Alta Definição: Luísa Villar: “A minha mãe pediu a cozinha emprestada ao padre da igreja de Fátima para criar seis filhos. Esse foi o meu exemplo de sobrevivência”

Joana Beleza Joana Beleza 10/21/23 - Episode Page - 45m - PDF Transcript

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Bem-vinda, Luisa.

Obrigada.

Umas amanzas para a mesa do Canto.

Luisa Vilar, há 63 anos, e estou como sou no Alta Definição.

Toma a vida!

Seja!

Ok.

Do inferno para uma espécie de céu, que é este espaço para si?

É o meu céu.

Cada objeto que está aqui tem um bocadinho de mim, e eu sinto muito bem aqui, mesmo sozinha.

É uma história feita de muitas vidas.

Eu acho que sim, eu odiava que perguntassem o que também fazia, porque não sabia explicar

o que eu faço tanta coisa.

Venho para aqui escrever, adoro vir para aqui cozinhar, sobretudo eu gosto de muita pessoas,

de falar com pessoas, e é o que eu faço aqui.

Eu todos os dias recebo pessoas de todo o mundo, e partir histórias com eles é muito

engraçado isso.

O Salvador ficou doente, e houve um dia que ele me disse que vou passar uma semana a

Barcelona.

E aí, em que ele foi para a Barcelona, eu tive uma dor honrível, desmeia em casa,

fui para o hospital, fui para a praia de urgência.

Gosto no final de tarde, na praia, ver um copo de vinho branco, adoro ir à praia com

os meus metros.

Não gosto de alho, não gosto de coentros, não devia ser portuguesa.

A quarta filha de seus irmãos tem que se afar sozinha, e, portanto, dever fazer

várias coisas?

Completamente, porque eu era quatro, ainda no meio, e quatro capazes, tanto eu tinha mesmo

que me se afar sozinha.

Se calhar também foi uma forma de ter a minha identidade, foi uma forma de eu me encontrar

a minha própria e ter um caminho que eu queria.

Que memórias têm desses tempos?

Ótimo, tive uma infância embora triste, porque o meu pai morreu muito cedo, mas não

tenhem esse pedo.

A nossa casa era uma casa muito engraçada, onde todos os nossos amigos vinham, era um

ponto de encontro de todos os amigos, e como nós éramos muito seguidos, havia muitos amigos

de muitas idades.

Tanto, tenho muito boas memórias.

O que é que sabe, dessa infância?

Feijo Aba.

Feijo Aba era assim, o prato que a minha mãe fazia quando havia muita agenda, nossa comida

lá em casa era sempre rejos.

Nós éramos muitos e levávamos sempre amigos, portanto o mínimo era 14, 15 pessoas à mesa,

só que era engraçado, não era tudo ao mesmo tempo, porque havia liceu de manhã, liceu

à tarde, e então eu lembro-me que nós tínhamos um quexô de uns restaurantes, que é uma

mesa, e eu preparava o almoço, deixava o almoço lá, e depois cada um vinha e almoçava

na sua altura, e o último tinha que lavar o quexô e arrumar.

A nossa casa era isto.

E havia hierarquias entre os irmãos?

Os meus irmãos eram ríveis comigo, os mais velhos.

A menina não era mais protegida?

Nada não, pelo contrário, eles faziam-me chantagem sempre, porque eu só podia sair com eles

da noite, sentou que tinha que lhes passar as camisas a ferro, enfim, era incrível.

Mas sua cabeça ia ser o quê?

América, claro, ou hospedeira.

Passei-a dali.

Passei-a dali.

E depois muito cedo quis o línguas, eu sempre fui muito boa à línguas, e muito cedo percebi

que era isso que eu queria fazer.

Ainda há qualquer coisa dessa miúdita?

Ah, claro que sim.

Eu sou uma desassuscada, e eu acho que isso vem desde pequena, e ainda aqui está, eu

nunca estou bem como estou, quero sempre fazer mais coisas, aliás, a prova está neste

programa maluco, mas eu estou sempre à procura de coisas novas e desafios novos, e eu acho

que isso ainda é essa miúdita que está aqui.

Que forma é que a perda do seu pai marcou todo o resto da sua vida?

Toda, porque se o meu pai não tivesse morrido, digo eu, nós nunca sabemos, eu não teria

vindo para Lisboa, não teria conhecido as pessoas que conheci, que tanto se calhar

eu teria sido outra pessoa.

E ela era corredor de automóveis?

Era aquilo de automóveis, sim.

Era uma pessoa muito à frente do seu tempo.

A Luisa tinha quedado quando ele...

Vez anos.

Ele foi a uma prova em Angola e teve lá um acidente gravíssimo, ficou lá ainda três

meses no hospital, pois é que foi transferido para Lisboa e depois, ao fim de três meses,

não resistiu.

Os filhos ainda tiveram a oportunidade de o ver cá?

Ver quer dizer, ele estava em coma no hospital.

Nós íamos vê-lo, mas ele nem nos reconhecia, nem nada.

E para uma miúda de dez anos, isso tem que...

Impacto.

É, sobretudo com dez anos, não é?

Porque nós com dez anos, o nosso pai é o herói.

Ainda por cima era piloto automóveis, tinha o cabelo comprido, era muito lindíssimo.

Portanto, claro que para nós foi um choque.

A miúda com dez anos já achou que foi a coisa mais injusta que lhe aconteceu, não é?

Ele, às vezes, eu lembro-me que a minha mãe é muito católica e disse o pai foi ao

céu ou uma coisa assim, e ele disse, nunca mais vou à missa, tipo, a vingança máxima,

não é?

E essa parte, o dia do pai, foi sempre uma coisa complicada para mim.

Todas as minhas amigas terem pai e se irritavam um bocadinho, porque eu gostava de terem e

não tinha, não havia nada a fazer, não é?

Eu acho que isso nos traz defesas para o resto da vida, aprender a viver sem.

Pois a minha mãe também ficou com seis filhos, trinta e oito anos.

Teve que se lançar na vida e fazer pela vida.

O que nos deixou a nós todos de uma responsabilidade, nós também, provarmos que podíamos fazer

as coisas sozinhos e não lhe dar muito trabalho, e ainda por cima eu tinha os dois irmãos

mais velhos, que eram os puxantes, portanto que lhe davam mais preocupações, os mais

novos, que eram muito pequeninos, portanto eu era aquela que pensava e eu não posso

dar preocupações, eu tenho que estar aqui.

E isso não pesou nunca nos ombros?

Não sei, eu acho que depois nós temos sempre aquela coisa de achar que o uso é um trauma,

mas eu acredito que preparou-me para a vida, e acho que isso é melhor do que tarde,

ah não, se calhar eu fiquei traumatizada, acho que não.

