva uma banana no pecinho, não te não se lembra.

Lembra.

E agora vamos escorregá-lo de vagarito.

Posso?

Eu apoio.

É?

Sim, vamos de vagarito.

Ok, festas ao cavalo.

Albará.

Agora aqui dá o maior passo que conseguis para a frente.

Isso, boa, perfeito.

Eu nos disse em sempre o mínimo de uma divisão,

para ter a divisão de um olho,

as caras do esquero com sete,

e do outro aos 18.

As operações que fiz rolaram muito bem.

O pós-operatório roubou mal.

Isto era para resolver um problema de tensão ocular elevado,

de qualquer forma.

Pai, o pós-operatório roubou bastante mal,

fez uma homenagia muito grande,

e basicamente foi o que fez.

Mas os seis perdes assim a visão?

Ao sete, perdi, porque dei uma queda

e decidi observar um vasto cimento muito perto,

com a testa.

Ficou quase cicatriz.

E basicamente a pancada foi de tal maneira violenta

que me fez,

que me provocou um dosplamente retina no olho esquerdo.

Mas também, por causa dessa pancadão,

comecei a ter problemas no olho direito.

Pai, fiz e me enviesa de uma forma perfeitamente normal,

só para o pessoal ver no olho direito.

Até aos 17 anos e qualquer coisa.

Para ter a divisão ali na transição entre os 17 e os 18.

Passei a melhor sensência.

Praticamente sem jogar futebol,

praticamente sem fazer educação física.

Que havia o prêmio de tuqueria e de perder a visão do outro olho?

Exatamente.

Mas assim, de vez em quando, a gente entrava,

e ia fazendo desminhas e coisas.

Mas, para exemplo, nos caras hospitales.

Eu passei a melhor sensência a ouvir bocas todos os dias,

a levar cálculosos todos os dias,

de vez em quando, levar uma outra tareia um bocadinho mais.

Por causa disso, porque tinha um olho saliano.

Desde a cena verbal,

à cena física, que aconteceu algumas vezes.

E qual foi assim o mais estormado que aconteceu fisicamente?

Olha, foi na rua.

Estava aí para casa da escola.

Passaram um grupo de miúdos.

O miúdo tinha um termo de idade.

Era uns cinco, seis.

Houve um que começou a gozar comigo por causa disso,

por causa da cena do olho.

Tudo o que eles tinham na mão

eram o laranjas ou comentinas,

ou tangerinas, o que é que foi.

Não todos a comer.

Desataram a retirar-me todos

com as laranjas e as comentinas

ou o que era aquilo, se eu não me lembro.

Pai, eu sei que aquilo foi o que me bateu mais.

Você teve isto mais humilhado?

É para sim, porque tem sido um mês à rua.

E depois, como pessoas a passarem,

é tudo bem.

Obviamente, tem que ser nada, né?

Nesta situação, já raramente alguém faz uma coisa.

Então, aqui tens um dexinho com duas cadeiras.

Ok.

Aqui eu estou frente.

E aqui vão fazer um centro comercial.

Já começaram aqui a fazer os pilares do centro comercial.

O que é que tens?

Árvores, pinheiros,

a ideia e um autódromo.

Vou fazer aqui um autódromo de...

Ok.

Tipo autódromo da comporta.

E passas.

Pronto.

Um Cameraman.

Agora, grande vantagem é que, às vezes,

estas blindes não funcionam bem.

Não vais passar por isso.

Não vou.

Vai estar um senhor sempre só olhar para ti.

Um senhor.

Em cerca de 80 anos.

Ok.

E mesmo durante a noite, ele está aqui.

Sabemos que seu nome é Julio?

Julio.

Sim.

E está sempre aqui.

Isso vai ser muito bom.

Se tem a roupa toda, não te vou dizer que tem.

Porque...

É só esquisito.

Mas pronto, não.

Ele não te vai mudar.

Não te vai.

Não tem que mudar.

Ele é silencioso.

Houve, às vezes, uma respiração...

ofegante.

E o que acontece é, quando for assim, não te mexas.

Uma vez que tu não tens memória visual de objetos,

de pessoas, o teu sonho é como?

Os meus sonhos são como a minha vida no dia a dia normal.

Não vais nos sonhos.

Há pessoas que dizem que sim, mesmo nunca tendo visto.

Mas não, no meu caso, é muito igual ao dia a dia.

Nunca em nenhum sonho tu sonhaste que vias?

Não.

Nunca aconteceu.

Querem saber qual é a definição de tragédia?

Eu digo-vos, é o século de nascença nunca ter visto pornografia.

Podem ter ouvido que o abucado no camarim tinha aquilo alto.

Mas ver nunca viram.

Há aqui pessoas que nunca, mas nunca viram um pipi.

Já para não falar de chegos.

Eu estou só...

Agora não estava a falar.

Eu até acho que comecei a não fazer ideia,

por exemplo, como é que eles assinavam documentos.

Eu pensava que era pronto para assinar aqui.

Não, isso é parede.

Isso é a minha testa.

Eu até achei que não ia ser assim, que não aparecia as pinturas repestas.

Tinha sido um século de uma escritura em foscoa.

Olha, para ele foi muito bom esta piada também.

Vou fazer para ti, tu és muito bom para ele.

Agora, qual é a pessoa em quem os chegos

têm de confiar mais na vida toda?

É pá, no cabeleireiro.

Porque, atenção, ele pode destruir-vos da vida

e vocês nem nunca vão ver.

Literalmente, nunca vão saber o que está a acontecer à vossa vida.

