Alta Definição: Jorge Guerreiro: "Sou de uma família humilde e o mais novo de 7 irmãos. Partilhava o quarto com quatro, não tínhamos mais do que a conta, mas éramos felizes"

Joana Beleza Joana Beleza 4/30/23 - Episode Page - 45m - PDF Transcript

Bem-vindo, Jorge.

Obrigado, Daniel.

Hoje chegamos às 12h e pouco, não pode ser às 3h ou 4h.

Pô, não.

É às 12h e pouco.

Mas olha, ao menos chegamos.

Jorge Guerra, de 41 anos, estou como sou no Alta de Finoçã.

Gosto de viajar.

Gosto muito de doces.

Sou viciado em músicos chocolate.

Gosto de tempadão.

Adoro a empadão de carne.

Não gosto de chinásio, mas faço chinásio.

Quando chegas a algum sítio hoje em dia, qual é a reação?

É incrível.

As pessoas são todas bastante afáveis comigo.

E as pessoas realmente têm música voadora e um quarto na cabeça.

Então é, digamos que é o ponto de partida para iniciar uma conversa comigo.

Como essa sempre de uma forma de brincadar e tudo mais do que é o ótimo.

Ao longo da vida, quando chegavas aos sítios, como é que era a tua atitude?

Entravas e encher as assalas? Entravas mais tímido?

Eu era muito tímido, sabes? Na minha adolescência, sempre fui bastante tímido.

Mas eu acho que ainda sou tímido.

Acho que a timidez está sempre lá.

Mas na verdade, de uma altura em que era de uma timidez quase que extrema,

eu recordo que os meus irmãos vinham à janela a chamar-me e eu nem estava para trás.

A vergonha era tanta de me darem a chamar assim alto e gritar e tudo mais.

Eu seguia o meu caminho como se não fosse eu.

Houve coisa de despertar, se calhar em que eu perdi um pouquinho a timidez

e que eu fiquei um pouquinho mais sociável.

Quando chegavas aos caralhócos, chegavas e eras o dono da...

Aliás, eu sempre cheguei muito de seguro.

Era no sentido de cantar sempre as mesmas músicas,

porque eu já sabia que elas funcionavam.

Portanto, não rescavam muito.

Tipo, o que é que é cantáveis?

É o feitiço do André Sardessa.

Você tinha que fazer parte sempre, também.

O longe de ti, as baleias do Roberto Carles.

Todas as noites, durante o período de quase as noites, sim.

Era uma forma de eu pôr em prática aquilo que eu gostava de fazer,

aquilo que eu sonhava fazer para que eu ambicionava.

Portinhas ali, assim, também logo ali um reflexo imediato do público.

E havia as palmas, não é?

As palmas.

Não havia palmas, isso era lógico.

Longe de ti

Os teus sonhos estavam de acordo com as possibilidades que tu vias com o teu horizonte,

ou era um caminho lojinho?

Na verdade, havia algo que me dizia que eu ia chegar lá.

O que será que as coisas aconteceram?

Eu acho que às vezes o segredo é nós deixarmos acontecer.

É pensar positivo para ti, mas não creias-te tudo para ontem.

Nós quando queremos tudo para ontem,

ficamos ansiosos de tal forma

que às vezes ainda perdemos mais as coisas.

Mas hoje em dia, eu consigo perceber

que ainda bem que não me aconteceu tudo imediato

logo quando eu comecei a minha vida profissional.

Eu acho que não tinha capacidade para corresponder a tudo de uma forma tão positiva.

Gosto praia, gosto de sol, mas também gosto de chuva, mas também gosto de neve.

Ou seja, gosto de tudo.

Não gosto de borrê-lo, de cabrito, não gosto de coelho.

E tu pensa que estás a poder-me uma viagem

para te pedir-te o teu irmão.

Mas calhar já podia-te ter feito esta viagem

para vive-lo.

Você começa a trabalhar muito cedo.

Senhor, deixe-os todos, deixe-os a escola

e comece a trabalhar no Call Center.

É na altura do caralho que também, mais ou menos?

Sim, foi quando começou tudo basicamente.

Ou seja, foi quando eu comecei a trabalhar no Call Center

para formar-me um grupo de amigos,

a ter uma vida social diferente da que tinha

e então foi aí que tudo começou a acontecer.

Tínhamos o grupo que sim, mas praticamente todas as noites.

E um direta?

Sim, mas direta, completamente.

E olha, era os dias em que eu vendia mais.

Incrível, acredita.

Os dias em que eu dormia menos,

eram os dias em que eu vendia mais.

Qual Center era de que áreas eu...?

Era de Venda Direta, basicamente,

porque eu trabalhei em vários Call Centers.

Era preciso ter de lábia?

Era preciso ter um pouquinho de lábia.

E sabe que o Call Center ajudou-me muito a ganhar essa lábia?

Porque como era muito tímido e era um pouquinho fechado,

o facto de trabalhar no Call Center fez com que

eu começasse a saber melhor ter um diálogo mais fluente.

Óbvio, se queria produzir, tinha que me falar com as pessoas.

E nunca te levantaste para fazer outra coisa

enquanto tivesse uma pessoa falada, falada, falada?

Ah, sim. Desculpa que aconteceu.

Alguém que estivesse basicamente a chamar-me vários nomes,

ouviu o segundo, ouviu o terceiro,

e os outros 15 se pusem óbvio.

Também não tem convitude, não é?

Vendias o quê?

Eu fazia vários tipos de produtos,

inclusive cheguei a atender o Viva Melhor,

cheguei a trabalhar também com livros para crianças,

vários tipos de serviços.

Tinhas alguma técnica especial, alguma...

Sim, por cá as tantas,

quando tu trabalhas em Call Center,

às vezes tu consegues quase que perceber

quem está do lado a com o simples que estou percebes.

E tu consegues muitas vezes perceber

onde é que a pessoa está virada,

se tu vais dizer ao telefone na cara,

se vai aguentar a tua conversa um minuto,

se vai dizer que tem um jantar ao lume,

mas não tem, porque está datada no sofá.

Então tu tentas logo devar a conversa, obviamente,

a consciente daquilo que teu sexto sentido

te leva a crer naquela pessoa que está do outro lado,

que tu não conhece lá.

E se alguma forma transposto para o dia de hoje,

tu tinhas um tempo muito limitado

para conquistar a atenção daquela pessoa naquela...

Os primeiros segundos são fundamentais.

É a forma como tu abordas a pessoa logo de uma forma inicial,

é fundamental para o resto.

E, no meu caso, eu percebi isso.

No caso do Call Center,

se o eventualmente comecesse a conversa

com vós de sono, a pessoa dorme-se do outro lado.

