Alta Definição: João Manzarra: "O meu pai preparou-me para a morte dele. Foi difícil, foi duro, mas tivemos momentos incríveis, de muitas surpresas"

Joana Beleza Joana Beleza 4/23/23 - Episode Page - 50m - PDF Transcript

Mas ainda estamos aqui

Bem-vindo, João

Obrigado, Daniel

Estás inclinado para levar esta série?

Há 100%

100% 100%

Conheça aí, estou pronto

Estar aqui consigo, nasci que deixa-me mesmo muito feliz

João Masarra, 37 anos, estou como sou no Alfa de Finição

Quanto é que isto não vale?

Há 100%

O que é que na tua vida tu levas mais a série?

E o que é que não levas tanto a série?

O mais a sério para mim pode ser uma busca pela alegria

Ou seja, tentar encontrar o que é que me faz alegre a mim e aos outros também

A alegria dos outros é algo que me contagia também

A alegria, o estado alegre e esta busca

É o que me faz ter motivação para enfrentar o mundo

É algo muito importante

Ou seja, as tristezas mandam mesmo abaixo

A dor e o sufrimento é uma condição necessária para estarmos vivos

Então, estratégicamente, podermos compensar o aquilo que acaba por nos dar alegria

É bastante importante

Mas não é fechar os olhos de forma alguma as tristezas

É, de certa forma, saber como enfrentá-las

Procurar a flor do meio da lama?

Não diria melhor

Eu sabia que o meu pai ia morrer

Mas o meu pai dizia muitas vezes

Eu ainda estou vivo

As tantas não é muito necessária aqui

Digo que não é

É genial

Olha a lião da definição

Falámos em 2009, como os 24 anos

Que certeza queres fazer isto?

Tenho certeza?

Tu tens?

Eu sei, Daniel

Que eras tu?

Que era aquele puto?

Era um pessoa diferente daquilo que sou eu hoje em dia

Atrás dos comuns faz sentido a pessoa que eu sou hoje

Em relação com a pessoa que era aí

Era uma pessoa mais descontrolada

Era uma pessoa não tão bem preparada para o mundo

Era mais inocente

Mas era feliz

Não sei se estou na porta também muito nervoso

Estava tentando perceber o que aqui está a acontecer

Com a minha vida

Do que implica ser uma figura pública tão cedo

Pode ser um bocadinho avassalador

Essa onda que de repente com o ídolo de tutanhas

Mexeu contigo

Sim, mexeu

Era impossível não ter mexido

Ou seja, se passamos num estado de quase anonimato

Embora já fizesse o cura e circuito

Mas era uma escala muito menor

Realmente o ídolo foi um mojando de mavalanches

A vida tornou-se muito intensa

Foi uma polaridade muito súbita

Foi tudo muito rápido

O importante, muito destino é virar

Eu quis viver absolutamente tudo

O bom e o mal

Eu queria estar em todo lado

Eu queria ler tudo que escrevia sobre mim

Eu queria abraçar toda a gente

Eu costumo usar esta metáfora que é a metáfora da montanha

Que é essa idealização de que a vida boa

Está na vida de fama, de sucesso

Em que temos muita gente a olhar para nós

Isso para mim é mais evidente hoje em dia

Com as redes sociais

Em que quando os mais likes temos

Parece que mais felizes somos

Ou mais realizados somos

Então eu subi muito cedo a essa montanha

Quase que fui empurrado para cima dessa montanha

Acho que isso seria consequência do perigoso

Que isso é a nível de estrutura

Mas ao mesmo tempo

Chegar lá de uma fase muito de percoce da minha vida

Fez-me ver que, ok, se calhar

Estar aqui neste lugar

Não é a chave, nem o segredo para uma vida feliz

É importante, mas não é tudo

Quando tens muitas pessoas a dizer

Olha, és o maior, és o rei

Realmente te mexe muito com o ego

E é quase uma manipulação mental e interna

Que nos afasta um bocadinho de nós

Para mim foi importante, anos mais tarde

Até criar um certo afastamento e uma cultura com isto tudo

Para conseguir interiorizar

Tudo aquilo que tinha acontecido nos anos anteriores

Quando estamos dependentes da aprovação dos outros

Para um estado feliz

Estamos a colocar a vida na sua vida

Ou um estado de feliz

Estamos a colocar a vida nas mãos das outras pessoas

E então isso pode levar a que nós próprios

Queiramos ter uma vida editada

Vamos muita coisa em cima de nós

Temos um cuidado muito com as roupas

Com os filtros que colocamos

Isso afasta de certa maneira de uma vida autêntica

E autenticidade é fundamental para uma vida feliz

A meu ver, ou seja, respeitarmos aquilo

A que nos propomos para o mundo

E também neste capítulo da fama

Acho que há uma confusão grande

Entre aquilo que é ser importante

E aquilo que é ser famoso

Porque a verdade é que a fama vai e vem

A importância que nós temos nos outros, não

Há muita gente que é famosa e que não é importante

E há muita gente importante

Que não é famosa

E eu acho que vale mais a pena

Trabalhar-me para sermos importante na vida dos outros

O que celebrarmos a fama e sermos famosos

E chegarmos a muita gente

Aquele João de há 14 anos

De dia que aquilo que mais queria

Era não perder o brilho nos olhos

Em relação àquilo que fazia

Crees que o mundo tivesse sempre?

Não é constante

Nem em nível pessoal

Nem em nível profissional

Mas há também um amadescimento

Implica que esse brilho

Não estar constantemente presente

Faz também parte

É natural que o mundo os traga momentos mais tristes

Ou até mais esperançosos

Tu dizias também que não sentias

Que fosse uma pessoa nada consensual

Sim, sim

Eu acho que não sou uma pessoa nada consensual

Ou tenho muito boa impressão

Ou tenho má impressão

Ou posso ser simplesmente irritante

Não me considero consensual

Tenho perfeita noção

Que esta vontade de agradar a todos

Ou lutar para que isso aconteça

É uma missão praticamente impossível

E pode causar muita frustração

Tento agradar-me a mim mesmo

E aos outros também

Mas sempre aceitando

Que o de facto há quem que possa não gostar

Dias também que sofrias do mal

Das pessoas não te levarem a sério

As pessoas dizem mesmo

Que não sabem quando é que eu estou a falar sere

Quando é que eu estou a brincar

Achas que isso já está mais...

