Alta Definição: Cristovão Campos: “Viver é estar disponível para levar porrada, para sofrer”

Joana Beleza Joana Beleza 3/4/23 - Episode Page - 45m - PDF Transcript

Bem-vindo. Você está bom? Obrigado.

Preparar a tua entrevista não era as tarefas mais faças.

Tu és um tico naturalmente resgordado.

Não estou no meu hábito natural, mas acabei de me confessar, né?

Sempre a sobar.

Cristóvão Campos, 38 anos.

E isto começou aqui no Alta Definição.

Gosto de querido à Portuguesa, pois credo de fazer os sorrascos.

Gosto de agricultura, apelado não sei bom.

Agricultor, mas estou a aprender.

Eu acho que é que te divertes.

A tua vida é assim que uma montanha consegue.

Tu és resultado de aqui em infância.

Eu acho que sou resultado de uma infância feliz,

no subúrbio do Lisboa, em que é luz.

Os meus pais me deram muita liberdade.

Fase, experimente, vai por ti.

Nós estamos aqui a ver, vai lá?

Sempre ali com os avós presentes.

Muita liberdade em casa dos avós.

Eu lembro da minha avó abrir a porta e dizer adeus à minha mãe,

dizer para agora, pode fazer tudo o que quiseres.

Alguma nostalgia desse tempo?

Eu não tenho muita saudade.

Hoje sou mais feliz do que alguma vez fui.

Mas de vez em quando tens uma nostalgia da liberdade.

Não de vez nada a ninguém.

Não tens preocupações.

Não tens faturas para pagar.

Não tens nada.

É só uma busca permanente pela diversão

e pelo conhecimento.

Descobrir-vos o que está atrás daquela esquina.

Eu acho que isso é muito fixe.

Eu ainda tento muitas vezes empurrar

as responsabilidades para longe

e continuar à procura de uma esquina

para adorar e para saber o que é que lá está.

Nem sempre tenho tempo a ver isso.

Qual é a tua primeira embora?

Lembro-me frequentemente das férias.

O meu rapaz alagava uma casa em Cacela Velha.

A casa tinha um logrador e, nesse logrador muito pequeno,

juntavam-se muitos gafanhotos.

E eu lembro daquilo ser incrível, de mandar uma bola

e de ver os gafanhotos assaltar.

E também me recordo da primeira casa,

que era uma casa muito pequeninha com um quichinete,

e de ser muito feliz lá e de ouvir música com fones.

E eu chegava à casa e pedia aos meus pais

para ouvir música.

Mais do que ver televisão, era aquela coisa do meio.

A ouvir o quê?

Tracy Chapman.

Era Clapton.

Bar Straits.

A ouvir o que eles haviam.

Quase que menterei isso.

Não havia música para puto.

Qual é o momento mais marcante dessa infância?

Tenho uma memória de 6, 7 anos, numa praia de Cascais,

e de estar a ver os miúdos todos mais velhos assaltarem

e pediram ao meu pai para ir lá vê-los.

E chegar lá e olhar para aquilo de meu pai e dizer

que também quer assaltar.

E eu quero.

Então assalta.

Ver como é que eles fazem e assalta.

E esse tipo de memórias de...

tem confiança do tipo da polícia?

Vai correr tudo bem.

São momentos que o menor teiam.

Você ainda hoje.

Essa ideia do...

Tu és capaz, meu.

Vai lá.

Vença o teu medo.

E tu ainda hoje precisas desse semporão?

Sempre.

Agora muitas vezes é uma conversa interior

ou ir buscar essa memória.

Esse segredo que alguém te plantou na cabeça.

Que trava o medo de falhar?

Sempre.

Eu acho que o que trava é o que te faz avassar.

Eu continuo a ter medo.

Continuo a ter medo de estranha,

do primeiro dia de gravação,

da entrevista.

Continuas a ter medo.

Medo de falhar, claro.

Medo de não ser gostado.

E esse medo é que o que te...

também faz sopar estas e próprios.

E eu continuo a tê-los e a calentá-los.

Esses momentos.

As que eu fiz.

Tenho muito medo de deixar de ter medo

de subir ao palco.

Sentir um estágio confortável?

Sim.

Normalmente é mau sinal.

É sinal de que eu já não estou

nos comandos da máquina,

como devia estar.

Provavelmente já estou a achar

que estou a fazer uma coisa bem

e já não estou a fazer bem.

Qual é a dose certa nesse equilíbrio

entre ter a confiança de saber fazer

e o medo de talvez não conseguir fazer?

Não sei.

Essa é aquela que eu estou sempre a procurar.

Eu não tenho uma receita.

Há sempre um momento em que não és capaz.

Há sempre um período em que te deitas na almofada

e claramente estás a fazer aquilo mal.

Nós já estamos a fazer esta novela há algum tempo.

E é o período em que voltas a fazer tudo mal.

É o período de descoberta,

pois parece que entras ali

numa zona de conforto

e depois deitas na cama.

E que é que eu estou a fazer?

E começas a...

Será porque estou muito confortável?

Será porque estou cansado?

E essa dose de confiança

em ti próprio

para te mandar para a frente

e para voltar a descobrir

e a ter um dia feliz

é a equação da felicidade,

pelo menos neste caso profissional.

Mas não é um dia como as outras.

Mas vou fazer diferente.

Gosto do mar.

Não gosto de centros comerciais.

Não gosto de muito compromissos sociais.

Até dos meus anos.

Nem sempre gosto de mim.

Que objetos te lembram de tu infância?

Os fortes?

Carinhos.

Eu tinha imensos carinhos.

E é muito engraçado que esta semana

fui deixar a minha filha à minha mãe.

E lá apareceu um carrinho.

Que é a minha filhadora.

Alvos.

Concertas a valer,

daquelas que picam.

Depois, mais tarde,

uma guitarra,

aos seis anos,

comecei a tocar guitarra.

Os meus pais tinham uns amigos músicos,

levaram-me para um teste.

Abriram um piano

e viram como é que o puto reage ao piano.

E depois fui ao quiz.

Queria ir para a guitarra.

Então eu tive para a guitarra.

Com seis anos.

Tu ia ser médico?

Eu tive uma pancada por ser médico.

E também biólogo.

Queria estudar tubarões.

Acho que foi porque uma vez

fiz uma semana, duas semanas,

num campo de férias,

nos jardins lógico,

foi assim uma coisa incrível.