Não, tem que ser uma coisa mais viva, mais desperta,

realmente para capitar a atenção da pessoa.

Muitas vezes até pediam não comprar o produto,

mas ouviu-me até o final.

Sério, uma conquista.

E era uma conquista,

quer dizer, não ganhava nada.

Era uma conquista e um perda de tempo,

mas a verdade é que consegui cativar aquela pessoa

a, pelo menos, escutar.

E algumas desligavam o telefone...

Quantas vezes? Quantas vezes?

O pior é quando se digam quase no final,

em que falta ali, assim, tipo, 20 segundos

para terminar o seu trabalho,

e eles digam todo o telefone na cara.

É uma fortaleção,

mas depois aquilo é incrível,

porque depois cai outra chamada e é o começar do zero.

Tu tens que ter a tua cabeça muito bem organizada

no sentido de que já foi, agora,

é o começar do zero,

ficar frustrático.

Não podes,

porque 100 metros disso, então, é o teu fim.

Não, tu tens que começar do zero 50 vezes por dia.

E este começar do zero era diário.

Portanto, tu ontem foste o melhor vendedor,

mas hoje esquece,

hoje estás igual aos outros,

estás a zeros,

portanto, bora trabalhar por isso.

Eu tinha sempre paciência,

tinha quase 5 paciências.

Havia dias em que se calhar, obviamente,

que não tinha tanta paciência.

Principalmente quando comecei a trabalhar na música,

porque eu valia um tempo em que eu estava na música

e no qual eu senti ao mesmo tempo,

acho que ainda foram para uns 4 ou 5 anos

em que eu consegui conciliar.

E, então, é o aviso em que a minha cabeça

já não estava lá.

Porque, para, vinha de um fim de semana incrível

a fazer o que goste,

a fazer programas de televisão,

disse que na fara de manhã,

estás ali,

em frente ao computador,

completamente sozinho, por tudo conta.

Esta hostilação às vezes era difícil de eu tolerar.

E este exercício de permanente humildade

e não confiar exatamente

que o caminho já estava certo por ali

e continuar a manter-se...

Mantinha por vários motivos.

É de um lugar porque,

ao início, na vida musical,

nem queda investimento.

Ninguém investiu em mim.

Ou seja, fui eu próprio que fui à luta,

fui eu próprio que paguei as minhas chadezas,

as minhas trabalhos,

pagava tudo.

E depois, porque quando comecei a trabalhar

na música também,

as coisas não aconteceram logo.

Eu valia-se uns 3, 4 anos

para começar a ganhar algum dinheiro.

E, então, tinha que continuar,

porque era o meu ordenado certo,

era o de Call Center.

E depois, também, porque

queria continuar com os pés bem-centes na Terra.

Não era pensar, agora sou cantor.

Ante eu aguentamos no Call Center

durante 6 anos, sensivelmente.

Até eu perceber

que estava com mais gente da boa

para poder suportar as minhas chadezas.

O Call Center eras confidente das pessoas?

Acabas-me em tempo de fora com algumas delas?

Muitas vezes.

Muitas vezes, não.

Eu sempre atraí as pessoas

mesmo a nível de Call Center

para que pudessem desabafar

e contar-me coisas incríveis.

Eu ansia o próprio,

mas chegava a cantar para as pessoas

se fosse preciso.

Sério?

Era cantar um faldo

para uma senhora que adorava faldo.

E os teus colegas não o aviam?

O aviam e, se cadera alguns,

achavam-me ridículo.

Mas eu acho que, na altura,

em estar a falar que a pessoa

o telefone só existia ela.

Então, entregava tudo.

E não só com o objetivo de vender.

Era uma partilha.

Tente muitas vezes,

os meus superiores ficavam

danados comigo,

porque passava muito tempo

o telefone com cada chamada.

E, não é suposto,

eu não conseguia ser de uma outra forma.

Olha, essa senhora que

eu cantei o faldo,

cheguei a encontrar-me com ela.

Porque a pessoa tinha que vir até o local

onde eu estava a trabalhar

e eu fui conhecê-la.

E fui dar-me dois beijinhos.

Gosto muito de música,

de faldo.

Sou quase que um amaleame.

Gosto de nariza.

Algum fato que gostes mais?

Sim, sim.

Há vários.

Vem aqui a ajudar-me um trezzinho.

Pode ser.

Bem pensado,

todos temos nosso faldo

e que aí nasce mal-fadado.

Melhor faldo não terá.

Faldo é sorte

e dober-se até a morte.

Ninguém foge por mais forte

ao destino que Deus dá.

Como é que a vida te levou

até o alcohol-center?

Nunca fui um espantaluno.

Acho que fui um aluno

bastante mediano, na verdade.

Não era aquele aluno

de ter grandes notas, não.

Nunca gostei muito da escola.

Lássia gostava da escola,

mas mais pelo convívio

do que provavelmente

todos os estudos em si.

Depois comecei a conhecer

pessoas que trabalhavam

nesse call-center

e desafiaram-me para...

Queria ter o teu próprio rendimento.

Queria também ter o meu próprio rendimento

e foi isso que me levou

realmente a deixar os estudos

começar a trabalhar no call-center.

Não é que tu no call-center

ganhos muito.

Visto.

Para quem não está muito

a ganhar nada,

sempre é qualquer coisa.

Começava a adolescência e infância.

O que é que te captava a atenção?

O que é que gerava interesse em ti?

A música sempre fez parte de mim.

Quando era pequenino,

a minha mãe, se tivesse

para oferecer alguma coisa,

tipo, no circulatores, etc.,

era um CD.

Acho que a única birra

que eu fiz com o meu pai,

porque queria alguma coisa,

foi uma palhaagem.

Quase que implorei para que ele me vese.

Portanto, era a música que me movia.

E era realmente o passar

bons momentos com as pessoas.

Não tinha assim grandes objetivos,

percebes?

Eu acho que vivia muito dia a dia.

Onde vivias no caçai,

num sítio com muita gente a viver?

Como é que era a vida?

Era muito boa.

Nós somos de uma família de humildes.

Não tínhamos excessos,

mas nunca desfaltou essencial.

Isso aí é fundamental.

Eu sou mais novo de sete irmãos.

Eu partilhava o meu quarto

com mais quatro irmãos,

porque era mexinca de mim no quarto.

Imagina.

Dois bolistas, né?

Era das bolistas, exatamente.

Eu tinha que dormir com o meu irmão,

que realmente eram quatro camas.

Neste caso,

eu dormia com o meu irmão,

com o meu irmão Carlos,

também porque era o único

que me tolerava,

porque eu tinha muito mal de dormir.

Eu era pantapês,

durante da noite e tudo mais.