Como é que passou a ser a vida a partir desse momento?

Tudo diferente, fomos todos viver para casa da minha avó.

Quando vivíamos no campo, tínhamos todo o espaço, viemos para um terceiro direito

na Avenida da República.

Tudo aquilo é novo, depois com dez anos entraram numa escola nova, onde ninguém nos conhece,

cobrando vinho com os outros, e depois as crianças são muito mais nessa idade,

não é com dez anos.

Ninguém vai dizer agora você é tua amiga.

Não, faziam os grupinhos que já existiam e eu estava ali.

Não tinha amigas, eu lembro-me no primeiro Natal nós tínhamos uma troca de presentes,

e era uma turma que riscava o nome de uma menina da outra turma.

A minha ninguém me viscou.

Claro, ninguém me conhecia, mas pronto, lá houve uma freira que me deu um presente.

A cozinha fazia parte do dia a dia?

A cozinha fazia porque a minha mãe, o que ela fez para ganhar dinheiro, foi cozinhar.

Eu sou a Lisboa, pediu a cozinha emprestada ao Padre da Igreja de Fátima,

mesmo em frente de casa da minha avó, e cozinhava para fora,

e fazia aulas de culinária para as meninas casaleiras.

Para nós, passou a ser o dia a dia.

Depois, em dos primeiros tecaweis de Lisboa, foi a minha mãe que abriu,

e nós ajudávamos a pesar as coisas.

Eu lembro de cortar lulas e cortar beef stroganoff, que era uma das coisas que ela fazia.

Portanto, o cozinhar lá em casa era normal, fazia parte da nossa vida.

A forma como a sua mãe se reergueu depois da perda do seu pai,

acabou também por ser um exemplo que norteou a sua vida.

Obviamente, foi um exemplo para todos nós.

Aliás, os nossos amigos os chamavam em general,

porque ela, com seus filhos muito pequenos, tinha que ter ali uma grande disciplina,

e foi um exemplo para todos nós.

Claro, se não baixar os braços, não desistir, o que temos que fazer,

tem que ser, tem que ser, bora lá.

E a Luísa habitou-se também a ter as suas coisas com o seu dinheiro,

se quisesse comprar alguma coisa?

Obviamente, porque ela não tinha.

Eu fui trabalhar muito cedo, com 13 anos, fui fazer babysita para casa de uns alemães,

na Abucharda.

Eu nunca tinha saído de Lisboa, nem sabia o que era Cascais.

Eu lembro que a senhora, às tantas, foi a Cascais.

Foi a Cascais, vou te deixar aqui para tu conhecer as Cascais,

e daqui a uma hora volto.

E eu sentei-me num banco e não sei por que mesmo, também.

Mas tinha 13 anos e eles eram mais pestes.

Horríveis.

O mais velho era da minha idade.

E depois, os outros iam para baixo e a mais menina tinha 6 meses, 8 meses, uma coisa assim.

E a minha mãe ligou-me, e eu chorei, disse,

''Esta é horrível, né?''

E a minha mãe disse, ''Você tu que escolheres?''

''Que resta ir para aí?''

E a 31 de agosto, eu vou te buscar.

Acabou.

E eu fiquei.

E agora, fiz exatamente a mesma coisa que para a minha filha,

quando ela foi para os Estados Unidos.

16 anos.

Fiquei com o corpo muito mal, ligou-me e eu desfilei.

Eu disse que isso ia ser duro.

Agora aguenta.

Portanto, o facto é que essas coisas ficam.

São escolhas que eles fazem e que nós fazemos,

e que temos que arcar com as dificuldades.

O que é que fez com o dinheiro que ganhou aqui em Cascais?

Então, vou dizer, na altura, as pessoas da minha evadência, da maçã.

Eu acho que era da...

Era na Sao Sao.

Era na abril de Roma, e havia umas calças com remendes,

que favam 500 escudos.

Foi exatamente o dinheiro que eu comecastei lá.

Fui direta para comprar umas calças.

Era a última coisa que a minha mãe me daria,

porque ela não tinha mesmo hipótese, não é?

Estimeu-as?

Estimei, estimei, estimei-as, até que uma amiga minha

insistiu que eu estire as minhas calças,

e enciou as calças e rasgou-mas de alto a baixo.

Ainda hoje ela é a minha maior amiga.

Por isso não.

Gosto de um bitocco com um ovo cavalo.

Não gosto da praia com muita gente.

Gosto muito de reajar.

Não gosto de exercício, de andar a pé.

O que é que encantou no curso de interpretação simultânea?

Eu acho que tenho mesmo feito o paraquilo,

porque aquilo é preciso ter-se nervos, não stressar-se.

O que não se aprende é não ter medo de falhar.

Nós estamos no meio de um discurso.

Eu estou a fazer o discurso sem francês.

De repente não me lembro de uma palavra.

Não posso parar.

Porque se eu parar, as pessoas que me estão a vir

vão olhar para trás e pensar o que é que aconteceu.

Se eu não me lembro como é que se diz copo, tenho que dizer.

E agora vi com uma chave,

e ele sabe lá se foi como a chave não é como copo.

O que interessa é que eu tenho que chegar ao fim

e que ele tem que fazer sentido.

Por isso até havia um exame

em frente de, na altura,

eram só dez países.

Sim.

E assim.

E eles lábamos um texto à entrada

e nós tínhamos que traduzir o texto sem o ver, não é?

Mas ali não interessava nada o que é que nós dizíamos.

O que interessava era eles e eles passiam.

O quê?

O que é que estás a dizer?

Que estupide?

Agozarem conosco.

E se nós passássemos esse texto de não desatachurar,

podíamos ir para a simultânea.

Se chumbassemos no tempo.

E quase todos chumam.

Porque aquilo é mesmo estressante.

É pior do que estar no house com o chefe, o meu amigo.

Agora, eu não tinha muito a perder.

Eu não era francesa.

Francês para mim não é minha língua.

E eu estou aqui para fazer o meu melhor.

Se não puder, não posso.

Paciência.

E foi sempre esse o meu tema de vida.

Há um momento estressante que se lembra

desse trabalho de tradução que tenha sido posta à prova.

Lembro-me particularmente do que faltou o colega italiano.

E então nós fomos buscar uma tradutor.

Ela era italiana.

Mas nunca tinha feito interrupção assim.

Conferência no Algarve.

Muito bem, turismo.

Hoje em dia já vimos, já não são assim,

mas vimos todos os outros.

Eu arranquei e vi que ela não arrancava.

Eu comecei a falar, não, não, não.

E olhar para o lado e via, tipo...

E depois nós trabalhamos sempre a dois ou três, não é?

Nós somos meus colegas.