E na altura,

havia uma expressão de tubarões.

Eu liguei-me logo.

A pessoa que dava aquilo,

eu fiquei igual.

Tubarões era incrível.

Mas dias também com 15 anos,

não se pode ser duas coisas bem,

ao mesmo tempo.

Aham.

Não se pode ser duas coisas bem.

Mas pode ser duas coisas bem.

Mas pode ser duas coisas bem.

Mas pode ser duas coisas bem.

Mas pode ser duas coisas bem.

Mas pode ser duas coisas bem.

Mas pode ser duas coisas bem.

Mas pode ser uma bem

e outra divertido.

Há qualquer coisa de verdade nisso.

Eu acho que pode ser duas coisas bem,

mas duas coisas muito bem

é mesmo muito difícil.

Eu continuo a tentar fazer isso.

Eu gostava de ser ator e rockstar,

e acho que não é possível.

Não é possível.

Rockstar já vou estar.

Só em parte-time.

Só em parte-time.

A guitarra clássica,

de cheaply note,

de alguma forma.

Cheaply note?

Sim.

Porque é um instrumento clássico,

tem um lastro enorme.

De milhares de pessoas

que estudaram aquele método.

E tu és mais um, né?

Que vais apanhar aquela onda.

E sofres esse peso da história, né?

Isto faz assim.

Aprender, daquela maneira,

tem um lado bom.

De cheaply note,

de primeira abordagem.

Uma mestria que tu não sabes

como é que se faz.

Gostava de tocar após teus pais?

Gostava.

Quando a coisa estava pronta?

Bem.

Eu estava sempre uma certa vontade

de agradar.

Não é uma coisa muito boa.

Não dar o flanco, né?

Não me ves fazer mal.

Preparar,

estar sozinho.

E depois, agora,

vejam lá este brilhareta

que eu faço.

E às milhas?

Nunca usei muita guitarra

para engatar.

Nunca fui uma cena.

Como tinha guitarra clássica

durante muito tempo,

só aprendi guitarra clássica.

É que não resulta muito bem para engatar.

Olha aqui esta peça de Giuliani

que eu toco tão bem.

E gostava muito de Heavy Metal?

Muito de Heavy Metal.

Ainda gosto.

Acho que o Heavy Metal

para mim tem muito a ver

como mesmo com a adolescência.

A adolescência,

regra geral,

é uma altura...

Brilhenta.

Brilhenta na nossa cabeça, não é?

E muito introspectiva,

muito melancólica.

Tinha esse lado de...

Por um lado, escapismo.

Por outro lado,

uma certa violência

em que tu pones na música

aquilo que tu estás a sentir.

As incertezas da vida?

Gostas de interiores,

medos do futuro,

o que é que tu vai ser?

Onde é que tu pode ser relevante?

Relevante não é ser o maior,

não era ser o mais popular,

as pessoas gostarem de ti,

procurarem-te,

porque tu és bom naquilo,

a dar um conselho,

a fazer aquele passo paulo,

uma coisa qualquer,

ter um papel na tua comunidade.

Acho que ainda hoje isso para mim é importante.

E o Heavy Metal era um escapo

e ainda hoje é.

Olha, vejo muitas vezes

o peço de estúdio

ouvir as coisas daquela altura.

Liberta alguma detenção?

Algumas dos questões?

Liberta alguma detenção?

Eu sei as músicas muito bem,

portanto posso vir a cantá-las

e fui aquilo, de repente,

vais para um sítio que te é confortável.

E ao mesmo tempo faltas a ser miúdo.

Eu acho que é fundamental.

Voltar a ser miúdo todos os dias

um bocadinho,

eu tento,

e sou muitas vezes também.

Olá, sou o Cristó,

tenho 15 anos,

gosto de carnetar,

fazer bodywork,

intervisão,

sempre com os amigos.

De todos os ensinamentos

que os tuos pais te passaram,

o que achas que se nota mais em ti?

A questionar a autoridade

e a pensar por mim próprio.

Não papo o que te diz,

nem à primeira.

Pensa.

E se tiveses dúvidas, pergunte.

E se eles sempre me ensinaram,

sobretudo na escola.

É pá, se alguém te fizer alguma coisa

que tu não estás confortável,

diz, se alguém te bater,

se a tua professora te puxar as oralhas,

diz.

Diz-lhe a ela e diz-me a mim.

Essa forma de não haver

dogmatismo,

uma autoridade inquestionável.

Definitiva.

Definitiva, eu acho que

é uma das coisas que uma forma até hoje,

prova e prova mal.

Que se às vezes pode ser um defeito,

porque tu ficas um bocado.

Às vezes aguerrido demais.

E se no trabalho não traz

nunca alguns atritos?

Ah, eu acho que traxei patritos.

Aliás, o nosso trabalho é um trabalho de atritos.

Não acredito muito em contar

as histórias em conjunto.

Tem que haver atritos.

Porque são muitas pessoas a pensar

na melhor forma de contar a mesma história.

Teas que discutir.

É como uma empresa.

Eu acho que é impossível abrir uma empresa

e gerir uma empresa em conjunto

sem haver murros na mesa de vez em quando.

Acho que isso é saudável.

Quando isso não acontece,

alguém está a levar esses murros para casa.

Mas eu quero acreditar

que são sempre no sentido positivo.

Ou pelo menos a minha intenção

é sempre essa.

Pode mais vezes fugir

e depois ser uma grande previsa.

Também perca a razão.

Algumas vezes.

Que gestes de amor guardas

dos teus pais para contigo?

Bom, em primeiro lugar,

ser ator foi um geste de amor.

Não era nada esperado.

E aconteceu uma primeira oportunidade.

E eles tiveram que tomar uma decisão

que eu não sei se era capaz de tomar.

É com um filho com 15 anos,

na escola, lançado,

com sonhos acadêmicos de medicina,

biologia, de repente...

Ah, posso fazer esta série de televisão?

Como assim?

Portanto, isso foi um geste de amor

e de confiança.

E depois há gestes de amor mais curtos

que eu me recordo,

que é com chegarem-me sempre.

Uma coisa que até hoje

gosto muito e faço a quem gosto.

Há minha mulher e a minha filha agora,

que é com chegar-lhes a roupa na cama

de uma determinada maneira

que os meus pais me faziam.

É uma coisa que me transmite

uma segurança quase alterina.