Eu posso te fazer aqui um pitó,

ou californianas,

e vocês, todos rasudos na rua, acham que está tudo bem.

E não está.

Na verdade, tento confiar muito em toda a gente

para se vestirem, por exemplo.

Aliás, me quiserem ver divertido.

O que é que tem que fazer?

Dê-me só um cego,

um guarda-roupa

e um funeral.

Só.

Como é que ele quer ir?

Como é que você quer ir?

E ao todo preto, eu, sim senhor,

depois visto-lhe um coleto com flores e uma gravata de mica, hein?

Vai? Siga.

Siga, pô funeral.

Para ele, saltos também é perfeito.

Ah, já só temos esta camisa roxa com um cão verde.

Pois, isso não interessa.

É quentinha.

Se for, põe-me no saco.

Dá-lhe só pelo umbigo.

Ah, destaco depois de cobrir aqui um pandaloça.

Depois de os ouvir,

também percebi que o mercado do cão guia está muito explorado.

Eu tenho uma proposta, que é

o frango guia.

Pronto, não sei.

Espera, até pode ser um frango da guia-guia.

Fica a ideia.

É vossa, é vossa.

Agora, uma coisa que é preciso reconhecer,

que é, os cegos são as pessoas mais românticas do mundo.

Porque eles, quando estão com as mulheres,

não têm olhos para mais ninguém.

Sabe quando uma pessoa se distrae e bate com um mindinho no móvel

e dói imenso,

a gente tem que imaginar os deles.

Os próprios cegos já devem mandar logo tirar.

É tipo, olha, nasceu o cego,

corta o mindinho, põe chapa, vai.

Quem é que quer encontrar água na comida?

Ninguém.

Ninguém, Margarida.

Nós viemos ter um programa de culinária junho.

Não sentes isso?

Olha, um brinde.

Um brinde.

Margarida, a nossa.

A nossa.

Alas anhas, esperemos que saia lá.

Vamos pôr agora um pouco de manteiga.

Estás a gostar de sofrer.

O sonho é ótimo, o sonho é super aptitoso.

Esse meio vómito, não é?

Eu não sei.

Nós temos sempre estas imagens para quem está lá na casa

para ir lá, petitos.

Não quero imaginar o aspecto disto que está aqui dentro,

mas quisesse fazer um pouquinho de inscrição.

É assim, parece carne picada.

Há um tom alaranjado.

Que é do tomate, sim.

Com os legumes.

Prontos.

E a situação é que tu te rendas assim,

em que a sua cegueira que tenha feito com que outras pessoas

ajam de maneira menos normal.

Agarrarem-me fisicamente e acharem que querem indicar-me o caminho

que eles assumiram que eu vou tomar e que não é.

Mas agarrarem-me com pelo braço?

Sim, e também já me pegaram o acol,

já me tiraram o acol do comboi sem eu pedir.

Sem eu pedir.

Mas as pessoas...

Há muita gente estúpida no mundo lá.

Eu não sei o que foi tão estranho.

Eu estava com a glútea.

Eu estava com...

Na minha ia descer, a porta abriu e alguém me importava.

Você estava só com o acol de uma pessoa.

E agarram-me e deixem-me os graus...

ao col.

Eu acho que eu ia dar para a espalhada e fazer-se uma...

Cama. Ok.

Então fazemos uma camada de comelo só em cada uma das laseinhas.

Depois temos a questão de Deus.

Deus, porque estava a ver.

Deus.

É uma questão muito importante.

As pessoas sentem que...

Tu foi castigada por Deus?

Que eu fui castigada,

ou que eu simplesmente não conhece Deus.

Porque se eu conhecesse Deus,

eu poderia estar nesta situação.

Cá está.

A estupidez é de facto ampla.

Conhece quando? 170?

180 ou 200.

E tipo que?

Resistente em cima e ventoinha?

Não, ventoinha não.

Ventoinha se calhar só no fim,

para gratinar o queijo.

Eu ia sugerir um brinde.

Mas para onde é que vão os copos?

Os copos vão para o centro.

Então vamos todos empurrar ao centro?

Vamos. Um brinde.

Estamos todos... Ah, estamos todos a encontrar?

Não. Malta?

Espera, temos que ir mais aqui ao encontro.

A colocalização aqui para vir ao colíquio?

Cheers.

A nossa obrigada.

A nossa e a todos possam ver.

Boa viagem para os sabores.

Olha, nós somos espertos,

mas está ótimo.

É sério que está?

Não está?

As expressões é que os incomodam.

Que envolvam a vossa condição.

Invisual é peça,

mas o termo que vos deixou

mais confortável é a sega.

A sega?

A sega é para não dizer

falar daquela pessoa

pela sua característica.

Diz-se que é uma pessoa.

As expressões, na religião,

há aquela coisa

da cegueira ser um castigo máximo,

não é?

Acho que contribui também para a discriminação.

Bom, mas o que é que na religião

não contribui para a discriminação?

Falar em castigos.

Por um...

Tu teras um bocadinho da experiência

do cego,

das pessoas cegas,

não sendo experiência,

tu podias, por exemplo, desencantar

alguma venda e comer esventado.

E um?

Sim.

Não é uma coisa difícil, não é bife.

Então vamos servir de mais?

Primeiro?

Vamos servir

já com a venda.

Tem que esperar certo.

Segurem os copos.

Agora que já lá vai meia hora a fazer piadas com assuntos incómodos,

todos, cheto, talvez, o paladar.

Mas nunca se sabe.

O design é sedutor com uma silhueta

de linhas incisivas, dinâmica,

que faz uso à postura felina

típica dos modelos para jogo.