Não ia fumar.

E eu estava ali desesperada.

E depois tem que estar, já não é em dois,

é em três, não é?

Porque estava de vida a falar e inervalente.

Então lá veio o outro.

Sustitui e ela fugiu.

Nunca mais lá pelos pés.

Mas eu nunca fiz uma coisa da azer sem nervos.

Mas pronto, normalmente estava um plego ao lado.

Nós não nos lembravamos da palavra que vivíamos.

Vivíamos em alguns lábanos.

Não havia internet, não é?

Pronto, não havia nada disso.

Era um trabalho muito giro.

E depois eu também fui professora,

que eu acho que também me ensinou muito.

De francês, não é?

De francês.

No liceu, na venteira.

E como eu ia sempre, o que se chamava na altura,

em mini-concurso.

Eu só era colocado em setembro.

Logo ficava com os piores turmas.

Quando comecei a ter 24 anos.

E isso, sim, é pervoroso.

A timpora de chipolina, sobretudo?

A timpora de chipolina.

E já eram todos mais altos que eu.

Era o último ano em que eles pediam estar a dia.

Passado aí, tenho que ir para a noite.

17 anos?

Portanto, tem um menos 3 ou 4 anos que eu.

E eu lembro-me do um do que ele me mandou a merda.

E ele disse, fazia imediatamente para a rua.

E depois, ele disse, mas eu não vou para a rua.

Se eu for para a rua, sou expulso.

Não posso dar mais fases.

É completamente indivíduo.

Para mim, até é bom que seja expulso.

Porque eu já não tenho mais que olhar para a tua cara.

E ele foi para a rua furiosa, dá a ponta de pés em tudo.

E entretanto, no fim das aulas,

sou chamada a Conselho Diretivo.

E dizem, ah, colega.

Se pudesse não passar falta aquele rapaz,

porque ele vai a chumbar.

E ele dizia, então,

é a minha primeira semana nesta escola.

E eu não vou fazer isso.

Porque se eu fizer isso,

nunca mais ninguém me respeita.

Portanto, lamento,

se vocês tirarem a falta,

eu escrevo uma carta ao Ministério

a fazer que esteja a vocês.

Não tiraram a falta.

E então, na aula a seguir,

além da veio, avançou para mim.

Ele era enorme.

Era assim, tipo,

não se esqueça

que fora daquela portão não é professora.

E eu, que eu esperava-nos a tremer, a tremer, a tremer.

Olha pelo...

E tu não és aluno.

Estás a ver aquele carro ali, cinzento?

É o meu carro.

Qualquer risco

que apareça naquele carro,

eu vou à polícia fazer caixa de ti.

Portanto, vamos lá ver quem é canha.

Nunca ninguém me mexeu no meu carro.

Os carros das minhas colegas

eram todos furados.

E pronto que eu passei a ser respeitada.

Quando se tem medo,

muitas vezes a atitude

é confrontar os menos?

Claro.

É como quando está tão mal nas finanças.

Se nós respondemos mal,

passamos a tratar bem.

É como com os franceses.

Quando vamos a Paris,

eles fratam de mal.

Nós que respondemos mal,

eles passam a tratar bem.

É uma titula.

O nascimento da Luísa e do Salvador

mudaram o seu contexto profissional também?

Mudaram,

porque eu deixei de ser intérprete simultânea.

Eu não conseguia viajar.

E sendo intérprete simultânea,

eu tenho que se viajar.

E eu ainda dei de mamar ao Salvador

numa cabine de interpretação simultânea,

na Vaubenka.

A babysitter ia lá levá-lo

e assentava-me mexê-lo.

O meu colega estava a falar

e eu nos meus 20 minutos dava de mamar

e depois ela levava-o e eu cantimava.

A empresa que me contratava como intérprete

perguntou se eu não queria ficar na empresa

a compor as equipas.

O que era bastante bom para mim,

porque eu escolhia para mim

os trabalhos de simultânea

que podia fazer em Lisboa,

e ajudava a gerir toda a parte

de interpretação simultânea.

Foi aí que eu mudei um bocadinho o meu chip,

que chamava-se hospedeiras de Portugal,

ainda hoje existe,

e eu dirigia essa parte das hospedeiras.

E comecei a perceber que no mercado

havia uma grande procura de hospedeiras

que não fossem hospedeiras de Congresso.

E então virámos ali um bocado à agulha

e fiz uma empresa, que se chamava Ideia,

onde, de facto, trabalhávamos publicidade.

E virámos mais para aí.

E foi aí que eu comecei na publicidade.

Ser mãe dá-lhe que forças.

Todas.

Ser mãe é resolver problemas

ao minuto e é ser criativa ao minuto

e ao mesmo tempo ter uma distância,

ou seja, nós não nos podemos inervar,

porque isso é o que eles querem.

Nós temos que ter aquela coisa de estar sempre relaxada,

e meu filho, uma vez, me diz,

''Tá sempre bem.''

Nada.

Não estamos nada bem,

mas temos que parecer que estamos bem, não é?

Porque não vamos nós também fritar

quando eles estão aos gritos com ataques da docência.

Temos que olhar para eles

como se eles tivessem pedido um copo d'água.

Tem que treinar isso.

E nós temos de dar raparigas.

Mas nós temos que dar aquela coisa de estar tudo bem.

O que é que parece ser imperioso garantir na educação deles?

Disciplina.

Se escolhas uma coisa,

tem que escolher até o fim.

Eu nunca exigia que eles fossem ótimos alunos,

mas exigia que eles fossem alunos médios,

que não o chumbassem,

que fizessem os trabalhos de casa.

Eu tinha uma coisa engraçada com eles,

que era eles cria uma coisa.

Explica-me porque é que queres.

Tens que me vender esta tua coisa.

E então, se eles conseguissem vender-me,

ok, então fazes, mas estás pela conta,

pois não te manhas de queixar.

E mesmo com a ida da Luísa para os Estados Unidos,

eu e o meu marido sempre estamos bem.

Queres dizer-me, mas tens que nos explicar porque?

Porque não estudar música em Lisboa.

E ela fez uma apresentação,

em que explicou que era por isto, por isto, por isto,

e nós estamos ok.

Conversemos.

Já com o Salvador,

que queria estudar psicologia para os Estados Unidos.

Fizemos a mesma coisa e ele não nos...

A apresentação não...

Não pegou nada bem.

Não, isso não está nada certo.

Tudo o que estás a dizer não fazes a sentir nenhum,

portanto, isto é das picos dias.

Nós sempre nos deixámos tomarem as decisões por eles,

e nós cá estávamos para os ajudar nas dificuldades.

E entre o dilema de dar raiz e dar asas,

como é que é quando se dá asas?