Então ele era o único que me aguentava.

E guardo boas memórias, sabes?

Nós nunca tivemos mais do que a conta.

Sempre tivemos aquilo,

mas aquilo era o suficiente.

E éramos felizes na altura.

E havia uma hierarquia nos irmãos.

Cada um tinha que fazer o que os outros diziam.

Quer dizer, as mais velhas

me sentem um pouquinho mais de respeito,

mas a hierarquia sempre foi o meu pai.

O pai sempre foi aquela figura

de respeito em casa.

Nem dava lugar,

nem dava espaço

para que os meus irmãos,

também mesmo,

com mais velhos,

tivessem percebes.

Não, era o senhor Daniel.

Era o senhor Daniel.

Não era bastante alguma regra

que fosse especialmente marcante

na família para vocês?

Usar a casa para jantar.

Usar a casa para jantar

e ser a reira número um daquela casa.

Ou seja, nós podíamos estar a brincar na rua,

mas assim que o meu pai chegava à janela

e assubeava para cima dos patinhos,

a correr para casa,

porque tínhamos de todos jantar em casa e sentados.

Isso era assim que ela era fundamental.

E simplesmente,

se a janela me chamasse

e tivesse a pouca sorte de virar a porta

e nos chamar,

e se, então, era nós em fila

para ver quem era o primeiro a passar

pelo meu pai e peer para casa.

Percebes?

Que ele não perdoava.

E tu era Jesus que aprontava mais,

ou não?

Não.

Não era muito disciplinado.

Era assim, bastante calmo.

Acho que não desci muito trabalho aos meus pais.

Acho que os meus irmãos,

um a dois deles, deram muito mais do que eu.

Depois, quando começou as cidas à noite e tudo mais,

é que, se calhar, as coisas mudaram um pouquinho

no sentido de,

eu também queria a minha liberdade,

queria chegar às duas, às três ou às quatro.

Nunca pensei ele dar um quarto por dinheiro,

não chegava para isso,

mas na verdade chegou uma altura em que

eu também quis chegar um pouquinho mais tarde.

E aí tive que fazer um alerta à minha mãe,

calma, tenho 18 anos, tenho 19,

portanto, deixe-me ir.

Ela chegava a me ligar,

Jorge até um...

E eu, como é, calma?

Quando voltas a esses momentos da infância,

voltas onde?

Tenho muito imagem da minha casa cheia,

porque a casa da minha mãe sempre foi uma casa cheia,

não só por nós,

pelos irmãos todos,

como depois, por toda a família de classe reunia,

os meus tios, os meus primos, os meus primas,

ou seja, às vezes aquilo era quase um acampamento.

Portanto, era incrível,

todos à mesa, todos em pleno convívio.

Eu acho que isso foi muito bom também para mim,

desde sempre que lido com muita gente.

Aprende-se a saber partilhar.

Muito.

Porque estás num quarto em que nada é teu.

Esta cama não é tua, esta cama é nossa.

Esta televisão que está aqui não é tua, é nossa.

Portanto, não é mal, porque aprendes raimenta a partilhar.

Quem é que tinha prioridade nas pernas de frango?

O meu pai.

O meu pai, isso aí, tem que dizer.

O meu pai abriu um molão,

ou uma molancia,

é a primeira fatera dele,

a segunda também, que era para ver se estava boa,

a terceira, ainda lá aí, percebe-se,

e até que começava a distribuir,

e nós estávamos todos alucinando para ele,

para ele degustar-se por uma asia.

Mas isso torna-se um momento até super-givo.

Na altura de calhar, tipo, ficamos ali um pouquinho,

quando é que a macia vem.

Mas na verdade é que agora rimos muito por causa disso.

E ele contava cheio e começava a partilhar com nós.

Bom, não desfafava.

Gosto de ouvir musical.

Gosto de televisão.

Gosto de reality shows.

Não gosto de falhar.

Não gosto de falhem comigo.

Falhem comigo.

O que é que era ser feliz nessa infância?

Ah, ser feliz era que mesmo um bicarro.

Tão bom.

Era ter acesso a pequenas coisas.

O termo a bicicleta era ser feliz,

o termo a console era ser feliz,

dava-se realmente valor a pequenas coisas,

porque quando não estás habituado a ter muito,

quando tens qualquer coisa,

é a pessoa mais feliz do mundo.

Quando vais às compras com o teu pai

e colocas no carrinho que compras o chocolate que tu gostas,

porque ele deixa, isso é ser feliz.

Tanto que hoje em dia, eu próprio quando vou às compras,

vejo certos produtos que na altura adorava,

e então dá-me gosto de comprar hoje em dia, percebes?

É continuar a ter o gosto de pelas coisas que eu gostava na infância,

que eram casos pontuais?

Dá-se mais valor, esses momentos, por serem mais rasgos.

Dá-se.

Se na corrica não é banal, porque não é todos os dias,

é de vez em quando.

Mas é bom, sabe bem?

Que gestos de carinho guardas dos teus para contigo,

é miúdo que tenha sentido esse afeto.

Nós não somos uma família de muitos tabraços,

de muitos beijinhos, de muitos exames, não somos.

Somos uma família que é unida quando é preciso,

e que estamos lá para defender os nossos.

Mas o afeto também não está só nos abraços.

O afeto não está só nas palavras, está em tudo o resto.

Eu sentia afeto e sentia afeto dos meus irmãos,

eu sentia afeto também nos meus pais,

mas de uma outra maneira,

não de abraços, não de andar em comigo ao colo,

sempre foi bem tratado e muito mimado por eles,

mas não com abraço,

depois da minha mãe tomava conta de crianças,

porque era uma forma também de ela poder ter algum dinheiro

para a vida dela.

Então, às tantas, não havia tempo para muitos afetos.

Era uma vida corrida.

Então, nunca houve esse tempo de se esquecer

só para eles, e os que iam se abraçar,

se calhar, tinha isso.

Mas não, nunca fui disso.

Se esqueço muito mais agora.

Valorizo muito menos um abraço agora,

das pessoas de abraços, mesmo.

Um abraço a toda a gente.

Porque é o que eu adoro, é abraçar as pessoas.

Qual é o momento mais marcante dessa tua juventude?

Eu tive um momento marcante que me fica na memória

que é quando meu pai me decide a ajudar

em ter aulas de canto.

O meu pai era um excelente pai, era incrível,

mas também tinha sua fatitude,

as suas regras, as suas coisas,

e então ele disponibilizar-se a pagar umas aulas de canto.

Inclusive, vir comigo a Lisboa,

isso ficou um mercado.

Porque o meu pai era daquelas pessoas

que, se calhar, não tirava o carro,

ali de apresenta, que é para não perder o lugar.

