Programa Cujo Nome Estamos Legalmente Impedidos de Dizer: Os Livros da Semana: natureza sagrada, ilustração portuguesa e um enquadramento de Boaventura

Joana Beleza Joana Beleza 4/15/23 - Episode Page - 6m - PDF Transcript

Assim, chegamos aos livros e eu trago esta semana um ensaio sobre o modo como evoluiu

a relação entre a cultura humana e a natureza, e as consequências dessa transformação,

até do ponto de vista ecológico.

Desde tempos imoriais a humanidade considerou a natureza uma entidade sagrada, e o título

deste livro, Natureza Sagrada, a autor é uma famosa investigadora da história das religiões,

Karen Armstrong, que tem aliás uma história pessoal curiosa, na juventude foi durante

uns anos freira católica, abandonou o catolicismo, mas não perdeu o interesse pelo fenómeno

religioso, tem de resto uma longa bibliografia a esse respeito.

Neste livro, analisa o modo como a humanidade foi perdendo progressivamente o vínculo à

natureza, a partir, sobretudo, da transição do politeísmo para o monoteísmo.

No fundo, os seres humanos deixaram de ver Deus em cada árvore, em cada pedra, em cada

riacho, e essa perda do caráter sagrado da natureza, explica Karen Armstrong, é isso

que explica porque é que a luta em defesa do meio ambiente, sendo algo hoje superficial

e utilitário, está a ter poucos resultados.

Um livro fascinante, Natureza Sagrada, recuperar o nosso vínculo com o mundo natural, é o

subtítulo de Karen Armstrong, edição, temas e debates.

O João Miguel Tavares propõe uma vez mais ilustração portuguesa.

Sim, exatamente.

Eu já tinha trazido aqui um livro do António Jorge Gonçalves de outra vez, e este chama-se

a sua nova obra, saiu pelo Orpheoneiro, chamada Welcome to Paradise, e como se vê, não tem

uma única palavrinha e ao mesmo tempo distanto sobre aquilo que é o Portugal de 2023 e

não só o Portugal, mas sobretudo a Lisboa, porque este é um retrato da Lisboa turística,

portanto são as filas, as trotinetes, os tucuques, as festas, os santos populares, as

proceções, os artistas de rua, as selfies e também, senhores de meia edade, a olharem

para turistas boas onas, e é tudo feito com um olhar super perspicaz e também com

um grande sentido de humor, é um grande, grande retrato daquilo que é a Lisboa turística

da atualidade.

Muito bem.

O Pedro Mexia traz um livro múltiplo, digamos, que tem no título uma palavra que caiu um

bocadinho em desuso, Florilégio.

Sim, Florilégio, que era fundo de uma antologia, e de facto é uma antologia de poemas comentados,

poemas de poetas muito diferentes, o Alberto Pimento, o Rambôdo, o Reimão de Cárvore

o Bernardo em Ribeiro, comentados sobretudo por académicos e poetas, é um livro organizado

pela Maria Securamente, Joana Mere e o Nuno Amado, que vem de um blog, de um site, que

chama Jogos Florais, e que tem esta, são comentários muito curtos, e que tem esta

ideia de que não há a maneira como se, como abordar a poesia, é que não há uma maneira

certa de ler.

Há perguntas que nós fazemos, há hipóteses que nós pomos, e há um sentido que nunca

é definitivo, e portanto, são simplesmente pessoas qualificadas, é certo, apresentarem

a sua leitura de um determinado poema, com a noção de que estão a dar um contributo

que é, ao mesmo tempo, pessoal e provisório.

O Ricardo Araus Pereira recupera um livro que ganhou esta semana uma nova atualidade.

Sim, eu acho que valeu a pena relever, nesta semana é um livro que se chama O Floriverso

dos Direitos Humanos, A Diversidade das Lutas pela Dignidade, organizada por Boa Ventura

Sousa Sante e Brunocena Martins, precisamente, a tese central do livro é a seguinte, os

direitos humanos convencionais, tal como nós os conhecemos, foram concebidos no norte

e no ocidente, e portanto, essa, digamos, essa origem monocultural e ocidental faz

com que esses direitos humanos, tendo sido moldados pelo capitalismo, unilismo e pelo

patriarcado, deixem de fora sufrimento humano e injusto que, para estes direitos humanos

convencionais, não contam com violação dos direitos humanos, e só as epistemologias

do sul, nas cidas das lutas daqueles que têm resistido às opções do capitalismo

e do patriarcado, é que contribuem para uma nova concessão mais justa dos direitos

humanos.

Para isso, diz o livro, é fundamental ouvir as vozes do sul e, bem, por exemplo, do Brasil,

da Argentina, ouvir todas essas vozes e manter presente que, às vezes, o discurso de defesa

dos direitos humanos coexiste com uma prática de violação dos direitos humanos, e isso

é uma alerta que eu também acho importante sobre o livro, porque Há que abolir, diz

o livro, a linha avissal que cria este fosso intransponível entre o norte e o sul global,

e nessa medida este livro acaba por dialogar com o pensamento contido, num daqueles grafíticos

que foram escritos na pareda da Universidade Coimbra, que dizia, a linha avissal passa

no teu cu.

É assim que se conclui mais uma reunião semanal, de hoje, 8 dias à mesma hora, ou a qualquer

hora em podcast Pedro Mexias, ou Miguel Tavares e Ricardo Raus Pereira, para a Semana,

já todos aqui em estúdio.

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Na estante do Governo Som…, perdão, do Programa Cujo Nome, etc. e tal, temos esta semana Karen Armstrong entre a natureza e o sagrado, um Florilégio poético, ilustração portuguesa e um oportuno enquadramento teórico de Boaventura Sousa Santos e Bruno Sena Martins.

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