É muito difícil,

porque nós sofremos muito,

eu sofri muito quando a minha filha se vai embora com 16 anos.

Sentir um filho sair de casa é horrível,

sobretudo quando há 16 anos,

em que eles ainda fazem muito barulho.

Então, de repente, eles vão se embora

e ficam vazio imenso.

E ela falava muito comigo, era uma grande companhia.

Portanto, no dia em que ela se foi embora,

aquilo foi terrível.

Os meus faziais sapatos tênis bordados,

que era para me entreter.

Tinha ainda o Salvador, não é?

Que era muito mais pequenino,

e tinha e dava mágoa para a barba.

Mas é sempre metade que só ir embora.

É um quarto vazio, é uma cama vazia.

E depois não havia o que há hoje, não é?

Eu não tinha internet.

Eu não podia falar com ela.

Podia ao sábado, durante 20 minutos,

porque o senhor lá nos Estados Unidos

ligava uma câmera que se ponia no computador,

e era de 20 minutos, e depois acabou.

Então, isso foi muito difícil.

Assim sentia a importância de...

Claro, porque eu própria fui.

Com 17 anos, fui ver para a Espanha,

para aprender espanhol.

E com 18, fui para a Belgi que estudaram.

E a minha mãe também achava que eu não devia ir,

porque era muito longe.

Então, sei lá, eu fui.

E sei o quão importante isso foi para mim.

E na altura que a Luisa foi,

também não era tão comum.

E o sábado também foi com 18.

Mas é um ato de amor e não de desapego.

Eu acho que é completamente um ato de amor,

porque foi a melhor coisa que eu fingi.

E eles próprios dizem.

Hoje em dia dizem isso também.

A minha mãe sempre disse,

vai, vai, aí eu também estive fora,

fez-me tão bem.

E depois, passado um ano,

eu lembro de olhar para ela e estar super magra.

E eu percebi depois que ela tinha sofrido imenso

com a nossa distância, mas ela nunca disse.

A mãe deve ser amiga ou mãe-amãe?

Amiga sim.

E eu hoje em dia considero a minha filha

a minha maior amiga.

Mas atenção, ela já tem 37 anos.

Até lá não.

Há que ter calma.

Nós somos mãe.

Amigos sim, mas mãe.

Há certas barreiras que não se devem ultrapassar

com uma mãe.

Até uma certa altura.

Depois, que eu tenho isso perfeitamente na minha cabeça,

num concerto da minha filha,

em que eu tive a perfeita noção

de olhar para ela em palco.

Pronto.

Agora já não é minha filha.

Já és uma mulher.

Já és uma mulher igual a mim.

Parece que subi, que olhei para ela lá de cima

e pensei...

Pronto.

Agora estamos as duas ao mesmo nível.

Claro que me caíram as lágrimas,

não é?

Fechurei, mas pensei...

Missão cumprida?

Missão cumprida.

Completamente.

E ela é um exemplo para mim, de mãe, de tudo.

Portanto, já está ao meu nível.

E agora, se calhar, já não há essa barreira.

Acho que há o respeito que ela tem por mim

como há o respeito que eu tenho por ela.

Vemos por eles no tempo a passar?

Claro que sim.

Mas isso é outra coisa que eu acho que tenho bom.

Eu nunca tenho aquela...

Ah, eu tenho tantas saudades quando eles eram pequeninos.

Não.

Acho que cada momento da vida deles foi riquíssimo.

E hoje também é.

Hoje tenho os netos, tenho os aelos.

Lá está a outra dimensão.

Tanto eu acho que as pessoas têm que aproveitar muito

cada momento.

Elas são melhores do que aquilo que projetou?

Muito melhores.

Eu sei se projetar é alguma vez alguma coisa.

Não temos tempo para projetar.

Mas quando olho para eles,

tem um orgulho imenso deles enquanto pessoas.

Imenso.

Acho que eles são dois irmãos exemplares,

um com o outro.

E eu vejo nas atitudes que eles têm

mesmo enquanto profissionais com os outros.

O orgulho me disse.

Da forma como eles falam com as pessoas,

como eles tratam as pessoas,

podiam ser arrogantes.

E nunca vi isso.

E se ver, diga-lhes.

Não os vejo.

Elas são de verbalizar o orgulho em si?

Ah, sim.

Em ocasiões específicas.

Quando eu faço anos, então fazem os cursos e dizem,

mas não é assim no dia a dia.

O momento da vitória em que Eve foi emocionante?

Assim, eu estava no hotel com o meu neto.

A ver pela televisão?

A ver pela televisão.

A baixinha que eu não acordava?

Foi muito engraçado porque estava a dormir ferrado

ao meu lado.

O sábado começou a contar e ele acordou,

sentou-se.

Viu tudo?

Quando ele acabou, onde está-se a outra vez?

Fez isto das duas vezes.

Tanto na semifinal, como na final.

Impressionante.

Eu não sei.

Ele já havia estar a fartes de ouvir.

Quando as votações vão caindo, como é que uma mãe...

Aquilo não se percebe bem, não é?

Aquilo não é muito fácil.

E eu não tinha ninguém com quem comentar.

Estava ali sozinha, o meu estava a dormir.

E mesmo que não tivesse nem as 7 meses, não havia falado comigo.

Então eu estava sempre ali.

Será que ele está a ganhar?

E depois, pronto, percebi que ele tinha ganho.

Você está de um chão de chãozinha no quarto, não?

Isso é uma coisa muito estranha.

Tipo...

Ah, bom.

Mas depois a pessoa sozinha é um bocado estúbico.

E depois eles só chegaram para as 4 da manhã.

Tanto as 4 da manhã já estavam.

Eu vi o ferrado a dormir, foram buscar o miúdo ao quarto

e depois no dia seguinte é que nós festejamos mais ou menos.

E uma mãe sentou que é por ter os dois filhos viver aqui?

É incrível.

Eu saí de lá muito mais orgulhosa deles

enquanto irmãos, o que é que eles fizeram ali os dois,

mas o que cantores.

E eu acho que uma mãe sente mais isso, não é?

Pronto, ok?

A música é linda e ainda bem que eles ganharam.

Mas eu acho que sentimos muito mais orgulho

as duas pessoas que estavam ali

e que trabalharam os dois para aquilo juntos.

Foi difícil lidar com a exposição

que de repente eles ganharam à escala mundial,

lidar com isso e protegeram a mesma Lucia e família.

Eu já tinha passado por uma coisa muito parecida com a Luisa nos ídolos.

Há muitos anos.

Rival, não podíamos andar na rua,

eu acho que ainda pioras do que agora.

Também era tudo mais intenso

e os ídolos têm um impacto brutal, aquela evicção.