E ele, por mim, fez o esforço de

não vamos-lhes boas impactas aulas de canto.

Acho que foi uma forma incrível

que ele teve de contribuir para aquilo que ele sabia

que eu gostava de fazer.

Isso ficou um mercado,

numa atitude de meu pai.

E é insquecível.

O teu pai ainda assistiu ao começo do sucesso?

Assistiu a mim a primeira vez que fui à televisão.

Foi um problema especial do dia do pai.

Foi na altura em que o meu pai começou a ficar doente.

E então,

eu fui cantar uma música dedicada ao dia do pai.

E ele assistiu a isso.

Ficou super-orgulhoso porque eu falei nele na entrevista

que eu desjele as melhoras

e disse que ele não estava a passar uma fase muito boa.

Foi uma altura em que ele tinha descoberto

que tinha o canto,

que estava ali uma fase de tratamento, etc.

Ele tinha o DVD dessa gravação.

Mostrava essa gravação a tudo que respirava.

De orgulho, por sempre, de orgulho.

Se lá fosse o carteiro à casa,

ele mostrava o carteiro.

Ou seja, aos colegas de trabalho.

Tudo demais lá uma coisa.

O meu pai tinha orgulho nisso, enorme.

E ele só gostava de uma coisa.

Por que é que nós começamos a oscarrar?

Se o meu último nome e o nome dele é Laranjero.

Ele dizia que tudo dizia ser Jorge Laranjero

porque assim os meus colegas do banco

recebiam que era o meu filho.

Era a visão dele.

Ele não assistiu a muito.

Não assistiu muito.

Assistiu ao futebol da canção e tudo mais.

Assistiu aos meus primeiros anos.

Mas o meu pai, como estava doente,

não tivesse vivido da melhor maneira.

Ele nunca viu um conselho de meu.

Descrepe ou não tirar o carro da preceta?

Possivelmente digo já que era uma das possibilidades.

Ele vivia as coisas de uma forma diferente.

Como estava o doente, entretenimento e tudo mais.

Estava muito em casa

porque o meu pai começou a ter muita vergonha de ser à rua.

Porque ele usava a colostomia, percebe-se.

Então o meu pai sempre foi um bom vivant.

Praia o ano inteiro, quando se reformou.

Às 7h da manhã estava na praia.

Ele chegava à praia primeiro que as gavotas.

E então, os últimos tempos, devido à doença,

ele estava mais em casa.

Como é que tu procuraste manter a alegria e a força

e a garra em palco e na tua profissão,

ao mesmo tempo que vires esse processo?

É bom, é porque tinha que ser.

Faz parte da tua trabalho.

Não traz parecer, rigorosamente, nada para o público.

E foi um processo difícil,

porque o meu pai ainda teve muito tempo de doença.

Depois começou a precisar de muitos cuidados.

Aí os meus irmãos foram incríveis.

Porque fizeram coisas que eu não conseguia fazer.

Eu acho que não tinha a sacuragem que eles tiveram.

A nível de apoio ao meu pai.

De higiene e tudo mais.

Eu tiro-lhes do chapéu por esse motivo,

porque eles foram realmente incríveis.

Foi a primeira vez que me deparei com o...

com o morte.

É aquele primeiro contacto em que te parte,

em que desaparece uma pessoa tão próxima de ti,

com o meu caso do pai.

Tiveses-te perto dele até o fim?

Tive perto dele até o fim.

Aliás, eu despedi-me dele.

No dia em que ele faleceu,

eu fui ao hospital visitar-o.

E ele já estava...

já estava muito mal.

Então, me lembro perfeitamente como se fosse hoje.

Tenho essa imagem, tenho esse toque,

em que toquei na mão.

Em que ele apertou a minha mão.

E foi o último contacto que eu tive com ele.

Ele sabia que era o que ele estava.

Acho que percebi realmente que o fim estava muito próximo.

Muito próximo.

Eu sabia que...

não ia ver ele.

Nunca mais.

É bem, e dói.

Dói porque...

nós falávamos muito da morte,

meu pai tinha muito medo de morrer.

Tinha muito medo de morrer.

E o pai tinha muitas conversas comigo,

nesse sentido.

Testeira a missão.

Todos nós temos o último minuto de vida.

E eu na minha cabeça,

que era algo que...

não queria acontecer.

Percebes?

Então, foi a primeira vez que eu intiporei,

realmente, que a morte existe.

E é...

é um ostiante.

Em que é que ele faz mais falta?

Faz-me falta...

as brincadeiras que eu tinha com ele.

Nós dávamos muito bem nesse sentido.

Ele tinha um sentido de humor incrível.

Muito parecido com o meu.

Nós brincavamos com tudo e mais alguma coisa.

Faz-me falta...

o rir-me com ele.

Tenho saudades de rir com ele.

Falas com ele todos os dias?

Falo com ele quase todos os dias.

Falo com ele quase todos os dias.

E ele está quase sempre comigo.

O meu pai, nos últimos tempos de vida,

começou a exigir aos filhos

quando chegassem em casa um beijo.

Talvez porque estava a chegar ao final.

E ele sentiu necessidade de pedir aos filhos.

Então, chegaste a casa,

não beijaste o pai e tudo mais.

E ao princípio,

pensava assim,

mas eu nunca beijei.

Tipo, nunca fui chegar a casa

e dar dois beijinhos ao pai.

Ok?

E então,

eu percebi que...

como estava a chegar ao final,

ele queria esse momento

comigo e com os meus irmãos.

Faz-me falta

gostar com ele,

o rir-me com ele

e preciso de o sentir

sempre comigo.

Sempre todos os dias comigo.

O teu amém,

dizes tudo,

se que o meu amém

tem uma relação bem diferente

do que o meu pai,

a minha mãe é...

é quase que a minha alma gêmea, digamos assim.

A minha mãe é muito boa pessoa.

É uma pessoa incrível.

O pensar na minha mãe

é pensar em 80 anos de vida.

Em tudo o que ela passou,

em tudo o que ela viveu,

em tudo o que ela sofreu,

em tudo o que ela batalhou

para manter a família.

Sempre, muitas vezes,

com o sorriso de rosto.

E se calhar com uma vida

que muitas vezes

não dava para sorrir.

Porque a minha mãe, se calhar,

nem sempre foi feliz

ao lado de meu pai.

Mas...

para o bem dos filhos,

decidiu manter a família,

percebes?

Decidiu estar presente.

E até ao final de vida

do meu pai, a minha mãe

foi o apoio do meu pai.

E a minha mãe nem sempre

foi feliz com ele.

A minha mãe nem sempre

foi correta com a minha mãe.