Acho que agora também estou a recordar

muitas coisas outra vez,

porque estou a ser pai.

E, entanto, tudo de repente,

vez a história repetir-se,

mudar fraldas,

é a primeira vez em que tu te apercebes

que alguém fez aquilo por ti.

E, apá,

aqueles dois seres,

os meus pais fizeram isto por mim

tantas vezes,

como eu estou a fazer agora.

E sempre cheio de amor, certamente.

Portanto, isso é incrível.

Enquanto pai, o que é que

é fundamental de garantido na educação?

Os elicers, a história dos transporquinhos,

tentar construir a melhor base

para o que é que este mundo lhe apresente,

ela possa responder bem

e ser feliz com isso.

Que valores é que eu te vou transmitir,

que tive a sorte que me transmitisse,

podendo te comaltar erros,

que faça aquilo que o mundo te apresenta,

tu vais com maior ou menor dificuldade

responder e sair aerosamente do outro lado,

esperar pelo próximo...

ou anda pelo próximo túnel.

Isso é o que eu gostava que ela tivesse.

O que é que é mais fascinante, ser pai?

Ser pai é um presente

de todos os embrulhos todos os dias.

Acho que é o fascínio de moldar o bar,

estar em bruto é olhar para aquela fragilidade

daquele ser e fazer esta conversa

e existencialista com ela, crescer junto.

Crescer com a minha filha, acho que é o mais fascinante.

Crescer com ela, mais do que ver ela crescer,

crescer com ela é muito fixe.

Que também dizia coisas?

Muitas, soblinhas.

Ah, tu de repente topas por ter atitudes

que os teus pais tinham,

tu és os teus pais, tu és os teus avós.

Quando tu começas a educar a tua filha,

tu ves a tua genealogia,

tu sientes pela primeira vez

que fazes parte de uma história.

Acho que ser pai é isso,

é tipo 100% o peso da ancestralidade.

Coisas que tu, se calhar, criticavas neles

e agora é, é igual.

E lovas, que é giro.

E o que é que é mais difícil?

É felicidade, só o que é que ela seja feliz,

isso é terrível, né?

Já tinha isso comigo, antes de ser pai,

sempre trinquei as velas,

e o desejo foi sempre o mesmo.

Só que é ser feliz.

E com ela é a mesma coisa, né?

E isso é difícil apasiguar

essa ideia de que

viver é

estar disponível

para levar porrada.

E para ser feliz.

No final, essa é a parte mais difícil,

é educar alguém para ser feliz.

É fácil decorar textos,

preparar personagens com choro a acontecer e...

Muito mais fácil do que imaginar.

Muito mais.

Eu achava que essa era uma parte

que ia ser muito difícil

e que, se calhar, ia ter que dar

um bocadinho de mim essa parte.

Eu acho que até

me tornou melhor, porque

a gestão do tempo é mais eficaz.

Em Grandeste, ficas

empoderado para fazer mais.

Vou fazer mais com ela ao colo.

Eu, por exemplo, na última peça que fiz

eu decorei os textos todos

para dizê-los para ela.

E é empurrar-lhe o carrinho, de forma a convencê-la

que não estava a desenhar uma mentira.

Aí era fixe.

Eu acho que vou continuar fazendo alguma coisa.

E a paternidade é também uma forma de empurrão

para a vida adulta, já não sou puto, é isso?

É isso e o seu contrário.

E ao mesmo tempo, puxar o travão de mão e dizer

não, não, que eu ainda sou puto.

Não, não, eu sou pai, mas ainda quero ser puto.

Isso eu acho que também é importante.

A não nos esquecemos de nós,

dentro dessa equação,

desse sistema familiar.

Nós sozinhos, nós com o nosso par,

e depois, enquanto pais.

É Vimetal em casa agora?

Está mais contido?

É Vimetal em casa, sempre teve contido.

Lá em casa só eu gosto de Vimetal portanto.

Eu ouço de fones.

Gosto de música, de concertos ao vivo.

Gosto de mobil conversa,

de um bom copo de vinho,

de um bom copo de cerveja.

Não gosto de conversas demasiado

afuniladas em experiências pessoais,

porque não permitem conversar.

Agora ficamos sem gente.

Quando é que a representação

começa a fazer sentido na tua cabeça?

Eu comecei a ser ator depois de ser.

Já trabalhava regularmente,

até na minha cabeça eu poder assumir

e dizer orgulhosamente

eu quero ser ator,

ou eu sou ator.

Foi muito uma coisa dos pares,

em uma altura em que as pessoas começam a olhar para ti.

E reconhecer?

Sim.

É uma tentativa de que o teu trabalho

já vai ser qualquer coisa.

E isso, manda-te para a frente.

Tipo, wow.

Pessoas acham que eu sou capaz de fazer isto

melhor do que eu acho que sou capaz.

Isso quer dizer qualquer coisa.

Boa.

Bora lá.

Então tem que ler mais,

tem que saber o texto melhor,

tem que levar mais leções,

tem que me exceder a dar uma maneira.

O chico de uma aventura marcou mais do que aquilo que crias?

Agora é muita gira.

Agora é gira.

Já deu a volta.

Já deu a volta.

Houve uma fase que já não podia.

Mas que isso?

As pessoas já o conhecem por isto.

Então vai.

Quando tem lá essa cena,

mas está a ficar de pessoa cheia de fama.

Agora é ótimo,

mas já é uma coisa de longevidade.

Tipo, de repente,

olhas para trás e já ando a fazer isto há muito tempo.

Pois é a dimensão do super-herói.

Espera aí.

Ah, isto é um super-herói português.

Não tem capa,

não é da Marvel,

ou não sei o quê.

Normal, um super-herói normal.

Mas é o nosso super-herói.

Ou seja, os miúdos de minha geração,

que hoje em dia me dizem isso,

olham para aquele momento

que ele era um super-herói para eu.

Eu queria ser como aquele.

Eu queria ser como aquele.

Portanto, eu já fiz um super-herói,

que é uma gravação.

É fixe.

Mas já sabem,

quando eles chegaram,

eles liguem-se na antena

e, segundo em vez que eles vejam,

eles não regirem.

Estou decidido de Eurocasting?

Sim, sou decidido de Eurocasting.

Não é isso,

porque esse não foi o meu primeiro trabalho.

A história começa antes, na CIC,

aparece um anúncio na CIC,

a pedir miúdos para um filme.

Eu estava com minha mãe a ver aquilo e disse,

podemos ligar?