Já te lembro de ir com ela ao Colombo

comprar uns presentes de Natal.

Mal entrarmos no Colombo, fomos engolidas pela multidão.

Com o Salvador,

só foi chato por ter o meu filho doente.

Foi uma fase complicada da nossa vida

e isso é muito desagradável.

E o que é que a mãe faz para tentar minimizar a atenuar?

Não posso fazer nada, porque as revistas saem.

O que é que se pode fazer contra a mídia?

Nada, só não dava entrevistas

e tentava que as coisas não chegassem pelo menos ao Salvador.

Que era mais fácil porque eu não vi revistas,

mas era a única coisa a protegê-lo.

E irritando-se um cadinho?

Muito, e sim, muito.

E sempre que pude, telefonei, gritei e chorei.

E, sim, escrevi cartas.

Agora, nunca em frente deles.

Isso, não.

Uma mulher tão positiva como a Luísa nunca perde a esperança?

Nunca.

Aliás, eu podia ser Luísa Esperança.

Eu sou sempre positiva.

Sempre.

Para mim, vai tudo bem.

Eu nunca gostei muito de me queixar.

Preferia ser eu a tentar arranjar maneiras de sair daquilo.

Na fase mais aguda, como é que fazer?

Para evitar as pessoas que queriam falar disso?

Eu dizia mesmo, não quer falar disso.

Não fazer cerimônia.

Sempre que disse tudo.

Não é o meu filho que sai um bocado da minha.

É um bocado chato isso.

Mas eu sempre disse tudo o que achava e tudo o que pensava.

Muito mais quando se está com um problema grande.

Um problema grave.

Não me chateis.

É um bocadinho isso.

O amor de salvo?

Claro.

Claro que sim.

E o amor da minha família,

de nós todos, salvão-nos daquilo.

E as dores, as angustias que nós vivemos no nosso passado,

diluem-se com resolução do problema

ou ficam-se sempre cá dentro, mas sombra qualquer?

Eu não me diria sombra, não gosto de sombra,

mas fica uma marca cá dentro,

mas não há dúvida nenhuma

que os grandes problemas fortalecem as relações.

Ou não, não é?

Às vezes as muito graves, as pessoas não aguentam juntas.

Mas eu acho que quando há um amor muito verdadeiro,

e há complicações, nós juntos somos mais fortes.

Eu digo isto mesmo com os meus novos membros da família,

minha nórea e o meu genro.

Não há este nosso núcleo e eles.

Não, eu acho que nós hoje somos um núcleo todos nós.

Nós os seis.

Não sei se foi por isso, mas ajudou muito.

Essa fase tão complicada

pôs-nos a todos dentro da mesma argola.

E a resolução de um problema como esse

traz uma sensação de terrenovação.

Eu gostava dizer isso, mas a resolução, resolução

ainda não está completamente resolvida.

Portanto, eu acho que também isso nos mantém a todos muito juntos,

porque não houve resolução.

Por isso eu acho que nós todos também sentimos isso.

E eu mais uma vez orgulho-me da família que tenho

e até desses dois membros

que os meus filhos escolheram maravilhosamente.

Não é um fio, não tem nada a ver com isso.

E que são tão nossos já.

E no nosso dia a dia tão corrida

e muitas vezes dizemos pouco o quanto custamos dos outros

quando se passa para um momento difícil.

Essa noção do vínculo e daquilo que nos liga

e do amor que temos uns pelos outros é...

É super importante.

E não precisamos dizer nada,

porque nós estamos ali todos e sabemos todos

qual o importante somos um esposa.

Vês enquanto eles mandam uns maelos,

os meus genro e nóra,

mandam-me assim umas mensagens lindíssimas,

mas não precisam de mandar.

E não sei se não tivesse vindo isto

se nós éramos tão unidos assim.

Não sei.

Mas acho isso.

As obstáculos da vida nos tornam mais fortes.

Uma mãe amplifica tudo.

O amor, a dor, a angústia,

para uma mãe isso é tudo muito mais intenso.

É, mas nós não damos por isso.

Graças a Deus, quando estamos no ato de amplificar,

damos por isso mais tarde.

Mas, na altura, fazemos-lo

como qualquer fêmea faz com o filho.

Nós aí somos muito animalescas.

Não estamos a pensar coisas.

É o que é.

Somos mães e eu sou mãe.

Sou mãe, sou mãe.

Estamos e aguentamos.

Há uma coisa muito interessante

que eu já estou a dizer se calhar,

mas há uma coisa que eu acho que foi incrível.

O sábado ficou doente

e veio ver para a Lisboa

e pronto, e eu mudei um bocado da minha vida.

E houve um dia que ele me disse

que eu vou passar uma semana a Barcelona.

E eu tinha, pronto, estava aqui com ele,

médicos, coisa, era...

No dia em que ele foi para a Barcelona,

eu tive uma dor horrível,

desmeia em casa,

fui para o hospital,

fui à parada de urgência

e tiraram o avário e uma tronca.

Voltei para casa no dia em que ele voltou na Barcelona.

Portanto, se isto não é uma mãe gritar,

foi a única semana que eu pude ter qualquer coisa.

E que ele nem me viu no hospital,

nem sou, porque eu não lhe disse.

Impressionante, não é?

É por isso que eu digo que nós somos animaléscas.

Isto é animal,

não é uma coisa de pessoa, é impressionante.

Isso é um instinto, alma.

É um instinto de proteção.

Tipo, ok, agora já posso relaxar,

posso ter a minha dor.

Mas esperem aí que eu tenho que ir para casa.

É direto, mas é o que é.

Eu estive no concerto do Casino Estúrio.

Esse amor...

Isso foi muito difícil.

Estava lá todo?

Pois é, isso foi muito difícil.

Mas pronto, a seguir aí eu soubou dos difíceis também.

Mas é isso, eu acho que a união entre nós,

não ser preciso dizer nada,

estava ali.

Todos nós estávamos e acho também por isso

que tudo ficou bem.

Eu orgulho muito a família que tem.

Há uma coisa que o Salvador ele tinha dito

que nunca se tinha esquecido.

Olha, há dois dias fui ver

o Alta de Finição, que ele fez,

e no fim eu até churei por causa disso,

porque perguntaste-lhe,

qual é a pessoa mais extraordinária

que conheceste na tua vida?

E ele disse à minha mãe,

todos os gestos que ela faz no dia a dia

surpreendem-me, o amor da minha mãe

é uma coisa tão incondicional.

Todos os pequenos gestos dela,

a maneira como ela sofre

e não diz nada,

pode estar a morrer e não diz nada.

Os dois dizem-me uma coisa que eu gosto muito,

como me digam, e é exatamente isso.

Que eu nunca desisto.