Gostos não se discutem,

mas quem não se sente seduzido pelo 408

deverá rever as suas noções de estética

e jamais ficar ofendido.

Afinal, neste podcast,

houve espiadas muito mais ofensivas.

Bom, não lhe vou roubar

muito mais tempo, por agora,

só o necessário para repetir o convite.

Mark um test drive

num concessionário para jogo.

Mas primeiro, acabo de ouvir este episódio.

Em que é que tu sentes que a Segara

influenciou os todos os estudos?

Eu via duas coisas que eu gostava de fazer.

Uma temática mesmo, a parvo,

aqueles matemáticares tão enfiados

no que se iam fazer contas com coisas que não existem.

E para ir para a matemática?

Eu gostava de computadores

na altura de andar a estragar os computadores, basicamente.

Para mim, era uma boa saída.

Era mais fácil, não era.

Aliás, na altura, um segue

para ciências não era o comum.

Às vezes, teve uma espécie de tentativa

de tentar influenciar,

de não expotar mais

a economia, a humanidade, o que fosse.

Porque há sempre aquela coisa que os segues cultos

são direitos ou são professores.

Existe um bocado isso.

Sim, sim, os segues cultos.

Eu trabalho ótimo nessa área

e, honestamente, acho que foi uma escolha inteligente

da minha parte, porque é uma coisa que eu consigo fazer.

Há coisas que eu não consigo, não é?

Não peças para desenhar uma interface

de uma aplicação toda bonita, não consigo.

Ah, eu pedi agora.

Mas, sim, houve algumas coisas complicadas.

Eu joguei a fazer computação gráfica,

joguei a fazer gráficos para jogos.

Em equipa, se tu estás a trabalhar em equipa,

tu consegue compensar muito isso.

Você pode urbanizar e alguém podia ser em prática.

Não, ele é só isso. Quando tu programas,

você tem que imaginar...

Mas confiar é no gosto deles.

Certo, tu tens que te basear muito mais

no que é que as outras pessoas dizem que te fica

bem ou mal do que no que tu queres.

Por exemplo, quem é que fez a tua mala?

Foi a minha mãe.

Não era necessário, mas ela achou melhor

e eu própria também achei que era menos trabalho até

quando reparei na quantidade de roupa

que lá estava, não é?

Mas confiasse-te. Por exemplo, tu estás bem,

tu sabes do que é que estás justificado.

Calças de ganga, isto é aqui.

Não. Isto é o que é? Não me lembro.

Não me lembro.

Agora vou dizer assim, gente, e vai perder muito.

É assim, gente? Não, é que não tenho um polo cor de rosa.

É...

Só se for eu...

Não, pai, não saio da vaga usar como cor de rosa.

Eu não tenho problema.

Ou seja, convido-me.

Ou seja, eu não saberia, já tenho problemas.

Claro. E tens aqui um crocadil, sabes disso?

Sim, mas até agora não me estava incomodado muito.

Sabe de cor é que é? Não.

Mas eu gostava muito de ter um crocadilogia, sabes?

Claro.

Isso era perfeito, não é?

Eu estava sempre com a troma dentro de um pântano.

Não, primeiro era um fívio.

E depois as pessoas não reuniam-me.

Não haviam fazer isto, meu.

É irritante isso, não é?

Não sentes que eu também tentei fazer isto?

Sim, mas tudo vai estar aqui um bocado comigo.

Não é uma pessoa aleatória do fumo.

Salpamos para o Rui.

Olha, Rui.

Gritos e tudo.

Rui teve gritos.

Quem é que está aqui da claque do Rui?

Ah, e a porra?

Bem, puto, não estás a ver, mas seu pai é 40.

Os pais do Rui divorciaram-se quando ele tinha seis anos.

E a partir daí, ele ficou com a mãe e nunca mais viu o pai.

Apesar de o visitar de 15 em 15 dias.

Quando ele saiu do centro Alan Keller, ingressou na Escola Secundária de Lindavella,

onde era o único aluno de cego.

Tensão, isto pode parecer uma coisa triste,

mas para quem conhece Lindavella,

sabe a sorte que o Rui teve em ser cego.

O evento mais transformador,

aquele que ele diz que mais o ajudou a superar,

numa das fases mais difíceis,

foi ter-se aventurado no Interrail pela Europa,

com uma amiga,

se a amiga for esperta,

e a amiga do Rui deram ali cinco voltas aleíria.

Olha a Cracovia, tão lindo, não é?

Ai, tão giro e ao vento.

Tendo vento, pouquinho na Rússia.

Aos 23 anos, o Rui foi submetido a três operações em 15 dias.

Depois disso, ele teve imensas dores,

mas hoje em dia tem mais mamas lindas.

Contou que em 2014,

foi buscar a Godiva aos Estados Unidos.

Eu acho que uma pessoa que consegue chegar aos Estados Unidos

para ir buscar um cão-guia,

é porque, sequerá, não precisa de um cão-guia.

O Rui também me confessou que há coisas

que eu acharia que um cego não seria capaz de fazer como soldar,

até como ser um cego que o fazia,

mas a questão é,

se são os dois cegos,

como é que sabem que está bem soldado?

Já com as mãos soldadas à mesa,

tipo, não, não, não, não está ótimo,

está ótimo, está ótimo.

Pode só cortar aqui a mesa à volta,

põe para casa.

Apesar de não ver o Rui tem fotografias em casa

e diz que não são para ele,

diz que são para mostrar as visitas,

eu sei isto porque o Rui teve a amabilidade

de me convidar para ir à casa dele

e, enquanto me mostrava as fotografias,

eu aproveitei e fui mudando tudo

para fotografias minhas só de maias.