Sim, é porque...

Não sei o que estava a experimentar.

Então, assim foi.

Sob o que depois o filme era o Jaino.

E eu não podia esse casting,

porque havia uma greve,

então eu não podia esse casting.

Não havia carro lá em casa

e então eu não podia.

Mas telefonei.

Papá Patrícia Vaz Conselhos

que era quem estava a fazer esse casting

e disse,

só ver a outra oportunidade,

ligue-me.

E assim foi.

Um ano depois,

fiz uma curta-metragem,

através dela.

E um ano depois,

chamaram-me para esse casting

de uma aventura.

Vai lá.

Conta lá essa cina,

a estressa,

para tudo me esconder.

Leste dos livros?

Não.

Não.

Não até consegui pirar,

só que nos achava,

e fizemos achar.

Boa!

Perdi-se uma brincadeira,

ou era levada a sério?

Nessa altura,

era mesmo uma experiência.

Uma ideia de câmbio de férias.

Porque o que passava-se mesmo nas férias,

vinha de um lado,

de qualquer lado de mim,

de querer-me aparecer.

Que uns mutes têm,

outros não têm.

Porque acho que agora,

os mutes têm uma forma ventilar isso,

através das redes sociais,

porque têm um canal próprio.

E nós não tínhamos.

Portanto, o canal,

era um desses canais da televisão,

foi meio de uma oportunidade que surgiu,

e acho que a minha vai-dade

acendeu e disse,

olha, bora aí.

Vai-dade no bom sentido.

O que é que era mais difícil?

Acreditar naquilo que estava a dizer.

Acreditar que estava a fazer aquilo bem?

Desenvolver-se um lado empático.

E tu ainda nem sabes quem tu és,

nessa altura,

quanto mais saber quem é,

que é outra pessoa diferente de ti,

que diz uma coisa que ainda por cima

tu descordas.

É isto, é errado.

Então, vocês já sabem do tipo

que se roubaram o carro de sua praia.

Era difícil representar coisas

em que tu não saísse por cima,

em que tu fodes ridículo,

não querias ser ridículo na tua escola,

e depois tavas de representar uma coisa

em que podias ser ridículo.

Isso era difícil,

mas ao mesmo tempo é bom.

Desenvolver-se a capacidade empática

depois nos pés dos outros,

e até sentir-se o que eles sentem.

Tença melhor,

que eu acho que vou te alertar mais frente a ela.

Vou alertá-la que fazes com a juventude de agora

com a juventude do nosso tempo.

Acho que é um bocado engraçado fazer isso,

porque nós temos sempre a tendência de olhar

para a geração anterior pior na alguma coisa,

ou muito melhor na alguma coisa.

E acho que fundamentalmente estamos iguais.

As ferramentas ao dispor

e a forma como expressamos

as nossas ansiedades,

os nossos sonhos,

e o nosso mundo é que muda.

Mas aquilo que nós sentimos,

eu acho que é a mesma coisa.

E acho que já é de trás.

Porque ser humano não mudou.

Então acho que somos todos iguais.

Queremos todos ter uma comunidade,

ser gostados por as primeiras pedras

sólidas do nosso futuro,

concretizar os nossos sonhos.

Se quiser fazer alguma crítica

aos tempos de hoje,

hoje acho que pode ser mais fácil

de tu despreçar-te,

porque tens mais coisas para experimentar,

para o bem,

mas também tens muito mais futilidade do bolso.

E isso é tramado, né?

Se tu gostares muito de ver desenhos animados,

de interver desenhos animados.

E eu e tu não podíamos fazer isso.

Os desenhos animados estavam antes do telejornal

e ao sábado e ao domingo manhã.

Uma ideia de facilidade hoje?

Sim, uma ideia de imediatismo.

Mas que tenham-se lá bom?

Lá está.

Porque te permite experimentar muito mais coisas.

Isso é transposto também para a profissão?

Sim, acho que pode ser.

Não sei como é que é ser jovem.

O meu percurso foi mesmo muito particular.

E acho que só podia acontecer naquele momento da história,

porque três anos depois,

é que ele já não estava a acontecer.

Já tinha havido o boom das novelas jovens.

Na altura não havia agências.

Datoros, por exemplo, não havia.

Havia quem tivesse agentes, mas eram poucos.

Não havia tanto trabalho.

Há-mos poucos jovens-actores.

O Neco, a minha família de animação.

Eu fiz dois personagens diferentes nessa série.

Havia tão poucos atores jovens,

que eles chamaram,

ao fim de não sei quantos meses,

chamaram outra vez,

para fazer namorada da mesma personagem.

Ah, mas tu mesmo,

as minhas óculos não tinham assim.

Não até bom, não tens.

É o que estava a ver essas imagens.

Desapocura-me, desapocura-me.

Eu pensava de ver isso.

Eu sou de óculos.

Senhor, e ele?

Seres um puto giro,

dava que tipo de confiança?

Acho que durante algum tempo,

deu-me amasiada a confiança.

Ficas um bocado de soberbo.

Tenha feito uma soberba da altura.

Se fores popular na tua escola,

tornas-te um bocadinho de soberbo.

Eu tive essa coisa,

e depois ajudou.

Fazeres provisão,

acho que ajudou um bocadinho essa soberba,

mas rapidamente acho que

deixei de ater.

Não era muito fixe.

Por que que não era muito fixe?

Porque acho que não era muito boa pessoa.

Não te coloca de igual para igual com o outro.

Eu acho que rapidamente aprendi isso

por ter a felicidade de ter amigos porrairos,

ter um grupo de amigos porrairos.

Sem me dizerem diretamente,

acho que havia sempre aquela desilusão.

Aí, agora foi estúpido.

Porque acaba por ser fácil que,

nesse contexto,

alguém nos possa enredar nesse circuito?

Sim, de lembrar-se.

Comigo nunca chegou a acontecer,

mas acho que houve alturas em que eu senti.

Tava um bocadinho cheio de mim.

Conseguei hoje perceber que é natural.

E acho que até antes de ser ator,

na escola, por ser um bocadinho popular,

os professores gostavam de mim,

porque as miudas gostavam de mim.

Coloca-te num certo sítio,

que numa certa hierarquia da escola,

que hoje é igual, certamente.

Mas depois, eu também não estava super confortável,

porque não correspondia inteiramente a esse papel.

Não era o Rufia e o gás que vai à frente do grupo.