Não, não, continua

Eu tenho muita dificuldade nisso

Realmente tenho que mudar muito a minha expressão

E tenho que marcar muito bem esse ponto

Porque essa confusão entre

Nunca sei se estás a falar a sério

Ou a brincar

É algo muito comum

Nos meus diálogos diários

Mesmo quando estás a finance

Sim, sim, em todo lado

Quero quando estou a trabalhar

Aqui no programa

Quero nas finanças

Ou com os meus amigos

Estás a sério, tenho mesmo de pautar

Às vezes tenho de dizer

Eu vou fazer agora a mesma série

Mesmo assim eu não acredito

Às vezes acredito

Às vezes acredito

O homem que és hoje

Seria uma surpresa para uma zara de 2019

Sim, porque houve um processo grande

Descoberto de novas coisas

O que eu jamais pensaria

Queria estar a fazer

Ou coisas do mundo

Que me iam deixar tão felizes

Se tessem ao João de 2009

Olha, daqui a 10 anos

Tu ires sozinho para uma montanha

Campares com o teu cão

Vai te fazer muito feliz

Ir-me para o campo

A estudar filosofia

É uma coisa que vai fazer muito feliz

E ficavas chouxo nessa altura

É, não acredito

E agora a filosofia

E agora o que?

Me digas na mata

Não acredito

Mas a verdade é essa

É que hoje em dia

São coisas que me fazem realmente feliz

Eu não sei o que vai fazer daqui a 10 anos

Mas sei que ser feliz

É estarmos atentos

Aquilo que gostamos

O que passamos a gostar

E temos que nos ir afinando

Acho que é uma afinação constante

Que temos que ter ao longo da vida

Por que é que é uma ideia de felicidade

Estás a campar com o teu cão

Em uma montanha?

Porque me dá um contraste

Muito bom para a minha vida

Dá-me um silêncio

Dá-me uma aproximação da natureza

Dá-me um foco muito grande no presente

E ao mesmo tempo

O momento de introspeção

São únicos

E há um género de poesia

Que eu gosto de trazer à minha vida

No processo de montar a tenda

Ver um pôr do sol

Cair à noite

A adrenalina do isolamento

De ter o meu cão que se aproxima de mim

Isto é mesmo verdade

Não estou silêncio, mas o meu cão

Tem um polir de encaixe incrível

E esses momentos em que há um animal

De uma outra espécie

Que se deita sobre o meu corpo

E adormecemos os dois

São momentos muito belos, sim

E realmente esta coisa de viver o presente

E que hoje falamos muito sobre isso

É muito importante

E de certa maneira

Há também uma aproximação

De Deus

Para mim, Deus está na mata

Deus está na natureza

Está nos rios, está na montanha

Eu não quero ter esta interpretação de Deus

Que é revelador de uma certa individualidade

Quando nós dizemos das vezes

Ai, eu tenho meu próprio Deus

Ou eu acredito em Deus à minha maneira

Isso acho que é um bocadinho

De revelador do espírito individualista

Mas há uma filosofia mais pantaísta

Pronto, como tive a ajuda da filosofia

Há uma pessoa que eu tenho uma grande admiração

Que é o Bento Espinosa

Que foi um filósofo

E ele falava disso

De Deus ser tudo

De Deus ser substância

De Deus ser esta relação energética

Entre as matérias

Portanto, eu estou a falar contigo

Eu sou parte de Deus

Tu és parte de Deus

E Deus acaba a postar um bocadinho

Em todo lado

Portanto, não como criador

Não como o Pai

Mas esta forma de encarar Deus como tudo

Faz com que realmente

Há já aqui um constatar

Duma inteligência

E ao mesmo tempo

De um maravilhamento constante

E se está em tudo

É realmente infinito

E ao me presente também

Então, acreditando em Deus

É desta maneira

E a montanha, o silêncio

E a presença com o ser vivo

Ali junto de ti

Dá até esse contacto interior

Dá-me esse contacto interior

Leva muitas vezes

Aquilo do milagre

Que é a vida de estarmos vivos

De contemplarmos

E esse maravilhamento constante

Para mim faz muito mais sentido

Celebrar a vida na natureza

Do que, por exemplo,

E para um tempo construído pelo homem

E a filosofia do atoqueio

Enquanto o homem

Mais perguntas

Ou mais respostas

Bastantes mais perguntas

A filosofia surge através

De um livro

Um livro puxa o outro livro

E, de repente, estou embrinhado

Em pensamentos altamente complexos

E olhar para palavras

Que eu nem consigo escodificá-las

E isso tornou-se muito desafiante

Eu, como ser humano, que sei ler

Caramba, por que é que eu eixo essas palavras?

Quando estão juntas

Eu não consigo bem captar o que é que está aqui

Dei tu exemplo agora

Do Espinosa, que é um autor

Que eu gosto muito

Tenho o livro dele, não consigo ler

Abro

E é muito difícil para me interpretar

Então, tenho que ler outros autores

Que explicam o que é que lá está

Então, tenho esses intermediários

Há professores, explicadores

No YouTube, há muitas coisas

Também, há muita gente com competência

A filosofia, para mim, o que trouxe

É um abrandar

No mundo em que nós estamos sempre

Passar conteúdos

Que temos citações curtas

Em que parece que lemos as coisas profundas

Mas que duram 5, 10 segundos no nosso mente

Ou seja, ter tempo para pensar

Para refletir, para aprofundar

É algo que a filosofia, de facto, me traz

A memória de meu pai

É de tudo o que se apresenta

Na minha consciência

A mais bela das ideias

A tua infância

Melhora com o passar do tempo

A infância, por acaso, não

Porque, na verdade, na minha memória

Há muitos momentos não tão bons

Que ficam muito presentes

Momentos a ter algum tipo de agressão

De algum tipo de bullying

Algum tipo de episódios menos bons

Que continuam gravados

Os seres mais gordinhos?

Não só na parte física, também

Acho que isso tornava um pouquinho mais

Aplativo para alguns encontros mais violentos

Por exemplo, andei nos coteiros

E tive alguns episódios menos bons

Lembro que fui agredido por uma pessoa

Uma guia, na altura

Isso foi muito violento

Nesse episódio em concreto

Por ter feito alguma coisa

E nem ela é ridícula

O que eu fiz foi irritante

Que era, sabez-me, a potência de dar nós nos coteiros

E eu não sabia apertar os chapatos

Então fiz um nó

Lembro que foi também do nó que fiz

Que era, nó sobre nó, sobre nó, sobre nó sempre

Pai, ficou assim um atacador sisticado

Pai, mas li umas chapadas

Achei aquilo demasiado, e marcou-me muito

Por exemplo, na minha adolescência

Fui muitas vezes assaltado

A porta do cléus onde eu estudei

Havia sempre muitos assaltos

No primeiro assalto, lembro que fui agredido também

Deram-me um soco na barriga

Levaram-me tela móvel, na altura

E se recordam bastante bem

E se parece que causam um peso

Depois, no balanço das memórias

Também se fui muito amor

No início, amoroso

Foi de muitas paixas, não conseguia

Aí eu acho que era por ser gordinho, na verdade

Os adolescentes ligam muito ao corpo

O que é que era ser feliz nesse tempo?