Ei, eu vou lá,

mas pera aí, esta vez dá a penha um bocado

dos ouvidos e isso é que não pode ser, pera.

Consegue acertar na tua boca?

Vamos lá, tenta lá.

Não é com rupçados?

Não, o meu problema

está a ser primeiro

acertar com o garfo na comida.

Não?

Usa a faca para encontrar a comida.

Faz como faz com o arroz.

E bebé, já experimentaste?

Então não já.

Devagar, não entornes?

Bem, não copo.

Tenta acertar.

Na boca, Bruno, na boca.

É, na boca, sim.

Hum.

Saboreia?

Ninguel.

Menos força, vá.

Ela quer com jeitinho.

É, minha mão não queria lasanha, mas obrigada.

Ah, não? Ah, te deixas explicar.

Eu pensava que era um bocadinho de uma tamanho.

Quer mais?

Não, não sei.

Está bom, está bom.

Mais um bocadinho.

Chega.

A nível de peso parece muito bem.

Outra situação oculta aí.

Não é melhor comer ainda travessa.

Não tenho fim, não copo.

Era isso que eu ia resolver.

Atenção, eu acho que está a conseguir.

O sondismo que está a conseguir.

Agora a garrafa partiu.

Agora está a fazer aquilo.

Ois?

Está a levantar.

Alá, com confiança.

Vai.

Ela quer tirar o arroz.

Está bem.

Com convicção.

A mais convicção que foi da outra vez.

Está mais confiante.

Já, eu acho que está.

Quando eu comecei a dançar,

nunca tinha tido aquela ambição de ser bailarina,

nem nunca sequer me tinha passado isso pela cabeça.

Principalmente,

depois de ter ficado cega.

Ou seja, ele surgiu

numa altura que estava um bocadinho perdida.

Não queria acabar a licenciatura.

Não sabia muito bem o que queria fazer.

E na altura havia uma divulgação

de um projeto europeu

que tinha como objetivo a integração

de pessoas com deficiência visual

nas artes performativas

e decidi experimentar.

Na altura eu gostei mesmo.

Diva sorte também de ter sido escolhida

para integrar o projeto.

O que é que sentias?

Podias usar o teu corpo em liberdade?

A sensação que dança traz

é super-libertadora.

E, pelo menos ali,

é como se de repente eu não sentisse

que sou cega enquanto danço.

Por que que diz isso?

Porque é tão libertador e é como se eu sentisse

que eu também não precisava de ver para fazer aquilo.

Se eu visse, não ia fazer diferença nenhuma.

E como é que tu aprendes

das coreografias, por exemplo?

Normalmente eu coloco-me

atrás da pessoa que me está

a passar a coreografia.

A pessoa divide o movimento em duas partes,

se ele tiver a parte de cima

do corpo, do tronco e as pernas

para me reproduzir uma parte

cada vez.

Eu acho que eu nunca procurei

propriamente de trabalho.

A partir da oportunidade da questão da dança

e depois, basicamente,

deram uma oportunidade de emparelelo com dança,

escolher uma coisa,

uma área que eu não fazia sequer ideia

de produção e difusão.

Era uma coisa completamente desconhecida,

mas alguém fez uma coisa

que é aquilo que, infelizmente,

mas a parte da sociedade não faz

sequer dar oportunidade e criar espaço para.

Eu cheguei lá e eu não sabia nada,

rigorosamente nada, mas o que é certo

é que tinha toda uma equipa super disponível

para apoiar

e exatamente isso fez

toda a diferença, mas vou te dizer

que eu tenho a plena consciência

que há sítios em que claramente

audições não me escolheram

e eu sei que claramente por não saberem

mais tarde como é que havia de lidar

com ele.

Com a família a desabar

com casos de bullying

que tu estava a contar com a tua própria,

quer dizer que é o mais importante,

parece-me no meio disso tudo que é,

como é que tu próprio lidavas com a tua cegueira,

tu procuraste

ajuda psicológica, sentiste essa necessidade.

Lembra-me que

eu falei com os meus pais, fui para uma psicóloga

para, mas tive lá pouco tempo

porque ocorreu

muitíssimo mal.

Se calhar foi

ou foi o método errado,

num momento errado, não sei,

quase ter pé de choque, do género

isto para eu me reintegrar, porque no inicio

recusava a coisa, né, tipo, e amanhã

vou voltar a ver, isto era meu pensamento.

Eu daqui a um mês, dois meses,

um ano, sim, estava completamente negação.

Lembra-me que um dos

uma das abordagens que teve

foi pedir-me para escrever, qualquer coisa

e depois disse-me, ok, agora le.

E eu

comecei a sair

daquelas consultas

para com vontade de desaparecer.

Eu ficava todos os dias que laia

e nos dias a seguir, eu ficava

mil vezes pior

do que aquilo que estava.

Porque sentias humilhado, porque sentias

de diminuízo.

Sim, diminuízo e quase inútil.

Quero, após de que ela devia se fazer sentindo.

Pois.

Houve alguma fase,

e respondes que quiseres,

houve alguma fase na tua vida

em que sentiste que, apá, pôde desistir.

Houve, a primeira

foi quando

abri os olhos no hospital

e não vi.

Nunca tentei nada,

nunca tentei

fazer nada, mas sim, houve

algumas vezes que o meu pensamento era

pasta, isto acabasse tudo, hoje ou amanhã

era bom.