Tinha essa camisola, mas depois vai,

vai-te-o à frente.

Não quero ir à frente.

E, portanto, mediar entre a expectativa social

e a tua própria,

leva-te em contraste no meio caminho.

O que é que os professores gostavam de mim?

Porque era bom aluno.

Era interessado.

Não sentava atrás, sentava na frente.

Gostava de aprender.

Gostava de ter duas notas.

Sempre gostei de estudar.

Gostava de brincar,

mas já que tinha que estar uma hora numa sala,

então deixei lá aprender.

Acho que é mais fisto que estar a fazer outra coisa qualquer.

E ao mesmo tempo, também não era um protótipo de marrão.

Gostava de falar.

Então acho que isso dava aulas que estavam de cima.

Pai, que interessante.

Gosto de cozinhar.

Gosto de que gostem daquilo que eu cozido.

Sou bom a fazer uma coisa que aprendi com as devias,

que é, trouxe este cozido.

São ótimas.

Não gosto de mandar ver comida para cada.

Gosto de comer fora.

Para quem é ator a vida toda,

que se passa aqui há para a profissão surpreender ainda.

Pai, eu tenho muita sorte.

Continua a ser desafiado para fazer coisas que nunca fiz

e que continuo a achar que não consigo fazer.

E nada mais me traz isso do que a minha profissão.

Ou agora ser pai.

Essa é a tarefa mais Herculia.

Mas até nisso, como vês treinando a tentativa de superação,

ser pai é mais uma vez tentais de superar agora numa dimensão pessoal e não profissional.

Quando olhas para trás, o que é mais incrível que tenha acontecido?

Eu nunca pensei fazer teatro.

Tenho feito imenso teatro, que é uma grande sorte.

E com pessoas que eu cresci a ver no teatro e na televisão e no cinema.

Eu tenho uma enorme gratidão para a minha profissão.

Acho que isso também me faz respeitá-la e apresentar-me ao serviço

quando toda a nobreza possível.

Será que todo mundo tem quanto pessoa?

Claro. Eu cresci a ser.

Minha vida pessoal foi moldada por isso,

para essa busca de liberdade.

Que agulçam uma sensibilidade?

Sim, agulçam uma sensibilidade,

pedem um tempo de introspeção que outras profissões não exigem,

porque tu estás a diminuir de uma máquina que é muito subjetiva,

que é o teu corpo, que está em permanente mudança.

Tu estás sempre a mudar como ator.

Eu comecei a ser ator com 15 anos.

Com 15 anos era uma pessoa e ser ator.

Nessa altura não é a mesma coisa que quase com 40.

Eu tenho que ser outro ator.

Porque se eu continuasse a ser como 15 anos,

então não vou fazer bem o meu papel.

Portanto, tu estás sempre a mudar.

Há a ser estar quem tu és agora,

há a ser estar que tens cabelos brancos

e que já não podes representar da mesma maneira.

Voltam das estrelas rocas.

Há algumas estrelas rocas que ficam um bocadinho ridículas.

E mento, já não és o new.

Já não consegue.

Agora fica ridícula ser assim.

E há outras que crescem.

O conselho é que foi fundamental?

Acho que o fundamental foi em casa, por exemplo.

Não foi um conselho que foi dado,

foi um conselho que foi sendo mostrado.

Nunca levaram muito a sério o facto de eu ser ator,

até começar a fazer coisas mais a sério.

Ao início não alimentavam muito isso.

Isso deu uma normalidade e fez com que,

se esquece de ser ator, há coisas incríveis que podes fazer.

Portanto, trabalha para elas.

E é isso que eu continuo a tentar fazer.

Que erros como testes que hoje não cometerias?

Como jovem, tu também tens muitas certezas.

É a idade dele.

Teas muitas certezas e fazes as coisas a tua maneira.

E, se calhar, teria ouvido mais vezes outras pessoas.

Não acho forçosamente que isso tenha sido mal,

mas podia ter sido uma experiência mais rica,

a subida ter sido mais feliz, mais rápida.

Qual é a tua forma de lidar com os erros?

É aceitá-los ou contorná-los?

Acho que a primeira de todas é evitá-los.

Mas acho que aceitá-los, sim.

E é por isso que eu acho que tenho de tanta dificuldade

em dizer que eles são erros.

Porque eles entram para uma zona de aprendizagem.

Se calhar, faria, outra vez, da mesma maneira,

porque cumpriendo a situação em que estava aposta efeito.

São erros à luz da história.

Mas, naquele momento, não foi um erro.

Foi uma forma que as íplas queriam ir pela direita.

Nenhum dos sítios é errado. Direita.

Eu sei o tisto.

Tu, de repente, tens quase 40 anos?

De repente, tenho quase 40 anos.

Bate alguma coisa, não?

Paz.

Paz, de novo, de momento.

E pela primeira vez, a desincronização com a cronologia.

Porque nada mudou na tua cabeça, na tua jovialidade.

E, de repente, começam a nascer pelos menores.

Não é tipo, o que é isto?

Começas a ter sobrancelhas.

Preciso dizer ao cabelareiro.

Descobrancelhas, que é uma coisa que...

Nunca tive.

Se calhar, há pessoas que isso acontece mais cedo. Eu nunca tive.

Quando começam a crescer peles ou não é suposto,

é porque o corpo já está a ficar maluco.

Ela já não está a dar conta de tudo.

Ainda continua a reagir bem às tuas inflamações.

Continua a trabalhar bem.

Continuas a correr e a ter setamina.

Mas, é pá, já não sei bem, revelar os pelos.

Sai em muitos sítios.

Gosto de rock'n'roll. Gosto de moches.

Não é este moche, é o moche do punk e do heavy metal.

Não gosto de esperar, de burocracia.

Não gosto de mentiras.

É hoje a pessoa que queres ser.

Tens o que queres ter.

Eu tenho mais do que queria ter.

Nunca achei que fosse possível ser amado como sou.

Nunca achei que fosse possível amar como amo.

E isso é altamente poderoso.

É incrível.

Dá-te uma capa de super-herói.

Sentires que é especial para alguém.

Sentires que é especial para alguém.

Sentires que consegues fazer alguém especial.

Sentires que hoje não fizesse porque foste um parve,

mas que amanhã podes fazê-lo.

Querer lá em casa, querer com os teus pais, com o teu família, e com os teus amigos.