Era muito baseado na amizade

Nas boas relações com os amigos

Na comida também

Adorava comer

Nas férias, no brincar

E também nas aulas que eu gostava

Gostava muito de história, gostava muito de geografia

Havia muito bons momentos

De estudo e depois da prova

E de ser bem sucedido

Me dava muito prazer também

Dava muita alegria

O chegar à casa

E ter lá o meu pai, o meu irmão

E a minha mãe

Essa unidade familiar que vivi

É algo que não se esquece

Quando a vivemos achamos que realmente

É para sempre, às vezes há vínculos

E ligações e menos de vida que eternizamos

Estas três pessoas, o meu pai, a minha mãe e o meu irmão

Tiveram uma implicação muito grande

Naquilo que eu sou hoje

Quando olhas para trás

E para o puto que fôs

O que é que é mais incrível que tenha acontecido?

Para mim o mais incrível

É difícil desassociar da minha vida profissional

E ainda hoje penso que é um bocadinho

Inacreditável como as coisas acontecerem

E podiam não ter acontecido

Aumenta a minha vida em que eu vou entregar

Um currículo para um programa da TVCAB

Na SIC do qual assistia

Ou seja, eu via em casa e ligava para o Ruiunas

Nainda no CNL e depois na SIC radical

Isto é quase uma história de Cinderella

E de fantasia, de repente entrego

Esse currículo, a primeira vez que entrego

Nem sequer ou não para ele

E depois foi um amigo meu

Que no ano seguinte disse

Vamos entregar novamente

E eu nem estava muito esperançoso

E de repente sou chamado

Mas quando sou chamado e faço o primeiro casting

Chame de arrogante ou convencido

Ou quer que seja

Eu sabia que as coisas me incorreram neste sentido

Depois de fazer a primeira entrevista

Já com o microfone, com a repórter

Eu disse aos meus amigos que fui tomar um café a seguir

E eu acho que vou ganhar o casting

E sim começar a minha história

De que vantagens beneficiaste no auge do sucesso?

Um carinho constante

De um grande cuidado da parte das pessoas

De uma libertação financeira

E do privilégio que é poder

Comunicar

E sermos ouvidos

Embora nem sempre me levem a sério

Gosto das duas maneiras também

Quando comunico e não me levam

E quando comigo e também me levam a sério

Há necessariamente um período de ressaca

Depois desse sucesso

Das atenções não serem as mesmas

Eu prefere e tenho períodos desses

E ainda bem, porque por oposição

A tudo que Bonéfia disse que me traria

Há coisas que não me agradam tanto

Há uma hiperexposição

Que muitas vezes me incomoda

E há também um colocar de pedestal

Eu tento sempre sair o máximo possível dele

Parece que nos põe no lugar

Que é muito ilusório

Pode criar uma ilusão muito grande

E esse sair e estar mais próximo das pessoas

Pra mim sempre foi muito importante

E esses momentos agora de calma

Desapelos eu até agradeço

E preciso deles, na verdade

Para mim, estar constantemente na ribalta

É algo de grande desgaste

E até porque há uma relação mesmo

Quando estou a trabalhar

E acabo de fazer um programa ao domingo

Ou durante a semana, mesmo na rua

Há um interesse maior, há uma aproximação maior

Que eu agradeço e sou grato

Mas também há um desgaste grande disso

É um despender de energia

Na maioria das vezes que vão ao sítio

Há uma expectativa do que é que são

Ter uma vida livre de assolhares

De esses desapelos

Para que seja mais equilibrado

De que erros de repente?