A minha mãe nem sempre

foi o homem que a minha mãe

merecia.

E ela teve lá.

Sempre deu corpo às balas.

Se fez bem ou se fez mal,

é uma incógnita,

não é?

Porque agora posso achar

que ela se calhar também

com o meu direito.

E devido ter se calhar,

ter seguido o rumo dela

e assim o entender-se.

Porque os filhos iam

de criar a mesma.

Mas...

Ela decidiu estar lá.

Decidiu ser família.

Decidiu ser o melhor

para os filhos

e para todas as pessoas.

E ganhou também

uma nova vida agora

com o teu sucesso.

Em alguns circuitos,

até deve ter mais sucesso

do que tudo.

Muito mais, muito mais.

Às vezes chegue

por conta da Dona Amelha.

Desculpa que ela arde

a ser que fosse

a Dona Amelha que viesse.

Olha a Dona Amelha!

Ai, tão gris.

Ai, tão gris.

A minha mãe

ganhou uma nova vida.

Porque as tuas gostam

também muito dela

e tratam-me muito bem.

Tipo, ela sai à rua

as tuas Dona Amelha,

barbeijinhos,

de olho de miminho.

Pai, eu acho que ela

ganhou uma nova vida

mesmo com isso.

Já funcionou, Jorge?

Foi agora.

Foi agora.

O momento mais difícil

foi quando

eu tivesse que lhe dizer

da morte do teu irmão?

Foi...

Foi o momento mais difícil.

Caleu-me a mim

para ser o portugor.

De uma notícia tão...

tão má.

Mas só por isso era eu.

Porque...

Caleu-me a ela estar comigo,

ligou-me a minha ex-conhada

a dizer ao meu irmão que tinha falso ciso

e eu tive que lhe dizer.

Porque eu tinha duas opções.

Olha, contava ali, naquela hora.

O Don esperava

até chegarmos à casa

e contar-lhe

para ser um sítio mais.

Não se contei logo

e não estávamos na rua.

Eu não consegui disfarçar.

Não consegui disfarçar

porque...

porque vei tanta coisa

à tua cabeça.

Percebes?

E tu pensas, ok,

eu tenho que ser a minha mãe.

E eu abracei e disse-lhe,

sempre daquilo...

da melhor forma

que eu achei na altura

e tive que lhe dizer.

Dizer-lhe a ela

avisar o resto da família

e tive que assimilar isso, não é?

Com o meu irmão,

ele morava em Valência.

Ele não estava a viver em Portugal.

O nosso contacto não era frequente.

Nós não tínhamos muito contacto.

Nós falávamos até muito poucas vezes.

Mas tínhamos uma boa razão.

O meu irmão era aquele que dormia comigo,

o único que me tolerava.

Aquele irmão com que eu dormi,

durante muitos anos,

era o meu irmão Carlos.

E então,

eu tive que...

tive que gerir tudo isso.

E a minha mãe também,

de igual forma,

depois...

tivemos que ir para Valência, não é?

O federal foi lá em Valência.

Como é que foi essa viagem?

Foi terrível.

Foi terrível.

Porque depois tu pensas

que antes da viagem já podia estar feita

para vir visitar.

E ele sentia essa falta.

Se que ela sentia-se um bocado sozinho.

E tu pensas estar a poder uma viagem

para te vir despedir do teu irmão.

Mas, calhar,

já podia estar feita esta viagem

para vive-lo

há um ano atrás,

há dois anos atrás.

E não fizeste.

Foi doloroso chegar

a olhar dos meus sobrinhos.

Não me sai da cabeça muitas vezes,

porque foi um olhar

quando eu entrei em casa da meninas com ela.

Aquelas duas crianças.

O olhar delas.

Esse é o real.

É a minha imagem que vai ficar

aparecendo para marcá-la.

Pois foi gostar em casa do meu irmão

no dia em que ele fazia 50 anos.

No dia em que nós estávamos em casa do meu irmão,

porque tínhamos que entregar a casa do senhorio,

era o dia de aniversário dele.

Tipo, incrível, né?

E nós empecemos nas coisas dele.

O general doeu muito,

porque era mesmo muito poucos.

E aí.

Mas também a família não podia

ir toda para Valência, né?

Estávamos em 2021,

em pandemia também.

Não podíamos trazer o meu irmão para cá.

Não havia possibilidades financeiras para isso.

Também, que eu sei que se fosse cá em Portugal,

que ele tinha muita gente a despedir-se dele.

Mas não houvesse a possibilidade.

Portanto,

doeu muito também.

Aquela despedida dele recebe-se tão poucos.

Não é que isso tenha alguma reservança e não tem.

Mas,

pensei mesmo.

Já senti a sozinho.

Preciso ter uma despedida

com cinco pessoas,

seis pessoas.

E uma morte contra o Natura, né?

Sim.

Sim.

Foi de repente.

Ela já tinha tido uma ameaça também,

mas recuperou.

E foi no local de trabalho.

Foi no local de trabalho que aconteceu.

Ele tinha orgulho antigo?

Ele tinha muito orgulho em mim.

Ele tinha muito orgulho em mim.

E ele dizia-me sempre que,

quando era essa Portugal,

queria ver um concerto meu com os filhos.

Com o Rodrigo e com o Gonçalo.

Que eles queriam muito ver o tio em palco.

Isso aconteceu onde passava.

Ele não estava cá, mas estavam cá.

Os nimos vieram de férias a Portugal

e foram ver.

Falta o cá mesmo, mas...

Foi muito emocionante esse concerto.

Foi.

Ter a felicidade deles foi o que fazia.

Deus todos a dizer às mães a ver o tio.

É isso.

O que fica?

De quem vai?

Fica aquele sentimento de que podia ter feito mais

e não fizeste.

Eu, no meu caso, acho que

também acho que tem um pouquinho de haver

com o defeito meu.

Parece que tenho sempre um sentido de dívida

para que toda a gente

e não tenho.

Para que o meu irmão também

fique aquele remor,

será que podia ter ajudado mais?

Será que devia estar mais presente?

Será que podia ter sido

melhor para ele?

Percebes?

Porque eu também sei que ele, em Espanha,

também passou por dificulá-los

e sentiu-se sozinho.

Portanto,

fica um certo arrependimento

às vezes de não ser os mais.

Mas também às vezes não pode ser mais.

Portanto,

às vezes as coisas são mesmo assim.

Mas fica um...

Olha, fica...

Só coisas boas que ficam nele.

Fica o irmão que...

O irmão que me tolerava,

o único irmão que me suportava,

adrami comigo.

Mas fica para sempre também.

Cheguei a estar

de um meu camarinho,

olhar à minha volta

e eu sentir uma pessoa mais infeliz do mundo.