É, pai, isso é muito fixe, é uma grande sorte.

Ter as pessoas que te amam e a quem amar.

Ao longo da vida, foste mais de certezas ou mais dúvidas?

Certezas.

Acho que sim.

Sempre parei para pensar, foi a minha opinião.

Tenho a certeza disto.

Até não tens razão.

Agora tenho a certeza que é competitivo.

A segurança acho que é uma coisa fixe.

E por isso não é um erro.

Foi uma certeza porque eu pensei muito naquilo.

Mas estava errado.

Tinha a certeza daquilo que estava a dizer.

É-te mais fácil dizer que não, Oxin?

Deste comedivo comigo próprio, com o tempo que eu acho preciso para medir,

a resposta, a partir daí dizer que não, Oxin, é tranquilo.

Patrícia faz conselhos.

Diz que tens uma qualidade rara,

que é a capacidade de saber de dizer que não,

quando muitos dizem que sim,

essa capacidade de dizer que não implica uma autoconfiança.

O meu avô foi um ensinamento que ele me deu a jogar às damas.

Nós jogávamos muitas damas.

E eu era miúdo e, pronto, queria sempre comer.

Havia uma para comer e comer.

E ele dava um umas para comer.

E depois comia-me 3 ao 4.

E ele dizia-me sempre,

eu preciso de uma para comer 3 ao 4.

E acho que dizer que não é isso.

Dizer que não é dar uma peça a comer,

porque estás a ver o jogo mais à frente.

Ainda que possas estar a ver o jogo de forma errada.

E acho que sempre que disse que não,

foi sempre com um intuito qualquer.

Mas, à frente, acho que isso não é certo fazer agora.

Muitas vezes digo que não, porque eu acho que não sei fazer.

Não sou a pessoa certa.

Acho que então eu ponho um sítio que eu não sei fazer isto.

Isso é muito parecido quando dizia que sim.

É como alguém te manda um guião.

O que é que te leva a dizer que sim?

Tu deslúmbraste pelo que é o personagem,

pela história.

E há qualquer coisa que é muito subjetiva que te dizia,

aí eu sei fazer isto.

Por que?

Não faz ideia.

Mas eu acho que sei fazer isto.

Eu acho que vou ser muito feliz na procura disto.

E quando não sinto isso, então mais vou dizer que não.

Quem está mal muda-se.

O que é que você quer dizer agora?

O que é que te fim num bom ator?

Cada vez acredito menos num bom ator.

Há atores que são unânimos,

mas depois há pessoas que não são o paradigma do grande ator,

mas que são os excelentes atores.

Todos eles o que têm é uma grande capacidade empática.

Eu acho que a capacidade empática de tirar-se de ti próprio

e conseguir perceber o mundo e as pessoas que o pululam

de uma certa maneira que elas querem ser entendidas,

acho que isso é uma coisa difícil.

E acho que todos os bons atores têm,

quer sejam mais que a Malionics ou não.

Nós admiramos aquele ator,

faz sempre coisas diferentes.

Mas depois há atores que fazem coisas muito semelhantes,

mas são sempre inacreditáveis.

E isso não faz deles piores atores.

Acho que é um bom ator nuncamente,

ao contrário do que se possa pensar.

Reconhece-se também e empatiza tanto com a história

e com a pessoa que está a representar,

que o é e então não é.

Cada nova personagem vai se tomando camadas

e isso traz televisões diferentes sobre a vida.

Sim, cada personagem abre portas novas da vida.

O personagem autista que fizeste no Coração Douro marcou-te de que forma?

Estou bastante, porque foi talvez a primeira vez que tive de fazer

uma transformação física e perceber uma forma de ser e de pensar

que é completamente distinta de tudo aquilo que eu conheço.

Os perfumes têm notas.

Não são como as notas de música,

que são uma sequência ordenada de tons pela frequência vibratória.

Foi muito importante falar com muitas pessoas, ler livros,

levares a tua empatia a uma fronteira

que achavas que não era possível.

Estou a ler as respostas da Melita.

Fiz perguntas e ela respondeu.

Que tipo de routine é que tens quando estás, por exemplo, a fazer uma vela como esta?

Para mim é sempre fundamental trazer soluções para as cenas.

Isso é uma retina que eu continuo a acalentar muito.

Quer dizer, identificar um problema,

acho que esta cena está um bocadinho frágil.

Mas eu trouxe uma solução.

Esperar que seja aceite ou que alguém me ponha uma melhor.

Nem se fizéssemos antes assim.

Melhor, ótimo.

Mas chegar sempre com uma solução, acho que isso é uma coisa routineira em mim.

E que muitas vezes ao pequeno almoço,

ou quando me deito, é quando eu resolvo essas coisas.

Eu tenho problemas e deito-me a pensar em eles.

Ah, deixa eu ir.

Já lhe passa.

No álbum e coração que tu fizeste,

muitas pessoas me falaram da tua imensa generosidade

em cena sempre que era necessário

de me parar com outro colega.

Isso é uma preocupação que tu tens

em cena e na vida.

Sim, antes de mais agradecer a essas pessoas que disseram.

É ficha ouvir.

É bom esse reconhecimento.

Podemos recorrer para que seja alterada à medida,

mas para isso temos de provar o que há perigo de fuga

e de continuação da atividade criminal.

Às vezes fazemos muitas cenas que são frutas.

Bom dia, boa tarde, é um almoço.

Serve um propósito maior, portanto, é uma cena de passagem.

Mas mesmo nessas cenas,

eu acho que é a proximidade com o outro atrator

que faz com que as coisas sejam fiches

e sobretudo na alma e coração

nós tenhamos cenas muito difíceis

de perda, drama

e só se nos ancorassemos uns nos outros.

É aquilo que era verdade.

E acho que muitas vezes,

em novela mais,

para ela dizer ao espectador,

ou ele dizer ao espectador,

é aquilo que lhe vai na cabeça.

E tu estás só aqui a dar uma réplica.

Reconhecer isso, não achar sempre que a cena...

Ah, porque o meu personagem...

Calma, vais ter outras cenas

em que o teu personagem vai ser o mais importante.

Doutora, a minha mãe não gosta de hospitais.

Mas como não controla a aglice,

eu me peço, eu te acrolinho para ver.

Essa generosidade que tu colocas

e que todos reconhecem,

é replicada de algum modelo ou é tinata?

Acho que é sempre replicada.

Acho que aprendi com os outros.