Eu aprendi muito com os erros

Há alguns de que me arrependo

De uma certa explicência

De uma certa irresponsabilidade

Muitos a nível profissional, até

De olhar para trás e sentir

Que poderia ter sido bastante melhor

Em alguns projetos

De meter entregue às vezes a uma vida

Tem que a diversão era

Um pouco a prioridade

Entregar um bocadinho às paixões

Que a vida nos dava, jantaradas

Até pessoalmente

Há as mulheres, há muitos amigos

A querer fazer tudo e mais alguma coisa

Ou seja, a minha entrega muito grande

E sequer era que eu fosse forer algumas consequências

Mas aprendi que

Em portanto, termos um bocadinho mais de medida

Saber balançar um bocadinho mais as coisas

Sinto uma pessoa bastante mais estável hoje em dia

Porque, se calhar, no passado foi assim

Em 2013

Dizias que

Procuravas não te deter muito

Nos momentos de tristeza e sinto lá

Aquelas pessoas que, quando estão tristes

Põem músicas tristes

Eu é exatamente o oposto de sentir

Que estou a ficar em baixo ou triste

Convido alguns amigos pela casa

Ou põe uma música ou eu gosto de conversar

Hoje ainda é assim

Eu aprendi a importância da tristeza

E de certa maneira até de amá-la

Quando eu digo amar

Comer a perceber, olhar para ela

De certa maneira até cuidar dela

Não ser tomado por ela

Exatamente, ou nós nos entregamos

E somos tomados pela tristeza

E trazem-la com nós que carregam-la

Mas se nós atrasermos para nós

E soubermos olhar para ela

E tivermos realmente algum tempo com ela

E a lidar com ela

Depois vai trazer-nos realmente bastantes ofícios

Se houve alguma coisa onde eu sinto

Posso ter amado-se

É, efetivamente, na relação com a tristeza

Na despedida do teu pai

Procuraste relevar mais os momentos

Que tinhas vivido com ele

Do que a dor dessa perna

Foi um ano que vivi com o meu pai

Ou seja, neste cuidar e de atenção constante

E de relação

Em que as tristezas eram muito fortes

E as alegrias também

E viver nesta dinâmica

Em que a aproximação era sempre constante

Fez com que a vida se tornasse incrivelmente bela

Durante esse período

A minha vida tinha um sentido

E sem dúvida alguma que foi o ano mais importante

E mais belo

Da minha vida

A missão era uma missão de entrega

Era uma missão de dar

Era uma missão de cuidar

Houve sofrimento

Houve dor

Mas houve também um foco muito grande

Naquilo que eu podia ser

Naquilo que eu podia ajudar

Para tornar o ano que corria

E muito nisso também

Naquilo que profissionei, nas surpresas

Nas pessoas que acabaram também

Para me ajudar nestes momentos de dor

O amor que se recebe é muito bom

E isso eu recebi sempre

Embora tivesse a maior parte do tempo sozinho

Essa gestão

O carinho dos amigos, as palavras

Os abraços

Mesmo profissionalmente o tempo que me deram

O espaço que me deram para poder viver este momento

Foi absolutamente fundamental

Havia uma perspectiva da gravidade

O teu pai sabia o estado

Havia sempre alguma esperança

Mas os resultados não eram muito bons

As coisas nunca eram muito esperançosas

Que chegavam das análises

E mesmo a nível de reações físicas dele

Eram sempre

Não muito boas

Eram sempre muito frustrantes

Nós tentávamos compensar isso

Com os momentos mais alegres possíveis

Com alguma leveza

Com uma aceitação

Mas na verdade

O que eu tive para encarar esse momento

Veio também da estrutura que o meu pai me deu ao longo da vida

Portanto, o meu pai preparou-me

Para a morte dele, de certa maneira

Eu lembro quando era pequeninho

Sempre que eu acordava a chorar

Eu ficou a morte do meu pai

E chorava e acordava e preocupava

E depois não conseguia dormir

Era sempre com o perder

Mas depois quando aconteceu

Foi difícil, foi duro

Mas foi a melhor gestão emocional

E não foi de contenção, foi mesmo de libertação

Às vezes dizia o meu pai

Às vezes preciso chorar, aceita que eu chore

Às vezes tinha que chorar

Mas tínhamos momentos muito incríveis

Houve muitas surpresas

Na altura, olha, tive o privilégio

De ter uma estabilidade financeira

Isto agora é um bocado ridículo

Mas o meu pai bastou-me dizer uma vez

É, pá, agora este dos carros elétricos sonho

E eu sabia que o meu pai não tinha muito tempo

Para desfrutar de um carro elétrico

Mas ainda assim, fiz alguns esforços

Esse carro, e chegámos com essa surpresa

O meu pai gostava muito, por exemplo, de marisco

Então lá e eu

Pestariano, vegano

Ou com estes mesmos ideais

Todos os dias que íamos fazer quimioterapia

Não houve uma quimioterapia que o meu pai fizesse

Não fosse a primeira malagosta

Houve uma parte muito importante para o meu pai

Que era ir às Vésperas

Que teve um acolhimento muito importante

Em Fátima das Carmelitas

Não sou uma pessoa muito religiosa

Mas tenho um grande respeito

Foi um período de vida

Muita intensidade, mas com uma beleza

Também muito grande

Por muito que nós, muitas vezes

Digamos que estamos preocupados

Com outra pessoa, ou que outra pessoa

É mais importante do que nós

Naquela período da minha vida

O meu pai era, de facto, mais importante

Mas isso dava-me um

Um entusiasmo

Dava-me uma potência

Dava-me uma força para enfrentar a vida

Que eu nunca tinha reconhecido antes

Mesmo que eu luta por centímetros que pudesse ser em glória

Sim, sim, eu sabia que ia acontecer

Eu sabia que o meu pai ia morrer

Mas o meu pai dizia muitas vezes

Eu ainda estou vivo

Eu ainda estou aqui

Nós vivemos momentos incríveis

Nós vivemos momentos de silêncio

A mão

Eu às vezes, por exemplo, quando me dito diariamente

Eu ainda põe-me uma mão aberta

Como se tivesse a saber a mão do meu pai

Nós tivemos momentos

De pura alegria

De pura contemplação

De pura

A fragilidade dele

Acompanhado

De uma força que eu ia buscar, não sei onde

O momento em que eu tinha que realmente carregar

O meu pai já era uma fase muito frágile

Da vida dele

E houve uma vida vivida nesse ano com o meu pai, foi de facto extraordinária.

Foi mesmo até o último suspiro, parecia mesmo um filme.

Quando assistimos à morte de alguém, até ao fim,

há mesmo este desvanecer, há mesmo este desaparecer físico.

E há uma imagem em que está a ver o meu irmão e minha madrasta,

em que o meu pai, olha, individualmente, para cada um de nós, é despedida.

E eu sabia que esse era o último olhar do meu pai.

E essa imagem mais profunda e bonita que trago comigo,

e essa imagem vem-me tantas vezes.

E depois desse olhar, houve um outro momento a seguir,

em que eu fui apenas espetador,

meu pai já não tinha vida, estava na cama,

e o meu irmão vai buscar de uma guitarra e canta um tema do George Harrison,

que era o tema favorito dele em guitarra.

E esse momento em que eu realmente não participei, isso olha e contemplei,

foi de uma emoção e foi de uma celebração desta união que eles tinham e que nós tínhamos,

porque o meu irmão não era nada disto, não era nada disto.

De certa maneira, eu senti que naquele momento que o meu irmão passou a ser o meu pai,

parte de meu pai quase que ficou absorvido pelo meu irmão,

e eu sinto também, no dia 2, que eu absorvi.

E às vezes sinto que a minha vida é uma parceria entre mim e o meu pai de certa maneira.

O amor dele ficou cá.

O amor, um olhar para a vida, o elogio que às vezes me fazem mais,

é que o teu olhar é muito parecido ao teu pai.

Olha, parece que faz membro ao teu pai,

o teu sorriso faz membro ao teu pai.

Isso é uma coisa que eu gosto muito de ouvir.

Não sei, parece que há uma colaboração.

Quando digo que o meu pai vive em mim, não é só para ser bonito,

é porque realmente eu sinto, eu sinto.

A maior lição da vida que ele deu foi dar.

Dar sem receber em troca.

O meu pai, de facto, viveu assim.

O meu pai viveu de uma forma muito simples,

a dar valor às pequenas coisas da vida,

e o meu pai entregava-se muito.

O meu pai era de muitos abraços, de muitos risos,

e era, de facto, de dar.

E sem grandes expectativas de receber.

E de dizer para brincar e não dar tanto tempo em ser ao estudo.

Isso ficava para o segundo plano.

Exatamente.

Exatamente.

O meu pai recomenda isto,

para eu me abster e ir mais do estudo,

e para brincar.

O meu pai levava a brincadeira muito a sério,

era muito importante que essa componente da vida tivesse presente,

e foi assim até o fim.

Agora, se eu estou a conseguir cumprir, não é fácil,

é um exercício difícil de dar sem expectativa de receber.

Mas vamos tentando.

Um dos momentos mais bonitos que eu presencei na vida,

foi a despedida do teu pai com o Júlio Rasenda ao piano.

Fiz esta questão,

que aquele momento tivesse essa mesma paz.

Sim.

O meu pai era aquelas pessoas que...

que queriam nos ver sempre com sorrisos e felizes,

e que a despedida dele assim fosse.

Não é fácil.

Não é um exercício fácil.

Eu queria tornar esse momento o mais belo possível.

E agora que eu também queria deixar uma palavra,

falar-te no Júlio, o Júlio foi uma poção incrível.