Gosto de festivão.

De roupa cobrida.

Está confortável.

Gosto de cinema.

Gosto de um esterror.

Por 29 anos saiu o teu primeiro...

Cedê?

Quando olhas para esses momentos,

o que Jorge é que vejo?

Quando olho para esses momentos,

penso de uma forma logo e imediata,

faria tudo novo.

Visual, roupa, isto, aquilo, aquilo.

Viu uma imagem,

RTP África, tudo que é bem-complido.

RTP de qualquer jeito.

Ela é completamente o que eu vou por aqui,

percebes?

Ou seja,

quase estava para fazer uma permanente.

Quando eu lancei o meu primeiro trabalho,

não ficou aquela confiança enorme.

Foi quase a pedir desculpa

por ter lançado um cedê também.

Percebes?

Não conseguia agarrar naquele trabalho e pensar,

não.

Isto vai ser incrível, isto vai.

Eu até podia sonhar,

mas depois não trabalhava para isso.

E então, deixei as coisas

acontecerem-se muito de uma forma natural,

tentava uma vez,

diziam que não,

não tentava a segunda.

Percebes?

Não era aquela pessoa de forçar até conseguir.

Fueis naturalmente

menos autoconfiante do que desigarias.

Sou muito pouco confiante.

Em mim,

era algo que eu até gostava

de ter mais mais confiança em mim próprio,

deveria ser muito mais confiante

da pessoa que eu sou,

do trabalho que eu tenho.

Às vezes,

eu preciso um pouquinho

da apresação dos outros

para me sentir um pouquinho melhor.

Muitas vezes,

quando vemos um artista na televisão,

sentimos que,

desde agora,

é isto.

É isso.

Mas há todo um caminho das pedras,

que é muito silencioso,

que está atrás das câmeras.

E que está atrás das câmeras,

se me dúvida.

E eu também passei por esse caminho.

Fiz o investimento

da minha vida profissional.

Recovendo-a um empréstimo.

Recovendo um empréstimo,

exatamente.

Porque era necessário,

e a minha família

não tinha possibilidades financeiras

para suportar tudo isso.

Esse investimento inicial

é na ordem de que valou?

Foi na ordem

dos 6, 7 mil euros,

sensivelmente.

E esse investimento continuou

durante muitos anos da minha vida.

Ou seja,

que se eu queria trabalhar

os novos,

tinha que pagar.

Tens de dar tudo,

passe-se.

Mas é um risco grande,

é um atiraste para o abismo.

Foi.

Se foi.

Mas houve uma altura

que eu pensei, Daniel.

Eu estou em carácter,

espaço da minha vida,

digamos,

a cantar as músicas dos outros,

aqui é ótimo,

mas para não arriscar

também é algo meu.

Porque não.

E então,

esse passo foi dado,

e ainda bem que foi dado.

É óbvio que,

quando lançou um atrobalho,

as portas não se abriram,

a nível de promoção,

a nível de espetáculo,

e tudo mais.

Depois participam

no Festival da Canção,

as coisas começaram a acontecer,

mas também de uma forma muito devagar.

Até há dois anos atrás,

era eu que tomava conta da minha agenda.

E muitas vezes,

também durante muitos anos,

era eu que marcava

e fazia a minha promoção,

era eu que tinha

compartilhado muito o domínio

do madrugualho.

Se luteavas para ti próprio,

tudo.

Tudo.

Não é fácil,

tu vendo esta ti próprio.

Mas estava muito bom,

por isso é incrível.

E as minhas,

que eras tu que estava ao telefone?

As minhas.

Eu estava ao telefone

e fechava os contratos.

E era eu que ligava

para os programas de televisão.

E eras tu que ia escobrar,

depois.

E era eu que ia cobrar

e eu fazia tudo.

Eu fazia tudo neste sentido.

Caso for uma época gira.

Parecia-te sempre a valer a pena.

Há momentos em que é mais difícil.

Há momentos que tu achas que mereces mais,

né?

E se calhar não,

não estás a ter esse mais.

Mas depois também marcavam-te

um concerto que ficavas super feliz,

esqueci isto do resto.

2021 foi um momento em que realmente

comecei a repensar na minha vida

a pós-pandemia.

Foi um ano mais complicado,

porque foi um ano em que me senti

ali um pouco perdido, não é?

Tipo, o que é que eu vou fazer?

Estava já a ponderar.

Se fosse preciso me imigrar,

fazer qualquer coisa.

Foram muitos concertos cancelados.

Foram muitos concertos cancelados.

Era o telefone que não tocava,

a agenda não mexia, não é?

O 2020 até não me soube muito mal,

porque foi uma oportunidade também

que eu tive de viver mais em casa,

de ter uma vida completamente diferente

àquela que eu tinha,

porque já tinha muitos concertos.

Não se toca em Portugal,

mas também nas comunidades.

Então, o 2020, como ainda tinha algum dinheiro,

dava para pagar as minhas contas,

então foi uma oportunidade também

de eu estar mais relaxado e tudo mais.

2021, as coisas, já é tempo a mais, em casa.

E já não havia um rendimento fixe.

Não havia um rendimento fixe.

O dinheiro começa a acabar.

Então, que tu chegas ali a si a um ponto

em que tu pões em causa realmente tudo.

Porque não é fácil de tu não ter

previsões de trabalho,

não é fácil de teres a conta bancária

a chegar a zeros,

tens contas para pagar,

e a minha prioridade é sempre pagar as minhas contas,

pagar a quem devo.

Só quando tu dás por ti e começas a perceber

que não há uma luz ao fundo do túnel,

você é ficar muito, muito, muito embaixo.

Ponderás-te se pedir ajuda a alguém?

Pedir ajuda, não.

Eu não gosto de pedir ajuda a ninguém.

Se o poder a ter menos, mas sem pedir,

não sou pessoa de pedir.

Nem a nível financeiro, nem nada, não.

Se o dinheiro está a acabar, como é que faz?

Aí é que a tua cabeça começa a entrar em ação,

não é? Tipo, ok?

Está na altura de começar a pensar em fazer realmente algo.

Minha vida também, tu vives em proolo, ok?

Este mês não há nada, mas pelo menos pode ser que haja.

Então, vives um pouquinho nessa bola de neve

e às vezes sempre a espera de que algo boa aconteça, não é?

E então, a minha cabeça começou a pensar, não é?

Em 2022, até pode haver trabalho, até pode haver conceder-se,

até pode começar a entrar a dinheiro na conta,

mas eu não vou conseguir chegar ao verão de 2022.

Portanto, tens que começar a pensar em alguma coisa

e aí começar a ficar um pouquinho mais desgastado psicologicamente.