Sim, para quem estava a minha volta

e estava a se fazer com isto,

eu tive ali quatro anos de luto

entre o perder a visão e o voltar ao ativo.

O voltar a estudar,

foram ali quatro anos de paragem.

Quando é que se dá essa

passagem

de tu queres desistir

para tu que tens essa pulsão pela vida outra vez?

Se calhar aí no último

ano

desse luto.

E a minha cena foi, ok,

eu posso voltar a uma vida ativa

e ainda assim continuar

com as prensas, amanhã voltar a ver.

Uma coisa é não involar outra, não ser incompatível.

O som do mar é bom para vocês?

Ou é

intenso de mais?

Para mim é sempre o mar, chuva,

o próprio vento.

Mas, por exemplo, não consegue

vir ao mar ou ao conselho?

Eu tenho que ser com alguém.

Sim, na pouca gente, é mais isso.

Mas aí também é se conhecer

e soubesse que a praia me tem rochas

a partir da mesma hora.

Mesmo com rochas, dá para estar

com muito cuidado com os pés.

Consegui antecipar a ondulação?

Sim, e se consegue perceber?

Mas já fiz surf,

já não tem...

Era daquelas coisas que eu queria ver se conseguia fazer.

E consegui, consegui me levantar,

consegui apanhar masondas e tudo.

A sensação

que eu mais consigo comparar

é andar em pé no metro.

Ah, sim.

Tens esta malinha que a pera

vai estar vendo os impactos.

Exatamente.

Você está a estragar o plano?

Não, não, não, estás a sentar em cima de mim.

Está tudo bem.

Está por ar.

É um bom sítio.

Já percebi o que é que ele queria sair.

Que eu tomo a boca, não?

Fica o escondeu.

Ok.

Que papel é que teve o humor

e a polução pela vida?

Ah...

Eu acho que comecei a brincar

com a situação

para quebrar o gel com as outras pessoas.

Pá, até cá um amigo meu

que se vira para mim e que me dizia,

pá, tu lidas bem com isso.

Tens um sentiço de humor

meio paravogo.

Pá, pegue nisso e faz

qualquer coisa com isso. Tenda, por exemplo.

Quando subias ao palco e comecei a falar disso,

havia desconforto por parte das pessoas?

Eu queria sentir-se.

Houve algumas atuações em que não foi referido

que eu não vejo

e que eu próprio também não disse logo.

E cinco minutos depois de estar em palco,

disse qualquer coisa como

quando eu perdi a visão e quando eu disse esta frase,

houve um peso, houve uma nuvem da sala.

E já tavas legitimado a brincar?

Porque era um bocado,

aquela que era uma destraga de tagos aconseguinhos.

Você, se fosse ceguinho, não falava assim.

Ou não dizia essas coisas.

Isso que eu já não falava.

Mas salvemos para o Ricardo.

Está aqui o Ricardo.

O Ricardo.

O Ricardo.

O Ricardo é uma sagista.

É tão rato este Ricardo, não é?

Como é ceguinho?

Você me foge ali um dedinho para uma patareca?

Não faz mal.

Quando sou eu, é ceguinho.

Quando é eu, é ceguinho.

Não soube muita palavra patareca em televisão?

Não.

Uma coisa curiosa que o Ricardo me contou

foi que faz artes marciais, verdade, Ricardo.

Os combates do Ricardo só param quando alguém diz

pronto, não matas mais no ceguinho.

Claro.

E aí então param.

Agora, como é que um cegue-luta, não é?

Será que o adversário tem de ter guisos?

Pode dar problemas,

porque se passa um rebanho por ele,

ele parte logo o focinho a três ovelhas.

Uuuh!

O Ricardo não nasceu cego,

ficou cego na sequência de um acidente

em que bateu com a cabeça num vasto cimento

só dizer a frase do oi, não é?

Imagina, mãe,

tu não ves para onde é que é, Naziel?

Agora não, mãe.

Agora realmente não.

Tá tudo muito escurinho.

Logo na infância deixou de fazer coisas

porque os seus pais tinham medo que caísse

e bateu-se novamente com a cabeça

e eu acho que se calhar o mal foi esse.

Se calhar era bom que tivesse batido

e que ele podia ter ido ao sítio, sabe?

Com as televisões antigas,

tem que se dar assim uma pancada seca,

volta ao sinal.

Sabe quando se costuma apontar para os olhos

e dizer que este é o irmão deste?

Pronto, no caso Ricardo

podem ser irmãos,

mas este é adotado.

Adotado de uma família e construídos?

Agora não tens namorado, não é?

Mas quando não tinhas...

Há uma fase em que tu começas a descobrir com as mãos

com o toque, essa pessoa,

ou dá-se um salto de...

Não, cuidado.

Não se dá assim um salto para cair no abismo.

O abismo queria saber isso.

Não, não, não. Não gosto de dar salto

para os pobres, não.

Não, por exemplo,

eu nunca gostei muito de domes

com barbas gigantes.

Sempre sempre.

O cotovelo informa muita coisa.

O cotovelo informa muita coisa.

Por isso encaixas a mão, tipo assim,

aqui nesta zona, nesta zona já diz logo,

que se tens aqui as chamadas

orlinhas do amor...

Isso é meio da costela, não é?

Porque é um toque muito natural.

Eu vejo que ganadaria que é, não é?

Esquece-me de um ponto importante.

É que eu nunca dou o passo em frente

sem pedir áudio à adescrição primeiro.

Áudio à adescrição ao comitê, não é?

Ao comitê.

Ao comitê? Alguém?

Ao comitê, tipo, aquele grupo de pessoas

que te são muito próximas.