As pessoas não sabem isto,

mas o Júlio apareceu na minha vida exatamente nesse momento,

viveram um concerto dele,

depois falámos um bocadinho,

e ele até tocou a piano uma música favorita de meu pai,

depois chamou o Salvador Sobral para cantá-la,

e também, obviamente, na quimioterapia,

que eu levo uma coluna, olha, pai, o Júlio fez este tema para ti,

e ele não estava bem a perceber o que estava aqui a coisa,

mas para mim, que é um tema dos bizis.

Para mim, o importante era realmente conseguir transmitir aos outros,

através das palavras o que o meu pai tinha sido para mim,

e era também entregar-me e dar espaço também aos outros

de estarem no momento como quisessem,

e é percebido que, nestes momentos de grande ausência que sentimos,

o amor que recebemos é muito importante.

Nem é preciso as pessoas terem cuidado com as palavras,

ou não quer que vão dizer,

porque às vezes fica um bocadinho aqui,

às vezes só a presença.

A presença é muito importante.

E aprendi-se, aprendi-se exatamente neste momento.

Às vezes as pessoas convidavam-me para coisas importantes para elas,

em uma psia e eu não ia, e, neste dia, percebi-me disso mesmo.

O amor que recebemos depois de simples presença dos outros é fundamental.

Gostava que me lese disto.

Claro.

A memória de meu pai é de tudo o que se apresenta,

na minha consciência, a mais bela das ideias.

Coberta por um véu,

é luz em constante disponibilidade de relação,

no obscuro, jogo de mente.

É um sopro leve que arrasta as pedras da pressão,

verdadeiro antídoto para a tristeza e o medo.

É também lembre-te, em tinta dourada,

para depositar sempre alegria no dia do outro,

a memória que me deixou inestimável, desafiadora do tempo,

capaz de devolver ao presente as sensações do mais sentido o abraço.

A memória dos telefones também é muito boa,

está lá o mais belo dos sorrisos,

levou-me aos dias de tratamento no Hospital de Santarém

que resubilava com o marisco que levava,

as fotos das viagens a Roma, ao Cairo,

Bahamas que partilhava com vaidade,

aos dias que passavas pujado na mata,

às flores que o paravam sempre para as contemplar,

as caminhadas na praia e os incríveis abraços a três.

Tenho pai, feliz dia.

É isso é o que eu sinto, eu tenho pai.

E continua a ser um antídoto para a tristeza e para o medo?

Não é bem o antídoto porque eu tento não cobrir as tristezas,

mas é um recurso constante de alegria e de inspiração,

para mim, para o meu irmão e para muitos que vieram de perto,

com ele, aprende-se muito com a morte.

O que é que você aprende?

Aprende-se que o medo que temos dela, muitas vezes,

é injustificado,

que é melhor passar por ela do que tentar projectá-la

com todos os medos e ansiedades que isso possa trazer.

Aprende-se que é realmente importante aproveitar a vida.

A morte é uma condição, nós gostamos de estar vivos.

Será que íamos gostar de estar vivos se não morressmos?

O que é que seria a vida se não houvesse a morte?

Não sabemos, nunca veremos saber.

E eu prefiro que seja assim, eu prefiro que nós possamos viver e morrer.

Porque é assim que realmente faz sentido.

Em que momentos mais pensas nele?

Pense neles e no momento tenho preciso de alguma coragem.

Posso ter mais ansiedade.

E às vezes, em momentos sem aviso,

em que me aparece, e em todo e qualquer por do sol.

Isto é interessante porque o meu pai careca e espera do sol.

Faz muito lembrar o meu pai, além da luminosidade,

não sei, há uma beleza no momento.

Quando eu olho para um por do sol, há sempre esse encontro.

Esses momentos estão fraturando de tua vida,

não ter próximo de Deus, de uma dimensão religiosa.

Não tanto na parte religiosa,

mas talvez não tenha derrubado algum ceticismo nesse sentido.

Não tenho a certeza quanto à incidência da alma.

Tenho muitas reservas quanto a uma vida depois da morte.

Mas fez-me levantar algumas questões.

Sim.

Às vezes é uma presença forte mais para atribuir só a memória.

A minha precisa é do colo da mãe.

Sim.

Eu preciso do colo da minha mãe.

E muita gente, eu gosto muito de colo.

Gosto muito de colo, gosto muito de festinhas.

Outro ocupo, não vou sentar aí.

Não vou sentar aí, mas gosto de abraços.

Sempre que alguém me pede um abraço, é muito natural e adoro.

Que coisa te deixa mais feliz na vida?

Eu não consigo dizer o que é que me deixa mais alegre.

Mas posso garantir-te que esses momentos de alegria

são sempre momentos em que estou inteiramente presente,

inteiramente focado e que valem por si só.

São aqueles momentos da vida em que queremos que não acabem.

Qual foi a maior manifestação de amor que tiveram para contigo?

A minha mãe tem muitas ações de entrega total,

que eu me diga realmente muitas vezes do bem-estar dela por mim.

Às vezes nem valor isso tanto quanto devia.

O meu pai também o fez tantas e tantas vezes.

Eu me sinto muito amado, sinto.

Acho que é cada momento que nós temos que fazer decisões cruciais,

nós vamos sempre perder alguma coisa.

O que me diverte mais aqui?

O que me diverte mais é, sem dúvida alguma,

os momentos em que não só o público mas os convidados se riem ali.

Posso experimentar?

Posso, senhora.

Aí ajudam a pôr as lentes?

Sim, senhora.

Desculpa-me.

Mas o que me dá mais entusiasmo é quando preparo os cenários inclinados,

eu e o Pedro Figueiredo, que é o guionista,

e me sentamos ali a escrever o que é que vamos fazer agora,

o que é que vamos ter, os personagens é que vamos criar,

e os meus convidados se surpreendem-me sempre na execução.

Quando estou aqui a dar ordens, eles improvisam

e fazem magia com as ordens que são dadas.

Chega uma banhista super relaxada!

Olá!

Ensaias as danças em frente ao espelho?

Comecei a ensaiar agora não.

Tentei que aquilo não é treinado.

Aquilo não é treinado, mas parece, não é?

Aquilo...

Não diria isso, mas...

Deixe-me levar pelo meu corpo.

Às vezes corre bem, às vezes nem tanto.

Mas acho que o programa ganha sempre.

Onde é que tu és mais de tudo?

Na árvore dos eixos, na máscara, no valtudo?

São todos os formatos que eu gosto muito de apresentar.

Quer no valtudo, quer na árvore dos eixos,

é muito próximo da pessoa que eu sou.

Vocês foram escolhidos pelo árvore dos eixos!

Quando vejo os programas e me revejo,

sinto que está ali a minha ciência, a minha autenticidade

e sinto que é o monestidade para o que o espectador.

O que me agrada, se carai no valtudo,

é mais como eu sou com os meus amigos,

quando estou bem, quando me irritam também,

e a minha resposta é muito sincera e imediata.