Acho que aprendi a ver.

Quando comecei a fazer televisão,

passava muitas horas na reagi, a ver.

E então, via muitas vezes isso, via-te.

Por que é que tu gostas daquela ator?

É porque ela é sempre honesto.

Ela está sempre a desiguar.

Ela está a ouvir o outro.

Ela está lá.

E esses tendiam a ser as pessoas que eu mais admirava.

E depois tens a sorte de falar com eles

e eles, de vez em quando, nas entrelinhas

eu tive, com certeza, vários.

E também realizadores e ensinadores.

Pessoas que te chamam a atenção para qualquer coisa.

Saber ouvir é essencial?

É essencial, é.

E ainda há pouco, olha, acabei de fazer uma cena

que estava a empancar numa frase, porque não estava a ouvir.

E a maior parte da vida,

que era nossa, que era da ficção,

está nisso, está a ouvir.

A resposta está sempre contida naquilo que alguém te diz.

E, portanto, como ator é isso,

encontrar essa reciprocidade.

Claro que é sempre mais difícil quando o teu colega

também acontece, não são sempre encontros felizes.

Mas, felizmente, nunca tive muito sem felizes.

Para que é que te falta tempo?

Para fazer música.

Eu gostava de fazer mais música.

Eu sempre fiz música para mim.

Como escrever um diário.

Um diário não é para publicar.

É uma forma de tu colocar uma fase

da tua vida, ou uma semana,

ou um dia, numa cenuridade.

E eu às vezes sempre falta disso.

O tipo de assuntos é que te preocupa na sociedade hoje em dia.

A questão das redes sociais

e o facto como

a nossa opinião passou a valer

tanto, preocupa-me.

Porque nos retira espaço para formar a opinião.

A opinião

demora tempo a formar.

E hoje nós todos temos opiniões

na ponta dos dedos, ou na ponta da língua.

E isso não é bom. E são opiniões públicas.

Por exemplo, eu sempre tive muitas certeza.

Portanto, também sempre tive muitas opiniões.

Mas elas eram no limite do meu horizonte,

daquilo que eu via.

Portanto, eram mediadas pelas pessoas

que estavam a minha volta.

E tornavam-se importantes, ou opiniões sólidas,

nesse confronto.

E agora tu, não tens tempo para isso.

Tudo de repente já estás a dar uma opinião.

Já estás a expor

publicamente sobre isto, ou sobre aquilo.

E tu nem sequer pensaste.

Eu acho que isso pode ser uma doença

social, como se vê na política.

Os políticos têm menos tempo para fazer política.

Eles não têm tempo para pensar

sobre a questão que eles estão a fazer.

Já estão a responder.

Eles estão a servir lipendiados.

O problema é para a mala. Eu não estou a defender os políticos.

Mas ser política é uma coisa importante.

De repente...

Mas tu não tens tempo. Tens que ter tempo.

E as redes sociais tiram-nos isso.

E também nos dão a ideia

que a nossa opinião é sempre válida.

E não é. Às vezes a tua opinião

está só a ser mal educada.

Ah não, mas é a liberdade de expressão.

Não. É falta de educação.

Não vives no meu bolha. Não vives sozinho.

Tenha calmo.

Não vives no teu espelho.

Se amanhã acordares, olhares e continuas a achar

que está certo, então faz um pouco.

Gosto de ler de cinema.

Gosto dos meus amigos.

Gosto da minha família.

Não gosto de fazer coisas por obrigação.

E não gosto de pessoas mas eadas sérias.

Qual foi a decisão mais importante da tua vida?

Ser ator foi uma delas.

Eu ser feliz.

Esse é pai também, porque foi uma decisão.

Eu não queria ser pai.

Com uma certeza, vivimento de

não, não, não.

E depois apareceu a pandemia.

A pandemia também traz coisas felizes, né?

E o travão que nos obrigou a fazer na vida.

De repente ficar em casa

com a minha mulher e perceber

que, ah, isto como faz feliz.

Se calhar nós podíamos ser pais.

Ainda íamos levar isto para outro sítio.

E essa assumção

de uma vontade por oposição

é uma coisa que eu estava

tão certo que não queria ser

provavelmente por medo de crescer

e de cortar a liberdade.

Eu acho que isso foi uma decisão importante.

Qual foi a melhor coisa que disseram sobre ti?

Que sou boa pessoa.

Que sou bom ator.

Fico um bocadão, como dizem isso.

E tendo a acreditar que não pode ser muito feito.

Gosto de ser valorizado, né?

Como tudo se está apucado, né?

Que os teus colegas dizem que

esse reconhecimento é o que eu gosto mais

e é aquele que me diz

épa, estás no bom caminho.

Continua.

Isto é fixe.

Estar à altura das ocasiões é uma coisa

que para mim é importante.

Estar à altura daquilo que a vida te oferece

para o bem e para o mal.

Isto é bom também no mal, né?

Estar lá, não fugir disso.

Isso é o que eu acho que fazes uma boa pessoa

alguma coisa por dizer a alguém.

Não acho que até para aquilo que temos

estado a falar até agora

eventualmente disse

coisas a mais algumas pessoas do que propriamente

deixar alguma coisa por dizer a alguém.

Acho que tendo a dizer.

Quem te faz falta?

Os meus avós fazem-me falta.

Meus avós maternos fazem-me falta.

E agora fazem-me mais falta que a minha filha.

Era tão fixe que vocês

não conhecessem.

E foram duas pessoas assim

que tinham uma dimensão onírica

na minha vida.

Ainda hoje parece que fazem parte

assim de um sonho.

Era muito livre

na casa deles.

O meu avô brincava muito.

Me jogava o balão.

O meu avô sempre o meu avô já era velho, né?

E fazia coisas inacreditáveis.

Mandava-se para o chão e saltava.

E fazia tudo o que eu queria. Era incrível.

E a minha avó

era cartomante.

Portanto,

vai ter um lado um bocado onírico.

É esquisito.

Tem um lado da vida

que não te paras.

Isso tem um lado

incrível.

O que fica? Quem vai?

Os ensinamentos.

Os valores.

As memórias.

Para mim, eu vivo com eles diariamente.

Aquele que me faz sorrir.

Pois é.

E isso estava imensa forte.

É muito fixe.

É mentira.

Gosto de teatro.

Gosto muito de ser ator.

Gosto de desafios novos.