Estou sempre a ir para a próxima etapa.

E isso para eles é um exemplo.

E eu acho que isso é a melhor coisa que um filho pode dizer.

É um pai, é que tu és o meu exemplo.

Seja para um novo trabalho,

seja para proteger um filho,

seja para...

Tudo, tudo.

Eu acho que é a melhor coisa que uma mãe

ou um pai pode ouvir.

Como é que foi a votação familiar

para participar ao Nounu Elskic?

São todos que não.

Nem pensar.

Faz maluca.

Nem penses.

E eu fui.

Mais uma vez na vida fiz exatamente o que quis.

Quanto tempo falta?

Calma, não fiquem nervosos.

Eu gosto muito de desafios.

E espero ter isto até o dia em que morrer.

Eu gosto sempre de me pôr à prova.

E acho que não tenho idade para encostar a box.

E tenho idade para ser desafiada

e ver como é que reage com coisas novas.

Está a ser uma experiência boa?

Muito exigente.

Físicamente, muito exigente.

Porque o problema é que a carroceria

pode ser espetacular,

mas o motor já não é, não é?

Tanto, todos os meus compenheiros

são mais novos que eu,

virando a eu.

Mas aquilo é muito duro,

porque nós estamos ali 8 horas em pé

e temos que servir 60 pessoas ao jantar.

Eu estou com aqueles adesivos,

as costas,

eu ponho dois adesivos por dia

e tomo medicamentos para a cuna,

para eu estar ali todos os dias até o fim.

Mas eu continuo a achar que fiz bem a ir.

Adoro este sabor,

parece que tem lembrança também.

Tem gengibre lá dentro,

que está bastante notável.

Com peixe fica ótimo, Lisa.

Obrigado, parabéns, está ótimo.

Obrigado.

Sinto com um refrescante

de haver cabelos brancos na televisão.

Eu, há uns tempos,

quando eu fui apresentar o meu programa da Julia,

ela disse uma fase incrível.

Lisa, eu preciso deste programa,

eu preciso destes teus cabelos.

E eu acho que isso é uma forma de respeito pelo público.

E eu digo isto, que eu vou na rua

e tenho muita gente a viver comigo,

a dizer obrigada por fazer aquele programa.

Nós estamos pessoas mais da nossa idade.

Obrigada por falar com nós.

Olha, de uma bomba de gasolina no meio de uma lenteste.

Ai, gosto tanto de si, gosto tanto de si.

Tanto eu acho que sim.

Acho que há poucos programas

com os representadores são pessoas de cabelos brancos.

Vou fazer o refogado de cenoura e cebola.

E assumir esses cabelos brancos também é um exemplo.

Uma sociedade em que a ditadura da juventude

parece provalecer.

Que é uma pena.

Porque eu acho que nós devíamos aprender isso dos orientais.

Para os orientais, uma pessoa mais velha

é um símbolo de sabedoria.

Para nós não, é uma velha reta que já não devia estar ali,

que tantos a tirar ao lugar.

Eu acho que pelo contrário,

se eu tiver alguma coisa a fazer,

é passar a alguém algum conhecimento

para algumas coisas que eu fiz mal, o que fiz bem.

Acho que não tenho que fingir que sou mais nova

ou dizer que não ao meu passado de todo.

Eu não me arrependo de nada do que fiz.

Arrependo de não ter tido três fios.

Isso arrependo.

Por quê?

Que só são dois.

E porque dois, quando um sai, fica só um.

Mas não teria conseguido, porque na altura,

quando eram muito pequenos,

era muito complicado trabalhar como eu trabalhava

e ter dois filhos quanto mais três.

A idade está sob tudo na cabeça?

Completamente.

E não deixar de ter desafios.

Acho que as pessoas têm que se desafiar até ao fim.

O que é que não fez e que ele até feito?

Um terceiro filho.

E ir à Índia, mas ainda vou.

É o sonho da minha vida e fazer uma viagem à Índia.

Também foi costurera?

Isso foi durante aqueles anos

que não tinha forças para fazer mais nada,

porque era muito duro também estar a trabalhar

e ter o meu filho doente.

E portanto, aí deixei de fazer seja o que for

e só cozer, porque o cozer era uma boa terapia.

A sua amiga, Cílio Iazvedo, disse-lhe.

Cílio Iazvedo, disse-lhe.

Quando estamos angustiados, trabalhar com os mãos?

Quanto mais pequeninho, melhor,

porque quando você tem que fazer uma coisa muito menosciosa,

o nosso cérebro está em espécie de um limbo.

Eu não posso distrair-me, porque tenho que fazer aquilo bem.

Não se pode ir para o outro lado.

Tem que estar ali.

E então, sem fazer vestílios de noiva,

em que era tudo muito pequeno, com florzinhas muito pequenas,

é fazer tudo com as coisas muito pequenas.

Qual um terapêutico é que foi?

Foi muito terapêutico.

Sem isso, não tinha conseguido ultrapassar-te.

Qualquer que a pessoa faça, sai de manhã de casa

e faz o que vai bater com a cabeça nas paredes.

A nossa vida está suspensa.

Temos que arranjar coisas práticas para fazer.

A costura é que, bem, dois anos.

Sente que cada vestílio de noiva demorava?

Três meses.

Mas a mantinha não é ocupada nesse...

Mantinha-me completamente ocupada.

É que tinha as provas e os decisos.

Tinha aquelas coisas que não é preciso pensar muito.

E não tenho pessoas a contrariarem,

porque o problema do meu trabalho antes desse

e de alguém que lhe ia,

e eu não estava com nenhuma disposição

para aceitar pessoas que não aceitassem.

Eu estava imediatamente a chorar.

E, portanto, não podia ser, não é?

Até que podia te a chorar,

mas ninguém me via.

Estava a cozer.

E, em princípio, as loevas também não me diziam

que não é uma coisa que eu tinha sido a elas a pedir.

Por isso, foi uma ótima terapia.

Aconselha a qualquer pessoa que esteja com problemas graves

a por-se-a-cozer ou a fazer tapentes da Reolos.

Por exemplo.

É possível cozinhar uma dor como essa

e transformá-la em qualquer coisa de...

Um vestido de noiva.

Um vestido de noiva.

Eu acho que foi isso que eu fiz.

Vários vestidos de noiva, em Crochet.

Daí aulas de Crochet a todas as enfermeiras

do hospital Chambuco.

Temos que fazer o que achamos

que nos está a fazer bem na altura.

Gosto muito de ler, de escrever.

Não gosto de pessoas antipáticas.

Não gosto de bêbatos.

Gosto de restaurantes tradicionais.

O Salvador é quem me pede mais dicas de cozinha?

Sim, porque a Luís é bestariana.