Carai, isso é um cagabote, está a regra.

Na árvore dos eixos, um bocadinho mais afetivo

com a relação com a mais próxima,

que é a relação muito parecida

com as pessoas que toam a minha volta,

com a minha mãe, com o meu irmão, com os meus amigos.

O voo ainda não percebeu que a surpresa é para ele, ok?

Ok.

Quando falamos para a árvore dos eixos,

tu teres a certeza absoluta

de que aquilo seria completamente à tua cara,

essa relação com a pureza que as crianças têm.

Sim, porque na verdade eu só tinha apresentado

ainda coisas mais adultas, ou muito formatadas,

ou em que o humor estava muito presente,

mas nunca com um lado muito emocional ou muito sério.

Mas a árvore dos eixos aparece também

num ponto focal da minha vida,

que foi pouco depois de meu pai partir.

E então, eu tinha tido um ano de grande proximidade,

um ano de grande trabalhar em emoções,

um ano em que a afetividade estava muito presente.

A árvore dos eixos foi mesmo o problema

que eu precisava mesmo na minha vida,

até porque eu vivi um momento de alguma ruptura com o público,

porque eu fui muito criticado, levei muito na cabeça,

por dois ou três pontos,

e decidi interferir nas cidades.

Foi a parte da mudança da alimentação,

foi a parte de ligação

com o acolhimento dos refugiados na altura da Síria,

e isso trouxe-me alguma ficção com o público.

E a árvore dos eixos funcionou também

um bocadinho com uma reconciliação,

porque é um programa muito próximo,

e eu vejo se reconciliar, que foi importante para mim também.

As várias mudanças que eu tu ouvidas sofreu,

que eu já falaste delas alimentares, etc.,

mudaram alguma coisa no apresentador?

Sim.

No passado, a minha comunicação passava muito

de fazer rir, como é que eu hei de fazer rir,

partilhar um pouquinho o meu estilo de vida,

a boa vida que tinha,

e se a terminar do momento altera um bocadinho a minha comunicação,

e para ter determinado os cursos,

eu tenho que ter outro tipo de propriedade,

tenho que ter outro tipo de reportório.

Eu, para falar de ecologia, de veganismo,

eu tenho que ter alguma estrutura,

eu tenho que ler, tenho que ter algum fundamento

para não cair num vazio opinativo.

Procurando essa estrutura,

também internamente.

Quando saias de Lisboa, vais à procura de quê?

Quando decides viver fora de um grande centro.

A história da minha saída de Lisboa

prende-se com um momento de vida.

É por necessidade,

meu pai morava em Fátima,

e eu durante esse período,

quis mudar de sítio,

porque para minha prioridade,

era acompanhar o meu pai e estar presente.

O que acontece,

é que os benefícios de estar no campo,

estar um bocadinho mais isolado,

foram tão grandes para este momento da minha vida,

que eu decidi transpô-los para o resto.

Não me fazia sentido depois voltar.

Trazer os benefícios do silêncio,

da ausência de ruído,

de estar um bocadinho de longe,

o que faz com que não haja tantos apelos.

A vida na cidade tem um ruído constante,

tem muitos apelos,

tem muitos convites,

tem muita coisa a acontecer.

E esta paz e esta sanidade

criamos uma melhor estrutura para enfrentar o mundo.

A facilidade como que vejo o por do sol,

a facilidade com que ouço os passos,

a facilidade como que passei o meu cão,

a facilidade como que posso ter um burro.

Realmente é algo que só onde moro,

ou no campo, é possível.

Não recente ser um autosider,

na dinâmica profissional, etc.

Não.

Não.

Também não há uma distância assim tão grande,

mora 50 minutos de qualquer coisa que possa acontecer.

Acho que no ganho, para mim,

é muito mais bonéfico morar onde moro.

Que coisas é que deixaste de dar importância?

Talvez tenha de deixar de dar importância às certezas.

Ou seja,

que nada na vida é muito certo,

que ao mudar constante,

todos os dias aparecem coisas novas,

todos os dias aparecem um contraditório.

E de facto, não há muitas coisas como certas.

Então, passei a estar um pouquinho mais neste posicionamento,

não ter muitas certezas de nada,

até mesmo das minhas convicções,

até mesmo das coisas em que posso achar que acredito,

mas é isto, eu acho que acredito.

Prefiro estar num lugar de incerteza e de dúvida,

isso ser até mais fácil para um diálogo,

e até na relação com os outros,

do que ser uma pessoa com muitas certezas.

Já sentes que as tuas opções alimentares

não são vistas de um modo tão isótico por os outros?

Sem dúvida.

A palavra que eu ouvia mais em 2014

era que eu tinha fritado,

ou seja, que eu não estava bem da cabeça.

Não só pelas opções alimentares, mas também pelo meu cabelo.

Na altura como estava tão convicto e tão entusiasmado,

senti mesmo em uma batalha,

e então achei que isso fazia parte,

mas ao mesmo tempo era também um bocadinho duro.

Esse foi um período de não aceitação por parte de muitas pessoas,

mas é interessante que mesmo nesse momento,

e agora fazendo uma atualização,

para mim é importante falar um pouquinho sobre isto,

houve um peso que para mim não foi fácil de gerir,

que é o peso de quase ser uma bandeira do veganismo,

que na verdade nunca foi a minha intenção,

e isso pode trazer também algumas consequências,

e também esta ideia de que eu estou no lado do bem.

Isto estar no lado do bem é muito perigoso,

porque se eu estou no lado do bem,

eu acho que todos os outros estão no lado do mal,

e esta polarização é algo que aconteceu na minha vida,

e que eu nunca quis para mim,

ou seja, eu nunca senti que eu estivesse no lado do bem,

para mim era importante falar sobre isto.

Mas é o embaixador de...

Sim, sim, não queria concluir-se nessa posição,

mas isso é para acontecer um bocadinho,

e até nem sequer é justo, por exemplo, nos dias de hoje,

porque nos dias de hoje eu como ovos,

eu muitas vezes como uma sobremesa,

ou seja, há pessoas que são muito mais rigrosas,

e eu não sou tanto assim.

Eu sei que hoje em dia é muito importante nós,

por uma questão até de fidelidade para o outro,

de irmos adaptando o discurso,

e dizemos a pessoa que somos hoje

para não ver mal entendidos com o passado,

mas isso também traz alguns gastos.

No entanto, nos dias de hoje,

eu tenho o ideal de veganismo, por exemplo, nesta parte,

eu acho mesmo que é a melhor alimentação

acima de tudo para o planeta,

e também benéfico a nível de saúde,

e para o bem-estar animal a 100%.

E é para mim a alimentação ideal,

e esse é o ideal que eu tento caminhar,

e tento ir para lá, mas com muitas e inúmeras falhas.