Ok, por exemplo, não a minha mãe, não.

Isso é um passo.

Isso é importante.

Mas, assim, e esse passo,

só surge depois de ter passado nos meus primeiros requisitos.

Sim, sim, sim, sim.

Mas passa nos requisitos todos e depois a tua família diz.

Não, a minha família não.

É o comitê.

É o comitê.

Mas pode mudar a ideia que tu tens?

Sim, sim, sim.

Para melhor ou para pior?

Para pior e para descartar.

Eu às vezes recorro ao comitê,

mas o comitê, mas o comitê tem um problema.

É que, tipo,

para ter um tempo de guerra todo o buraco é trincheiro,

que é isso.

Cá está.

Querá a frase que faltava?

Eu não confio.

Nós temos sempre uma frase para programar,

mas faltava a vez.

Eu adoro essa frase.

Pai, eu não confio.

Eu também não quero esse tipo de...

Foi a filosofia agora.

Foi, foi.

Esta frase não é minha, tenho que dizer.

Não, é do Sam daqui.

Ah, sério?

Sim?

Sim.

Olá, sim.

Sim, pode dizer-me qual é que é a cor deste vestido?

É uma estampa.

O fundo é preto ou azul marinho.

E tem, assim, umas flores, umas mandalas.

Quando perdeste a visão, é definitivo.

Os tuos pais, de certa forma,

foram protetores, não é?

Tu tens medo

ou sentes que faz isso

com o teu filho?

Com o teu filho?

Replicas as suas também.

Eu acho que com o meu filho eu sou um bocadinho o oposto.

Tento encontrar aqui o equilíbrio

de o facto de eu não ver.

Faz com que eu tenha que lhe tocar mais vezes.

Agora que ele já começa a responder,

eu chamo e ele responde

e eu já sei onde é que ele está.

Pronto.

Mas, às vezes, eu tenho que ir lá,

fazer-lo de uma forma,

não para esconder o facto da minha cegueira,

mas de forma também a não ser uma coisa super evasiva.

De repente, vou tocar-lhe toda hora.

Ah, estás aqui. Deixa ver as tuas mãos.

O que estás a fazer? O que estás a tocar?

O que estás não sei o que? Não faço isso ao miúdo, não é?

Tento ir lá com alguma calma,

até dentro do próprio discurso,

tentar ir falando com ele o oposto,

o que está a fazer, etc.

Eu tenho a vantagem,

a desvantagem de ter um filho

que acha que mais tarde,

será acrobata, ou não sei,

que gosta mesmo de subir às coisas.

Eu nunca lhe digo

não subas, eu digo o contrário.

Queres subir sobe, mas sobe de insegurança.

Quando estainha puros,

para e grita.

Eu não vou lastar

sempre, mas isso independentemente

de ser cega ou não, não é?

Enquanto eu não vou estar sempre

para amparar as quedas dele, portanto,

se ele souber cair e proteger-se,

é-se que levantar sozinho melhor.

Consegues tirar benefícios de

tuas cegueiras?

Para além da pensão,

claro, sim, sim.

Ganhei muita mais persistência.

Sabes aquela coisa tipo

em tudo na minha vida,

eu tenho que ir a um sítio novo.

Eu antes,

se calhar, se eu não soubesse,

ia pedir alguém e ia perguntar

e não queria sozinha,

mas agora não, tenho que ir e vou.

Mas a luta? Sim.

Esta tua decisão

é sensata

e pouco sensata de tudo ao mesmo tempo.

Tu me deixe na cabeça e tens que ir à piscina, não é?

Foi, eu tive essa missão.

Esse cara é uma pergunta estúpida.

Por que é que são os óculos? É para não estragar os olhos mais.

Quer dizer, eu já estou a estragar,

mas doem-me, percebe-se. Mas doem-te

sentir-se a água? É claro, e essas coisas não doem.

Ok.

É de faca como se fizesse.

Está feita? Muito fria mesmo.

Quando tu ainda avias um pouco,

a cara dos teus pais, tens memória disso?

Tenho memória muito do cabelo da minha mãe

e do meu irmão.

E da cara do meu irmão mais novo, em bebê.

Mas tu ainda te lembras

da cara da tua mãe?

Sim, mais ou menos.

Tenho que fazer um esforço.

Lembro da televisão e dos jogos e isso.

Lembro do Big Show Psycho,

do João Bairro Machaldo.

Tu lembras de coisas que importam?

A cara da mãe.

Agora, Big Show Psycho, João Bairro,

eu adoro...

Lembramos do curto circuito.

Quando participaste,

você me perguntava, é chato?

É, mas há coisas muito mais chatas.

Podemos afirmar com segurança

que este episódio está prestes a terminar.

Uma segurança equivalente

à do Pajó 408,

em que os sistemas de assistência ao condutor

beneficiam de seis câmeras

e nove radares,

para que o ato de condução seja

tão fácil e prezeroso

como ouvir um podcast.

Este ficará registrado para a posteridade

nas plataformas habituais,

como aquele episódio de tabu

que, para além de combinar emoção

e comédia, ainda meteu

a missão energética à mistura,

já que o novo Pajó 408

está disponível em duas versões

com motor zíbrido e desplaguin.

E, então, é desta que marca

o Test Drive num concessionário Pajó?

Vai lá!

O programa está mesmo a acabar.

Eu sei que lá há uma história,

mas tu sabrás contar melhor.

Tu uma vez estava esperando um café, não era?

E entraste...

Não entraste nunca a fé.

Opa, aconteceu?

Aconteceu. Entrei na loja e errei.

E, perante, senhor, sabe...