A Antela cozinha é muito bestariano

e eu aí acredito que ela esteja melhor do que eu.

O Gás, nós até tínhamos de fazer as duas

uma coisa sobre cozinha.

Porque ela está sempre a chatear com...

Não ponha esta atenção, cara.

Não ponha esta...

E eu, que chata, faz duas...

Pronto, isto é a nossa discussão em casa,

a nossa binária.

O Salvador eu gosto muito de cozinhar

e então liga-me muitas vezes e,

mãe, se tu tiveses um alho francês,

ou não sei o que,

ou não sei o que, no frigorífico, o que é que farias?

Eu sabe, então olha, fzi isto, isto, isto.

Portanto, eu pego muitas dicas.

Quando abriu este espaço,

não foi uma surpresa para eles

que a mãe quisesse fazer coisas?

A ideia foi deles.

Porque eu estava ali no impasse,

eu tinha deixado de trabalhar,

o Salvador estava doente

e quando ele ficou bem,

eu disse, então, e agora faço o quê?

Agora, vocês têm a vossa vida?

Eu não vou voltar para o marketing,

não faz sentido nenhum.

E o que é que eu faço?

Você é para o mãe,

tu adoras falar,

alas quatro línguas,

adoras cozinhar.

O que é que não fazes aquelas coisas

que há agora em todo o mundo?

Desperiências gastronómicas,

vais com eles ao mercado,

vens, cozinho,

disse que para que a grande vivência

é uma ideia de respeito aquário.

E pronto, só tive que falar com a minha senhora,

porque tinha que mudar aqui um bocado as coisas.

E isto foi em 2018.

Coincidiu com a Eurovisão Cana.

Exato.

E eles disseram,

bem, tens que começar isso em maio,

porque nós ajudamos-te a promover,

quando estão cá,

não sei quantas pessoas para a Eurovisão,

iria um pôr-te a pé de saída

para depois a coisa andar.

E em dois meses fiz a cozinha,

ainda fiz alguns almoços de experiência

para ver se a coisa funcionava.

E dia oito de maio estava funcionando.

O conceito é de que sete pessoas

vai cobrar-las às compras?

Eu encontro-me com elas no Mercado Arriveira.

E faço-nos um briefing do que é que nós

comemos em Portugal,

como é que cozinhamos.

E depois levo-os,

normalmente começo na peixeira,

e eles é que escolhem o que querem comer.

Olha, ainda ontem,

eu tive aqui sete pessoas

e fiz sete pratos diferentes.

Porque cada um cria uma coisa,

e eu nunca quero que um fique a aguar.

Então eu disse, ok,

faço um bocadinho de bacalhaubras,

faço um bocadinho de filetes,

e faço um bocadinho de cada coisa,

e faço umas sãs assadas,

e faço arroz doce.

E acabamos à mesa

a comer as várias coisas.

Com a pandemia,

até porque seria inventar

o que isto teve puxado?

A pandemia fiquei em pânico,

porque eu tinha começado

a relativamente pouco tempo,

tinha o investimento todo aqui,

e as rendas, os seguros,

e não sei o que,

tem que se continuar a pagar, não é?

E como eu funcione 100% com turistas,

aqui a facturação zero.

E foi aí que eu pensei

num programa de televisão

para usar o espaço,

que era bonito,

e mais virado para as pessoas

que estavam em casa.

E foi a minha safa,

porque senão eu tinha que

ter entregue isto à senhora,

e foram dois anos muito longos.

Sempre essa capacidade de se reinventar,

desencontrar sempre uma luz.

Pronto, é isso que os meus filhos dizem.

Porque eu sou desassuscada.

Se tivesse que escolher um só prato,

de eleição, qual seria?

Bifes panados com esparguete.

Até algum utensílio fetis,

que uso sempre.

Descascador, claro.

Acho que não era ninguém

sem descascador de legumes.

E há um ingrediente

que uso mais vezes,

que tenha um toque especial, seu...

Sim, estragão.

O uso imenso estragão,

que é uma coisa que em Portugal

não se usa muito.

Quer defender a sua honra

sobre o bacalhau do casamento de Salvador?

Isto é uma grande mentira.

Isto é uma grande calúnia.

Então, só para situar,

o Salvador disse que o bacalhau

azedou um bocadinho?

Azedou, isso é meu executor.

Eu te vou explicar.

O Salvador ligou um mês antes

de dizer, mãe,

não vamos escolher num cadrinho.

Cadrinho vai fazer o cadrinho

neste ovo.

E eu disse, ok.

Quantas pessoas são?

Acho que ele me ia dizer,

200.

Ah, ok.

Olha, mãe, mas há uma coisa.

Aquele sítio não tem cozinha,

tu não podes usar a cozinha.

Tanto, eu tive que fazer

todo o casamento dele

aqui.

E ele casou-se

na outra ponta de Lisboa.

Eu tive que levar tudo,

prefeito, para lá.

E de lá só aluguei

os fornos para aquecer.

Mas mesmo assim,

eu perguntei a toda a gente.

E ninguém me disse

que o Agua Bacalhau

estava azedo.

Só ele.

Se calhar foi só a taça dele.

Como é que é a sua relação

com os seus netos?

Maravilhosa.

É tipo aquela coisa da avó com açúcar,

mas no caso da Luísa,

com açúcar, com xido e tolo,

com agave.

Com tudo, com tudo.

Deslados.

Muita carne.

Sim, é maravilhosa,

é maravilhosa.

Eu li uma frase

da Carla Madeira,

que diz que os netos

são um ato de amor,

mas com uma revisão.

Ou seja,

há coisas que a gente já não inseriu.

E então já está revista,

já está fora.

E então é tudo muito mais puro.

É exatamente o que nós

queremos fazer.

Não temos os filtros de educação,

de ser mal educado,

de ir para a cama.

Não temos nada disso.

Isso é que os pais,

a relação que nós temos

com os nossos netos

é puríssima.

Além da disponibilidade mental

que nós temos.

Não estamos cansados.

Não temos cinco minutos

para fazer um trabalho de casa.

Não temos que dar bem a correr.

Os meus netos adoram

bem em minha casa,

porque eu deixo estar

até fecharear a água.

Só quando eles se queixam

é que eu os vou buscar.

Tente fazer o que querem da vó.

O que querem da vó e da vó.

A Luísa não canta.

Não, não.

Eu nem os parabéns posso cantar,

que eles dizem logo

que eu estou fora de tu.

Ria esse logo,

que o Rodrigo do outro dia

estava a cantar,

mas não é assim.

Eu não sei o que é.

Que chato isso.

Deixem-me cantar.

Eu canto por carro,

puxada.

Então, cantar autíssimo.

Você teve quantos anos na publicidade?