Mas sem querer impor isso a ninguém.

Em mente a algum do meu discurso,

de facto impuso isso no que aconteceu.

Uma das coisas que me entusiasma também

é a troca de argumentos.

É o diálogo, é uma boa conversa.

Só na existência do oposto,

é que acabamos por crescer os dois,

e eu sei perfeitamente dizer,

eu é que estou bom, eu é que estou bem,

devias fazer como eu, é uma anulação total.

O que é que foi pior nesse período de 2014,

quando diziam que tinhas feridado?

Eu acho que foi a mesma agressão das opiniões,

e das palavras.

Saber que na verdade a minha partilha,

e o que eu estava a fazer,

até tinha um lado de algum altruísmo,

e a não aceitação de algumas ações,

podem ter costado um bocadinho,

até porque há alguma violência bastante,

nessa comunicação muitas vezes.

E o cabelo era por razão?

Aquele cabelo?

Não sei, é verdade,

o tema é que passou a ser o cabelo.

Foi uma fase, queria ver.

Queria ver o que era ser mais viking.

Mas agora ter para trás e ter gosto algumas vezes da imagem.

Não te preocupo, está tudo bem.

Não vais ter um volto de errado de cavalo.

Há-se de vinte sigais, está tudo bem.

O que é que aprendes com os animais?

Mais do que aprender, às vezes é mais aquilo que os animais dão.

Neste caso, por exemplo, a relação com o meu cão é uma relação muito séria.

Neste caso com os meus cães.

Porque há uma facilidade que o meu cão tem,

em perceber o meu estado espírito,

e como acomodar-se a ele.

O meu cão percebe perfectamente que quando eu estou mais alé,

quando eu estou mais exaltado, quando quero brincar,

percebe a minha tristeza e a que moda-se a ela.

Aconteceu o número de vezes na minha vida,

eu ter menos bons,

e o meu cão aproximar-se, ficar sereno ao meu lado,

é um burro não tanto.

Por isso que eu queria, de lado,

que é um cão realmente especial.

Aprendo que, às vezes,

a presença na vida do outro,

até pode ser só de escuta,

só de estar,

e que não precisamos ser tão ativos,

e que há um espaço de acomodação sempre para o outro.

Nem sempre tem que ser a dar alegria.

Às vezes, pode ser realmente só na espera,

no estar, ou só no dizer, estou aqui.

O burro deve dar muito trabalho.

O burro dá algum trabalho?

É um trabalho partilhado com meu vizinho, João.

Fala aí.

Quem eu gosto muito.

Mas é uma presença muito simpática.

Faz muito cocó, não?

Faz muito cocó.

O cocó depois é muito bom também para a horta.

Há muita gente que está interessado no cocó do meu burro.

Não está à espera desta.

É um cocó que não cheirá assim tão mal,

e até é uma atividade que nos torna mais humildes.

Quando vais ali com uma pá,

e pegas no cocó e tudo mais,

agora estou à procura de uma companheira para o meu burro.

Meu vizinho vendeu algumas das ovelhas,

e eu estou aqui com todos os lábios.

É muito bonito.

Tudo cita de ter um burro porque...

Porque havia um burro que estava a sofrer.

Foi mesmo assim.

Chegou uma história de um burro que estava preso

em determinado sítio.

Tinha um que dar comida todos os dias, estava amarrado.

Há chuva e alfrio.

E quando recebi essa história,

percebi se poderia ter algum encaixe na minha.

Eu fui falar com meu vizinho,

e então tínhamos um terreno entre as nossas duas casas.

Nós podemos, se calhar, trazer este burro para aqui.

Será certamente mais feliz do que onde está agora.

E o Bruninho todos os dias rejuvila

com o seu zorrar.

E é um sucesso na aldeia.

Há pequenas discussões, as crianças vão ver o burrinho.

Muitas vezes deixam entrar para dar uma festinha

ao Bruninho.

Se chama-se Bruninho?

Se chama-se Bruninho, Bruninho.

E uma maravilha aparece como na tua vida?

Uma maravilha aparece

no meu amigo meu que o encontrou na autostrada.

Fez um post no Instagram

a ver se encontrava alguém para fazer família de acolhimento temporário.

Nesse momento não tinha

nenhum animal em casa.

E disse, olha, eu posso ficar com o cão durante uns tempos.

Mas, ao segundo dia de convivência,

não o quis largar.

Por quê?

Aumente chave, que é um momento muito bonito,

que foi na praia de Supertubes, vim com ele.

E quando tu passara a reventação

e as primeiras ondas já estava bem longe,

olhe para o lado e até me assustei

com o meu lado e era uma maravilha.

Ou seja, ele veio atrás de mim, passou a reventação

e isso foi de uma emoção brutal.

Obviamente depois que tentei com o cão,

vamos sair daqui e voltar para a praia.

Mas foi aí que começou a história

e foi esse momento em que eu decidi, olha,

agora vamos ficar juntos para sempre.

Espero eu. E assim tem sido.

Leva-lo por todo lado.

Você está aqui para o estudo?

Todo lado. Sim, sim.

Oh, querido, desculpem lá.

Tu não pode jogar esse chuve, menino.

E nas viagens também?

Sim, tudo o que são viagens que não impliquem a avião.

Nós já fizemos muitas viagens, já fomos a muitas montanhas,

fizemos uma viagem incrível de carro até Amsterdão,

em que ele anda na bicicleta.

Aquelas bicicletas têm um sexto à frente

e andamos a procurar as cidades.

Já subimos à montanhas e acabámos dois no silêncio,

com que agora desporto.

Nós andávamos muito bicicleta,

eles faziam 50 a 60 km, agora com a idade.

Eu andava bicicleta elétrica agora já não antes,

também por causa dele.

Desteas viagens que fizeste,

mas eu acho que é muito importante.

Sem dúvida alguma que eu sou muito mais

da construção da natureza

do que da construção humana.

Que também gosto de atenção.

Gosto muito de arte, gosto muito de expansão

criativa, humana, o que me leva mais às cidades

até são os museus

e aquilo que podemos aprender com eles.

Mas para mim, não há nada mais incrível

do que chegar em frente a uma grande rocha,

um lago muito bonito,

uma grande paisagem,

ou chegar ao pé de um riacho,

ou ser pai.

Tu em 2013,

aqui no Alta-Deficção, revelavas

o teu imenso desejo de ser pai.

Eu gostava mesmo de ser pai.

Veste com vida para isso,

ou ser pai é algo que pretendo cumprir

neste período de vida que tenho,

quero muito deixar vida no planeta.

O que é que tu queres da vida,

quase chegar aos 40 anos?

Quero saber adequar mais vários estágios de vida.