Naquela coisa que aconteceu, nunca quisesse lá ir,

é uma sex shop.

Ah, mas não houve tempo

para tu apoiar de nada?

Não, não.

Mas houve aquele desconforto

como o que é que tu a ser alienígena

estás aqui a fazer?

Minha senhora, para cá,

não preciso de vir cá, mas...

Mas olha que há material

já muito bem feito que...

Acredito que sim, mas, sabes...

Eu sou uma pessoa que gosta mais da natureza.

Ah, sim, mas há coisas feitas em madeira.

Ficou lá.

É uma espécie de um-coiso, que...

É uma espécie de um-coiso.

Ah, de um-coiso.

De facto, é a mesma espécie de um-coiso.

É uma espécie de um-coiso.

Podes partir ao meio e cheirar.

E tricar, não?

Podes pôr na boca.

Mas aí é que antigas.

O que é que é latinoza?

Não, isso não é para meter na boca.

Isto deve ser uma cena...

Isto deve ser uma cena para filmar bem.

Isto deve ser uma cena para filmar bem.

Isto é respeito, isto é empreventado.

Não, não, isto é...

É crujeto.

Pois é.

É parcial.

Compartir eu disto logo, veja.

Despecta!

Parece aquela coisa tipo a garagar.

Mas que não dá bem para entender

a meio gelatina.

É uma gelatina, de facto.

Sim, mas não se decide dizer de quê.

Vou provar.

Não está habituado.

Que é o...

Eu diria é nanás.

Mas na prática...

É meio morango, meio semano.

Você já derrubaste.

Porque isto é pesado.

É, é, é.

É, é, é.

Não, mas isso...

Tem quase uma ressonância.

Mas isso é como se você não pegue a mão,

se efetivo.

Olha lá.

Ó, de um tomoto.

Pesso que pode ter pesado isto lá embaixo.

Tem um bico.

Pois tem.

Temos todos...

É um pato.

É, quase.

É um pinto aí.

Pois...

Pinto aí.

Mas temos aqui o Max perto de mim.

Estamos lá.

O seco-prímio, vai.

O seco-prímio.

Isto é um esfregão de palha-daz.

Ah!

Isto é incrível.

Mas, mas...

Eu quero esta aplicação.

Olha a coisa que arreglo.

Salva de palmas para a Margarida.

Ganda-clac, também.

Quem é a claca da Margarida?

Ah, está mais aqui.

Ok, bem.

Ganda-clac.

São pai 80, a Margarida.

Tu não ves?

A Margarida tem um mestrado de introdução.

Sendo cego também eu tenho.

Pegue-me os lusíadas e comece a inventar.

Era uma vez uma foca.

Está aqui.

Como obi, diz que gosta de costurar.

Mas teve de aprender sozinha,

porque na família havia uma costureira

que tinha medo que ela usasse a máquina.

E ela conseguiu provar o contrário.

E hoje em dia tem a mão muito linda,

toda em ponto de cruz.

Linda.

A Margarida tem cegueira causada pela doença.

A maorosa congénita de lévara.

É assim, não é?

Tem apenas precessão luminosa.

Ou seja, vê luzes.

Principalmente quando é de noite

e está quase a ser atropelada por um fiat de ponto.

Quando o fiat chegar aqui, ela...

É pá.

Há aqui alguém.

Ela já nascou cega.

Ou seja, como nunca viu,

não sei.

A Margarida tem cegueira causada pela doença.

A maorosa congénita de lévara.

Ela viu, não sabe o que é que está a perder.

Tem só umas luzes.

É importante este humor.

Este humor porque vai buscar outro público.

Vai buscar aquele público que estava a dormir, sabe?

Olha, afinal do gás.

Ela já nascou cega,

mas como tinha precessão luminosa,

reagia aos testes que fazem aos bebés

e a mãe só descobriu que ela era cega aos dois meses.

Ou seja, a mãe esteve dois meses a pensar.

Então, pera lá.

A mim não me liga nenhuma.

Mas este candier já pediu três vezes para mamar.

Está mamar na lâmpada outra vez.

Olha para este.

Eu aqui com mamar.

Estão boas.

Ainda hoje não gosta de usar bengala.

Diz que prefere fazer-se acompanhar

pela cadeira guia Guti, que está aqui.

E que ela tem desde 2013.

Achei ela que é mesmo desde 2013.

Não digo nada,

mas ela acha que está aqui com a Guti

com um leitãozinho de negras.

Cozinhado.

Lindo. Lindo. Vamos com ele todo aqui.

Margarida diz que passar a andar com a cadeira

mudou radicalmente a forma como os desconhecidos

olham para ela.

E eu percebo isso, porque quando eu saio

de um casamento com uma cadeira,

também fica toda a gente olhando para mim.

Tipo, uau, o que é que ela está a fazer?

Xujé?

Mata, isto não é erroso.

Mas é...

Posso comer? Posso pôr na boca do Bruno?

Por nós, podes.

Por nós sim.

Por nós sim.

Por nós sim.

O Bruno pôr tudo na boca.

E a gente diz o que é que isso era?

Acho triste de tomar.

Pai, salgado.

Salgado mas...

Parece ser a de vela.

Ah, meu Deus, eu já sei o que é.

Não. Pera aí.

É que é.

Isto é um inseto.

Pai, pauta, se esta merda não é um inseto.

Pai, o pior é que era bom.

Mata, podem tirar a venda também.

São umas minhocas.

São larvas.

Larvas!

São larvas!