Não gosto de que me digam

que isto é só uma cena

ou é só uma novela.

Desvalorizem aquilo que estamos a fazer.

Não gosto mesmo nada.

Aqui é em Volteria, este pedaço.

Há muitos anos da minha entrada

na idade adulta.

Quando eu comecei a ter dinheiro

para fazer aquilo que queria.

Tinha dinheiro para fazer aquilo que queria.

Não tinha contas para pagar.

E isso é o melhor de todos os mundos

que eu posso imaginar.

Já trabalhava.

Vivei em casa dos meus pais

que não eram chatos.

E, portanto, era fixe.

Esses anos foram todos muito bons.

Eu ia viajar, podia beber copos.

E não tinha que pedir.

Isso foi muito bom.

Eu voltava a esses anos.

Mas voltava por um bocadinho.

Porque agora eu sou mais feliz.

Alguém te deve um pedido de desculpas?

Acho que não.

E tu pedi desculpas a todas as pessoas

que queres pedir?

Eu acho que sim.

Esse cara não desculpa.

Não sou muito bom a pedir desculpas.

Não no sentido clássico formal

dizer que gosto de ti.

E isso servir às vezes não sério.

Às vezes as pessoas precisam mesmo de ouvir.

Desculpa, errei.

Mas, dito isto,

acho que podia ser muito desculpa

às pessoas a quem devia.

Se não precisas de trabalhar para viver, o que é que farias?

Trabalhava para me entreter,

provavelmente.

Existe trabalho sem salário.

Não é o salário que distingue.

O que é que é trabalho, o que é que não é?

Portanto, acho que o trabalho é uma coisa mesmo importante.

Por exemplo, agora adorava poder trabalhar

na agricultura.

Fizer vinho, o que estava de fazer vinho.

Isso é trabalho.

Se eu fosse rico, provavelmente trabalhava numa vinha.

Na minha vinha.

Pois passava a ser trabalho porque ia ter tanto vinho, queria vender.

E lá estás tu a construir o teu trabalho.

Portanto, acho que era isso que fazia.

Trabalhava para me entreter.

O que é que tens medo?

Que a fechama da felicidade se apague.

Seja lá o que isso for.

Acho que posso ser feliz de muitas maneiras.

Não tem que ser assim.

Eu queria não encontrar a solução

para a felicidade naquele momento.

Isso é uma coisa que eu tenho mesmo medo.

Em medo de serem feliz.

É uma coisa que acho que vou reconhecendo nos outros

na tua sociedade.

Muitas vezes, de vez que tens sorte

de não estar naquela

posição.

E se calhar, estou a ser injusto porque aquela pessoa que está naquela decisão

é feliz.

Mas de ter de fazer alguma coisa que eu não gosto

e que vá contra a minha possibilidade de ser feliz.

Se tu fosse garantido uma resposta

a qualquer pergunta tua,

o que que tu querias mesmo saber?

Se Deus existe,

eu que sou o teu.

Mas já agora, já que tanta gente acredita,

tipo...

É pá.

Deus existe ou não existe?

Anda aqui a malta.

Há milhares de anos a lutar por uma coisa

que existe ou não existe?

Solucionei-me esta dúvida.

Bora lá, meu.

Agora está todos de mesmo lado.

Olha, ele existe.

Ou ele não existe, parem com isso.

Acho que isso era uma coisa...

Fiz, se pudesse mudar tudo na tua vida,

o que é que não mudarias?

Essa não é fácil.

De ponto de vista mais filosófico,

acho que não mudaria o tempo

despendido para tomar

as decisões que tens de tomar.

Acho que era uma coisa que eu gostava

de continuar a conservar em mim.

Era essa...

Calma, não tens de decidir agora.

Isso é uma coisa boa.

A música também é feita de pausas.

E é isso. Faz uma pausa.

Tem calma.

Quando tudo parece voraz,

tomar o teu tempo

para tomar uma decisão,

eu acho que isso responde de uma forma

um bocadinho lata àquilo que tu

não mudas na tua vida.

Ter tempo para fazer isso.

Porque a vida

pode despregar a rasteiras.

Quem gostaria que a tua filha dissesse

que foi o pai?

Um espírito livre, acho que eu gostava

que ela reconhecesse isso.

Eu gostava que ela ficasse com a ideia

que eu sorria muitas vezes.

Eu não sei se isso é verdade.

Não sei, é uma dúvida que eu tenho.

Sou muito cisuda ou não.

Às vezes fica pensando isso lá em casa.

Será que a minha mulher acha que eu sou muito cisuda ou não?

Às vezes é um bocado cisuda.

Eu tenho mais dia a sorrir.

Que a manassa já se leveza?

Sim. É uma coisa que eu busco,

que se vejo no trabalho, também.

Eu sei que sou uma pessoa

à as vezes séria, mas eu gosto

de que as pessoas digam...

É, para o gás rir-se.

Cada vez gosto mais de rir e de fazer rir.

O que é que dizem? Estos olhos?

Por mais que penses na resposta peste

de momento, é daquelas definitivas.

É tipo chegar ao céu.

É que te abriria a porta e tu não sabes ver o que faz.

Não sei, para mim agora é claro.

Para mim acho que ela sempre.

Eu acho que os meus olhos,

até por causa da minha profissão,

eu gostava que eles descessem-se sempre a verdade.

É isso que eu busco, que eles me digam.

Eu acho que quando não dizem

vezes que sou um bocado

mau ator nisso.

Quando estou...

As minhas olhos são muito verdadeiras.

Sempre disseram isso.

Espresivos.

Isso é bom bem bom mal.

Acho que é isso que dizem os meus olhos a verdade.

Espero que sim.

Obrigado.

Obrigado, eu.

Sou rápido.

Muito obrigado.

Ai, ai.

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O ator de 38 anos é o convidado deste episódio do Alta Definição. Cristovão Campos gosta de agricultura e de comida portuguesa; na adolescência teve o sonho de seguir uma carreira na Medicina ou na Biologia, mas um casting levou-o para a representação. 'Chico', de Uma Aventura, foi a sua entrada como ator na televisão. "O trabalho de ator é um trabalho de atritos", diz, explicando que se discute muito, porque são muitos, como numa empresa. Cristóvão tem uma filha bebé, com a qual diz que aprende muito todos os dias: "cresço com ela". Oiça aqui a conversa com Daniel Oliveira, episódio emitido dia 4 de março na SIC. 

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