Sabia que algo de bom ia acontecer.

Como é que é a vida de um artista quando nós não o vemos?

A minha é uma vida super tranquila, super normal.

Entre os esportes públicos, para o meu ginásio,

passa minha vida completamente normal.

Não tenho qualquer tipo de privação.

E nos esportes públicos as pessoas abordam?

Sim, muitas vezes sim.

Eu falo, na rua também, e eu gosto.

Não tenho qualquer tipo de problemas nesse sentido.

Não privo de rigorosamente nada.

Não me imagino a mim viver de uma outra forma,

de escondido ou não vou apanhar o autocarro, porque a podem me conhecer.

Não, aliás, eu, ainda este ano, estava na praia do autocarro,

e um carro à minha frente nos apares disse,

Jorges, tens que comprar um carro,

e eu, ah, mas eu tenho, ah, ok, mas como estás aí,

pensei que você apanhará o autocarro, e eu, e vou,

e vou, qual é o problema?

Mas não queres ter ao carro da preceita, hein?

Nunca ouvi-se da garagem assim, como é de alguém lá louca.

Alguém me rouba o lugar.

O que é que é mais difícil para um artista?

O que mais difícil é nós chegarmos ao público.

O público recebe tanta informação, tanta coisa nova todos os dias,

que recebe tantas músicas novas, tantas artistas de qualidade todos os dias,

que o mais difícil é quando o público te reconhece por algo,

mas eu acho que quando o público te conhece e te chama pelo teu nome,

é por causa de muito bons fizesse.

E que eu consigo ter uma coisa que é ter um grande sucesso,

e depois conseguir ter um novo sucesso com muito pouco tempo de defici,

eu acho que o meu processo do nível de chegar ao público

começou em 2012,

em que eu lancei um tema que não é meu, que não é original,

mas populariza em Portugal, foi o Barabere,

e aí acho que o público desportou um liçinho de interesse.

Aí foi quando a minha vida profissional também começou a conhecer a nível de concertos,

ficou do telefone para o seu tocar,

e aí realmente comecei a ser chamado para fazer mais programas de televisão,

para fazer mais espetáculos, o que é o que nos dá dinheiro, obviamente,

ou seja, faícas, coisas que começaram a acontecer.

E depois consegui também popularizar outros temas, logo a seguir,

e isso já foi um crescente.

Depois, este último tema, vlogar um quarto,

foi quase que a cereja no topo do bolo, não é?

Você tem que destacar o portês do mundo que é completamente diferente,

ou então é porque você consegue, no espetáculo ao vivo,

ser diferente dos outros, que é ser o mais natural, possível.

Muitas vezes, nós estamos acima do palco, nós estamos aqui,

e o público está aqui, mas nós estamos aqui apenas,

para que o público nos consiga ver,

pois nós estamos lá de todos para o mesmo,

que é para que fazemos um grande concerto,

eu não estou acima do palco, porque eu estou sofrer a ninguém.

Todos juntos, vamos a fazer a festa.

O que é que de caricato já está acontecendo?

De caricato? Já me aconteceu algumas coisas,

já me aconteceu chegar a ser dos tidos e não ver Camarinho,

pois tens de vestir e não há sítio,

tens da minha equipa, também, para trocar de roupa e não há sítio,

um bocadinho do palco que estou sempre ansioso,

já espero desse momento.

E nada, o que presentes é que recebes peluches,

coecas e tudo mais,

acho que só mandar uma vez para o palco,

portanto, a coisa é muito pouca.

O índice é muito anos 90 já.

Isso é, já é muito 90 anos,

neste momento é mais peluches,

mas as pessoas me conhecem as pequenas coisas.

Gosto de quem?

Não gosto de demorar o canal moço,

não gosto de demorar o canal moço,

também não gosto de demorar o canal moço,

gosto muito de gentar,

e sim, não perdoa,

gosto de redes sociais,

gosto do Instagram.

O que é que tens de saudades?

Tenho saudades da leveza

com o que levava a minha vida artística,

levar as coisas que têm tanta responsabilidade

e às vezes responsabilidade

que até é capaz de não ser tão necessária

e que o incuto em mim não para ser o melhor,

mas...

Não falhar?

Não falhar.

No final do concerto, tipo, ok,

com medo que a voz me falhe com ele,

que eu penso tanto nisso, percebes,

é hoje que eu fico arroco,

é hoje que me vai falhar a voz,

já acho que há 11 anos atrás

aconteceu alguma coisa no concerto,

foi em agosto,

foi uma altura em que estava muito calor,

estava uma noite muito quente,

e então,

surge-me qualquer coisa na minha voz,

estranha,

que nunca tinha acontecido.

Isso amei do concerto,

e eu lembro perfeitamente como se fosse hoje,

de eu estar a olhar a minha voz

a pouco público,

a ver se alguém se percebia alguma coisa.

A metade de meu concerto,

foi com medo,

que se voltasse,

ou com medo que fosse ficar arroco,

ou que fosse perder a voz.

Eu cheguei ao final do concerto

e perguntei à minha equipa,

se esteve percebido alguma coisa.

Ninguém se apercebe nada,

mas não sei o que é que eu posso ter sentido,

que me levou a ganhar,

um medo,

incrível,

de não ter voz para fazer o meu concerto.

E o que acontece é que não ia seguir,

eu tinha outro concerto,

em alguns sete ou oito de concertos escritos,

e esse medo não passou.

Foi um mês super solitário,

porque como é que eu te vou explicar,

isto,

quando chegaste ao fim do concerto

e corres tudo bem,

e tavas ótimo.

É difícil de tu partilhar isso com alguém,

mas eu cheguei a estar,

de meu camarim,

tenho esta visão incrível,

dia 14 de agosto,

olhar à minha volta,

ver a minha banda,

super feliz,

belarinhas,

tudo em menos que a vacara,

tudo super feliz,

eu sentir-me pessoa mais infeliz do mundo.

Porque eu achava que ia subir ao palco,

e que não ia conseguir.

Agora acho que eles estão muito melhores,

a nível de fiel,

que eu também consegui sozinho,

entre aspas,

consegui livrar um pouquinho disso,

dessa pancada,

posso chamar pancada,

ou o que seja,

e posso dizer,

esse concerto foi incrível.

O que é que é feita com felicidade hoje em dia?

A minha felicidade continua a ser de pequenas conquistas,

porque tenho muito ainda para conquistar,

tenho ainda muito...

Lembro-se que eu te falei que em relação a qual

centrar todos os dias é um começar do zero.

Na minha vida profissional,

não é bem assim,

mas eu gosto de ver as coisas assim.