Como é que tu, quando se diz, por exemplo,

uma bicicleta ou...

uma bicicleta,

uma bicicleta,

uma bicicleta,

uma bicicleta,

uma bicicleta,

uma bicicleta,

uma bicicleta,

uma bicicleta,

uma bicicleta,

uma bicicleta,

ou a tua mãe, por exemplo.

Como é que tu constróis na tua cabeça

essa memória visual que não tens, não é?

A minha memória visual dos objetos visual,

que não é visual, não é?

É baseada, essencialmente, na forma como eu os apriendo,

quando toco neles.

Não vou saber as cores,

eu não sei qual que é, mas tenho a dita.

Como é que nós explicamos o amarelo, não é?

Nós, para explicar uma cor,

temos que associar-la a qualquer coisa.

Então, para mim, as cores têm que vir associadas,

têm que vir com um pacote, não é?

Claro, tu associaste que madeira é castanha, não é?

Pronto.

E com pessoas, tu faz a mesma coisa.

Há muitaquela ideia de que as pessoas que não veem,

como nós olhamos para a cara de uma pessoa,

quando vemos que a pessoa que não vê

também tem que ir lá, palpar a cara toda da pessoa,

para ter noção de como é que é.

Eu, pelo menos, não gosto de fazer isso.

E a questão do olhar,

é uma coisa que tem uma certa distância, não é?

E o toco físico, para ir observar a cara de alguém,

envolve uma entrada num espaço pessoal

que acaba, para mim, pelo menos,

ser um bocadinho desconfortável

estar aí mexendo na cara de uma pessoa, não é?

Sim.

Eu consigo perceber, mais ou menos,

a altura da pessoa, o tamanho da pessoa,

através de, sei lá, andar de braço dado com ela,

dá para perceber.

Que imagem é que tu criaste de mim?

Mais alto do que eu, não é?

Sim, confirma-se.

Os olhos são lindos,

são assim, um azul mar.

A barba é grande.

Grande?

A barba é grande.

Grande é tipo...

É mais fácil de tocar, hein?

Mas para natal?

Tô querendo.

Toca tu e depois diz-me.

Sim, ele tem razão.

O Bruno tem razão.

E é, Bruno, que desilusão.

Não era nada disso.

Não imaginava nada disso.

O que é que te fizeram, Bruno?

Estava tomando espais, Joana,

que também está aqui com nós.

A Joana, que diz que na escola

usava um monóculo para ver o quadro

e que na secretária tinha uma lupa

para conseguir consultar os livros.

Eu imagino os colegas a falar entre eles.

Tens apontamentos e o outro?

Não, não.

Mas podemos pedir ali àquela detetive do século 18

que está ali ao fundo.

A primeira vez que teve receio

pelo facto de ser cega foi durante a gravidez

quando se punhava a pensar

que seria pregoso andar com o filho pequenino na rua

porque ele podia fugir

e ela não ser capaz de o encontrar.

Tenção, por um lado eu percebo.

Por outro, sempre era menos uma pequena mesa.

Dá para mandar vir outro monóculo.

Na escola diz que

não sentiu discriminação

a não ser por parte de um rapaz

que a perseguiu durante três anos.

Qual mal

tem de ser um gajo a perseguir

ao ponto de até uma cega dar por isso.

Será que ela aqui me vê?

Ela vai?

Estás-me a respirar para a boca?

Ah! Porra!

Pensava que não.

A Joana é bailarina e em palco

para saber quando começar ao mesmo tempo que os outros bailarinos

diz que há cábulas sonoras

e que são impercetíveis para o público

como por exemplo

é para podermos ter inventado outra coisa

é que ainda no outro dia

uma pessoa do público mandou calar outra

e lá foi ela palca dentro

fazer o Lago dos Xins nos sozinha.

O filho de dois anos nunca lhe perguntou nada

sobre a falta de visão

mas já sabe que quando lhe quer mostrar alguma coisa

tem de lhe colocar na mão

e o marido também.

Muito obrigado

mas salve para os meus quatro novos amigos

e Rui

a Joana

o Ricardo

e a Margarida

muito obrigado por terem vindo

muito obrigado até à próxima

obrigado

Como é que vocês

imaginam o vosso futuro?

Sombrio

Escuro

Brilhantes

Vou viver numa casa com vários gatos

Como é tão específico

mexer nas costas

uma, duas máquinas fotográficas lá dentro de fazer fotografias

de salvagem

Sempre tive desde o miúdo

a Indonésia, a Austrália

eram-se os dois principais alvos

Conseguir ter um espaço artístico

onde se possam criar

vários tipos de arte

desde dança, teatro

cinema

que tivesse uma coisa que é sempre muito difícil

de encontrar em Lisboa

que esse espaço fosse acessível

a qualquer pessoa que queira fazer arte

Se proporcinar ter

uma família mais

tradicional

se calhar sim, uma criancita eventualmente

mas não

é para ter lá em casa

Mas por aí

ou seja, continuar a minha carreira

fazer umas músicas

também é um bocado de go e the flow

o vlog se vê

O Rui vem de Massama

tem 27 anos

Estão vindo a oídulos

Música

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Um cego a espalhar manteiga num pão? Eis um tema polémico e delicado. "Não gosto de encontrar muita manteiga junta, por isso se estiver sozinha é seguro que não como pão com manteiga". Durante uma semana, Bruno Nogueira viveu com um grupo de cegos, ouviu as suas histórias, percebeu como se integram, como são olhados e os obstáculos com que vivem. Depois, tornou estas histórias as protagonistas de um espetáculo de stand-up sem limites. Oiça aqui o segundo episódio da segunda temporada de Tabu.

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