15.

O que aprendeu sobre as pessoas?

15 anos.

Oi, eu aprendi tudo.

Eu adorei fazer o que fazia.

Para já,

eu comecei uma área muito nova na altura,

que foi o Proda Placement.

Eu levava os guiões para casa,

o médico-família na altura,

que foi a primeira coisa

que nós fizemos em Proda Placement.

É ainda em Espanhol,

para ver onde é que podia integrar as marcas.

E depois vinha, pai, ando mole e dizia,

olha, acho que aqui podemos por isto,

não fica mal,

aqui, aqui, aqui, aqui, aqui.

E ia para outros estudios

do médico-família e aquilo.

Não era ainda oficial de causa dos atores.

Os atores não ganhavam nada.

Eu insistia,

vocês terem que pagar aos atores,

assim que se faz lá fora.

Porque então ia e era a Rita Blanc,

que, por exemplo,

eu tinha cháveras da Bondi,

no café lá da novela,

e ela apunhava a mão assim.

E eu era apresentado aos atores

como miga do realizador.

Eu não podia ser a pessoa

do Proda Placement,

porque que eu existia.

Então era.

É, Luís é um amigo dela,

dá só aqui a ver.

Quando é que a Rita

começou a tirar a mão?

Quando começaram,

se calhar nunca tirou.

É verdade.

Foi bastante mais tarde,

foi mais de 2 ou 3 anos,

que nós começamos a pagar aos atores.

E por existência minha,

porque eu tinha dinheiro para despagar,

eu pedi às marcas e às marcas entantadas.

Mas aquilo foi um processo lento e complicado.

Um dos seus grandes orgulhos

é o Arredonda.

É, eu comecei a pensar

que tinha adquirido tanto conhecimento

e tinha adquirido tantas boas relações

com tanta gente, importante,

por isso, ao serviço,

de alguém que precisasse.

E as instituições

que fazem trabalhos incríveis

têm esse problema sempre,

porque a pessoa que está à frente

sabe fazer aquilo

para aquela instituição, não é?

Mas não tem que saber nada

do marketing,

nem de comunicação.

Tanto, o que eu fiz

foi a Associação Link,

e que fazia exatamente um link

entre as instituições e o marketing,

que eu tentava era fazer projetos,

e aí vem o Arredonda,

em que fosse interessante para uma marca

estar colado a esse projeto.

Portanto, vamos tentar que,

ao ajudar, seja benéfico para a marca,

e aí vamos buscar dinheiro

ao marketing,

e seja benéfico para a instituição

porque traz dinheiro.

E foi isso que eu fiz

durante cinco anos,

só que eu não cobrava

nada às instituições,

porque era contra os meus princípios.

Tanto, ouvir cinco anos

tive que acabar,

não tinha dinheiro para viver.

Ela agarriu aos cinco milhões de euros?

Cinco milhões de euros

em quatro anos.

Se lhe fosse garantido uma resposta

a qualquer pergunta sua,

o que é que queríamos mesmo saber?

Se os meus filhos e os meus netos

vão ter saúde sempre,

sempre, até morrer.

O que é que precisaria parecer

ainda mais feliz?

Que todos fossem completamente saudáveis.

Só isso.

Ir à Índia.

Alguém lhe deu um pedido de desculpas?

Eu acho que estou bem comigo própria.

Nem acho que ele deva pedir desculpas

a ninguém, porque eu sou muito

de resolver as coisas na hora.

Nem acho que ninguém

me deva nenhuma desculpa.

Se eu achasse que alguém me via

pedir desculpa,

ele pede desculpa.

Não deixo as coisas arrastar,

ou se deixe,

é porque não dou importância

e então acabou.

Qual longo prazo é que projecta?

O seu futuro?

Amanhã.

Eu acho que não se deve fazer

grandes planos.

Acho que não vale a pena.

O universo traz-nos as coisas

quando quer e como quer.

Pelo menos assim estamos sempre mais

ou menos preparados para o que seja.

Tem que ser orgulha mais de tudo o que fez.

Ser mãe.

A minha filha.

O maior eúgio que ela me fez

foi naquela canção que ela fez para o filho dela.

E que ela diz,

se eu fizer metade do que a minha mãe fez,

já acho que fiz bem.

Eu acho que essa frase,

a minha mim atome.

É incrível.

Quando os seus netos daqui a 50 anos

quiserem recordar a avó por um prato,

o que é que eles vão recordar?

Ainda não sei,

eles são muito pequenos,

ainda são pedem-burgers.

E croquetes.

Não sei,

mas há uns pratos icônicos lá em casa,

há uns raviolis que eu faço,

que eles recostam todos muito,

com uma gema dovo crua lá dentro.

Sopas.

Eles deram todos uma t-shirt

e dizem que eu faço as melhores sopas do mundo.

Eu gostaria que dicesse,

a nossa avó foi...

Muito divertida.

Eu acho que isso é a memória que eu quero,

que eu desfiquei.

Alegre, divertida,

sempre pronta para novas aventuras.

Fiz uma tenda para o meu neto

e vim dormir no pintal com ele.

Ele é que teve medo.

Mas gostava de sempre ser a avó companheira

e divertida que faz coisas com eles.

O que é que dizem os seus olhos?

Os meus olhos esperam

que amanhã haja um novo desafio.

Obrigado, Lisa.

Obrigada, Ia, Daniel.

Muito obrigada.

Já tinha muita vontade de conhecer.

A hora é essa.

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Ou não soubesse a sua infância a “feijoada”, como gosta de relembrar os dias passados com a família e amigos enquanto a sua mãe cozinhava, ou Luísa talvez não tivesse herdado a paixão pela cozinha. Diz-se resultado, também, de “uma responsabilidade acrescida” quando perdeu o seu herói: o pai. “A minha mãe tinha 38 anos e ficou com seis filhos. As pessoas associam tudo a trauma, mas isso preparou-me para a vida”. Hoje é apresentadora do programa Mesaluisa, transmitido pela Sic Mulher, e proprietária de um espaço com o mesmo nome, em Lisboa, onde promove a cultura e gastronomia portuguesas a quem passa. “Nunca estou bem como estou, quero sempre fazer mais coisas”, sublinha. E talvez por isso também seja autora de dois livros. O mais recente tem inspiração familiar: “Hoje podes fazer uma tartaruga ninja?” Desta e de outras perguntas dos seus netos, que a “inspiram”, refere, nasceu o livro “(Não) se brinca com a comida”. Cada receita é uma história. Mãe de Salvador e Luísa Sobral é uma das concorrentes da nova temporada de "Hell's Kitchen Famosos" e até já nos fez saber que “Ljubomir faz-se de pior do que realmente é”.    

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