Não quero chegar aos 40, aos 50, aos 60 anos,

com a mentalidade de 20 anos.

Quero amadrecer, quero ter

esta postura de saber olhar para a vida,

de receber o mundo e crescer com ele.

Não quero estar estagnado,

não quero viver preso ao passado,

quero saber adaptar-me ao futuro, quero afinar-me

e quero receber o mundo com curiosidade

e com poucas certezas.

E por muitas convicções que tenha

se sentir que não passam disso,

convicções e às vezes argumentos

que me fazem mais sentido e que é muito importante

ouvir o outro neste processo.

O que é que tu orgulhas mais?

As pessoas não são construídas,

tanto das pessoas mais próximas

e que têm um peso na minha vida,

como das pessoas que vejo aqui e ali,

ou com quem trabalho e que podem não ter tanto

protagonismo, destas ligações

que acabei por ir criando ao longo da vida

e que vou criando.

Acho que é isso.

O que é que te irrita?

Irrita uma discurso do ódio.

Irrita-me esta tentativa constante

de eliminar o discurso do outro,

esta não-vontade para o diálogo.

Irrita-me um bocadinho uma certa despreocupação

com a sociedade, com o lugar político,

com as pessoas que dizem que a política

não me interessa, ou que são todos iguais

e que utilizam muitas vezes no discurso

a culpa é deles

e nunca se assumem como parte do problema.

Dizer que os portugueses são este e aquilo

e não nós somos este e aquilo.

E se por acaso foi um cuidado que eu passei a ter

no meu discurso, que é incluir-me

em todos os problemas. Quer nada a ação

de animais, nas crises financeiras,

nós temos um problema micro

de um grande macro, ou seja,

o problema parte também de nós

e quando nos incluímos, depois de anos

mais vontade de fazer algo

para mudar as coisas

e não nos desculpabiliza tanto.

Alguém te deve um pedido de desculpas?

Não, não, não,

ninguém deve. Já tive

ações feias

e que me duram bastante

ao nível de amizade

para pedir desculpas a todas as pessoas

que querias pedir.

Pedi, pedi para mim isso é importante

só para dar aqui um exemplo que para mim é importante

essa parte de não te deixar

desculpas pendentes, odores

a amadurcer

que uma vez, sem muito mal

de uma casa que estava ao lugar

e passado um ano do nada

decidi enviar um e-mail ao meu senhor

na altura e fizemos as pazes

porque esse peso permanecia na minha vida

e há uma libertação muito grande

para vermos os assuntos pendentes

por muito que nos custem. Nós inditavelmente

vamos sempre magoar e sempre magoados

mas há solução possível para essas mágoas.

Se pudesse mudar tudo na tua vida

o que é que não mudaria isso?

Daniel, eu não mudava nada.

Há um risco muito grande

e ao meu senhor muito grande

que se mudassemos determinada coisa

podia ser diferente ou melhor.

Eu acho que cada momento que nós temos que fazer

decisões cruciais nós vamos sempre perder alguma coisa

e então perder tempo com aquilo

porque se você realmente ter perdido

acho que não te faz bem

então acho que não há mesmo nada

O que é que queres fazer que ainda não tenhas feito?

A minha vida peca por

eu querer fazer muitas coisas

e também desistir de muitas delas

tocar um instrumento musical

o próprio curso de Filosofia

também que não falamos muito sobre isso

alguns desportes

ou seja, as vezes deixe-me levar para um lente de arme inicial

e depois desiste com muita facilidade

mas sendo ouvido alguma

o que eu tenho que fazer é ser pai

ainda não fiz

não tratei disso

ia dizer tocar piano

mas depois pensei que se o seu pai se calhar

mas o piano depois não chora

é pá, não sei se não chora

até agora só tenho chorado

sempre sento a piano e aquilo é só lágrimo

O que é que tens mais medo de perder?

talvez tenham medo de me perder

de perder algum rumo

que efetivamente algumas fases de vida

possam levar alguma estabilidade

me possam afastar

de fases não tão felizes

mas a verdade é que

se calhar eu também me imaginaria

perto dos 40

se calhar não seria uma projeção muito feliz

e a verdade é que hoje em dia sou mais feliz do que nunca

o que é que as pessoas não vêem quando olhem para ti?

não vêem o meu prazer pelo silêncio

eu gosto muito de estar sozinho

gosto muito do silêncio

e às vezes é difícil algumas pessoas

entender isso ou aceitarem isso

não vêem muita procrastinação

às vezes para fazer algumas coisas

às vezes demoro muito a fazer determinadas coisas

não vêem um grande déficit

da atenção que às vezes os cara bem

às vezes sou muito extraído

tenho que fazer muitos exercícios para a minha mente

estar focado ao preciso de estímulos muito fortes

então eu tenho também um bocadinho essa luta constante

se tu fosse garantido uma resposta

a qualquer pergunta tua

o que é que tu querias mesmo saber?

se temos alma

acho que muito bem com isso

não ter bem a certeza

eu tenho para mim que a vida ia me dar muitos

e que até calcule para melhor

gostava de acreditar ter essa certeza

aquela folha

que deixaste no caixa de teu pai

onde você escrevesse muito este fantástico

e com alguma coisa por dizer?

não

não

isso é uma das coisas que mais me acalma

e reconforta

é que não deixei mesmo nada por dizer

antes pelo contrário

dissemos tudo

e partilhamos tudo

e essas palavras

foram de uma importância

absoluta

o que é que dizem?

que a alegria deles é muito dependente

da alegria causada nos olhos dos outros

ou seja

e é neste

trocar de olhares alegres

de visitar a alegria

nos outros

em que muitas vezes é importante

olhar

que está a parte da receita da vida

é isso

é ser causa da alegria de um outro

obrigado

se lhe amanzar

obrigado eu

diga sempre se eu tiver tempo

eu posso vir

obrigado, boa boa, gostei muito

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O apresentador do programa da SIC 'Vale Tudo' recorda a infância e a adolescência, lembrando os episódios mais difíceis, nomeadamente o bullying de que foi alvo, nos escueiros, quando levou 'uma chapada' por não saber dar o nó dos atacadores; ou os sucessivos assaltos de que foi vítima na adolescência, assim como o facto de não ter sucesso entre as raparigas por ter excesso de peso. "São episódios que ficaram muito marcados", assume João Manzarra, que, ao olhar para trás, vê nos pais e no irmão um núcleo familiar que lhe deu força e proporcionou os momentos mais felizes que viveu. O apresentador fala ainda do ano em que viveu quase em exclusivo para acompanhar o pai nos tratamentos oncológicos. "Foi muito difícil, mas tivemos momentos de pura alegria, de pura contemplação, de pura fragilidade dele e força que eu ia buscar não sei onde".

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