Não gosto de dar nada por garantido,

nada por adquirido,

gosto de sentir que,

ok, vou lançar o novo trabalho,

mas nada está garantido de que vá correu bem,

de que vá ser um sucesso,

de que a música vá ficar na cabeça das pessoas,

portanto, falta muita coisa ainda sempre,

e eu sou feliz disso,

sou feliz dessas pequenas conquistas,

sou feliz de ter mais gente da repleta de concertos,

sou feliz quando chega ao final do concerto,

e eu, esse elogios,

passou,

passou,

chamei-me vai-doze,

quiserem,

mas é isso que me alimenta.

Os elogios para mim que chegam,

é o do público.

O resto podem me elogiar,

podem me enaltecer,

mas o público é muito importante para mim.

Você já consegue verbalizar o amor?

O amor tem tudo,

o amor tem tudo o que eu faço,

e eu gosto de ser amor para toda a gente,

e o amor é isso mesmo,

o amor é um gesto,

e eu gosto de ter um lugar de amor comigo,

quando te disse que gosto de dar abraços,

mas em vão,

gosto,

gosto de muito espalhar,

o amor para as pessoas,

e acho que é também uma das minhas missões,

é espalhar isso,

a vida tem um dado tanto,

que aquilo que eu tento dar em troca,

é ser o melhor para os outros,

é espalhar amor para com os outros,

é difícil,

se caralho,

tu perguntas a alguém,

a que te posso dizer para o Jorge,

fez-me isto,

prejudicou-me isto,

fez-me mal nisto,

fez-me sacana para mim,

porque não há registros.

Se eu fiz,

foi de uma forma,

se caralho,

possivelmente,

completamente tão inconsciente,

mas não me recordo.

Então,

o amor é tudo isso,

o amor é de todos os dias,

a toda hora,

para contar das pessoas.

Sonhas de fazer vida com alguém,

para o resto da vida?

Às vezes,

esta vida,

é tão desgastante,

a nível até mesmo emocional,

e com todos os acréscimos,

que eu próprio coloque,

muitas vezes,

não seria necessário,

as casas ficas muito,

muito sem tempo para isso,

para pensar nisso.

O amor não é prioritário para ti?

O amor tem que estar presente sempre,

mas,

hoje não é.

Amanhã pode ser,

mas hoje não.

Já existiu o amor da tua vida?

Não.

Já alguém esteve perto?

Já alguém esteve perto.

Já.

Alguém te deve um pedido de desculpas?

Não.

Queria que não.

Queria que não.

Acredito que nunca ninguém me tenha feito assim,

mal, incrível.

E se eu fizeram,

portanto, acho que,

a vida própria encarrega-se de tudo.

Eu acredito muito na lei do retorno,

portanto,

eu tento, tanto,

não fazer mal ao próximo,

percebes,

que,

quando me fazem,

essa pessoa desaparece da minha vida.

Dictacemente, um pedido de desculpas

iria mudar alguma coisa,

poderia atinuar.

E tu pediste desculpas

a todas as pessoas aqui em Cris Pedido?

Eu também não tenho muita gente

aqui em Pedido de Desculpa,

Daniel.

Não que seja a profeção,

porque não sou,

longe e longe e longe disso,

mas,

não tenho.

E se tiver algumas pessoas

aqui em Pedido de Desculpa,

acho que,

na altura certa...

De que ir restar, de repente?

Rependo-me,

de muitas vezes,

não dizer que não, mais vezes.

Acho que,

tenho grande dificuldade

em dizer que não.

Agora estou a apanhar um pouquinho mais.

E com menos receio de dizer que não.

Mas,

arrependo-me de não ter dito

que não, mais vezes.

Porque,

se calhar,

fiz coisas que não me apessia,

percebes,

fiz coisas que não queria.

Com receio de dizer que não,

com outra pessoa ficasse maguala,

com outra pessoa ficasse satial,

isto e aquilo do outro.

E acabas por fazer, às vezes,

coisas sem,

qualquer tipo de,

de,

não,

de não gostar de fazer.

Então,

arrependo de,

não ter dito mais,

pôso de forte,

em algumas situações,

de não ter,

menos medo,

percebes,

menos medo.

Se pudesse mudar tudo na tua vida,

o que é que não mudarias?

E talvez,

mudasse muito pouco.

Porque eu acho que,

até mesmo,

coisas mais,

que tu fizeste 11 anos atrás,

um dia,

ainda bem que as fiz,

existe sempre aquela máxima de,

ainda bem que eu errei ali,

porque,

ainda bem que aquilo aconteceu,

menos bom,

que na altura,

parece o fim do mundo,

parece o tumor pesadelo,

mas,

depois,

acabas por,

anos mais tarde,

agradecer a tudo isso que aconteceu.

Portanto,

não mudava nada,

não mudava nada.

Porque,

eu estou aqui hoje,

aqui,

contigo,

é graça dizer,

tudo o que aconteceu no passado,

portanto,

então,

não mudava assim nada.

Se fosse garantido uma resposta,

conto a tua,

o que é que tu querias mesmo saber?

Seria adorar muitos anos,

ou não?

Se bem,

também pudesse procutar,

por seus,

portanto,

a minha data de validade,

uma prazo de validade,

acaba quando?

Querias saber?

Querias saber.

Muito saber.

Não vou dizer que mudasse muita coisa,

mas,

escalhar,

obrigava-me a ver a vida de uma outra maneira.

O que é que dizem,

os teus olhos?

Dizem que,

quero-me ser feliz,

quero-me ser feliz,

e que,

quero,

também,

continuar a dar felicidade

às pessoas que morrem.

E dizem-me,

dizem-me que sim,

dizem-me que sim,

que,

que é possível de se acontecer,

e estou cá para isso.

Obrigado.

Obrigado, Daniel.

Foi bom.

Foi bom.

Foi bom.

Feito.

Obrigado.

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Numa entrevista intimista, o cantor Jorge Guerreiro lembra a infância, as origens humildes mas felizes, uma casa cheia de irmãos, primos e tios. Recorda ainda os tempos em que trabalhou num call center e as longas chamadas que fazia: "cheguei a cantar o fado para uma senhora ao telefone", diz. "Muitas vezes os meus superiores ficavam danados comigo, porque eu passava muito tempo ao telefone com cada chamada, mas eu não conseguia ser de outra forma." Hoje, com uma carreira na música, fala de como teve de ser o primeiro a lutar pelos seus sonhos e conta também as mágoas mais fortes que leva da sua vida pessoal - a morte do pai, vítima de doença oncológica, e a de um irmão, ainda bastante novo. Oiça aqui a entrevista a Daniel Oliveira, no Alta Definição desta semana.

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