Alta Definição: Ângelo Rodrigues: “A segunda vida começa a partir do momento em que percebemos que temos uma”

Joana Beleza Joana Beleza 9/16/23 - Episode Page - 44m - PDF Transcript

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Bem-vindo.

Amigo.

Obrigado.

Como é que estão esses ganchos?

Estão bem.

Não tenho utilizado muito essa técnica.

Tem sido mais diretos, mas os ganchos estou a trabalhar neles.

E as esquivas?

As esquivas estão bem.

Não tenho tido muitas oportunidades de estar em circunstâncias de combate.

O Fred é professor de boxe, então tenho mais dito aos outros para se esquivarem e para

fazer enganjos e diretos e cruzados.

É uma luta ou uma dourada?

Calma, calma.

Eu sou o Rodrigues e estou como sou no alta definição.

Eu sei como é que te vejo agora.

Eu não sei como é que tu te vejo.

Há sempre um depoito de cada KO?

Claro que sim.

De alguns lantares.

E teu regresso às novelas e a um grande papel é vivido neste momento de que forma?

Por ti.

Com calma e com paixão, por aquilo que faço, por um estado de presença que eu já não

sentia há algum tempo.

Porque minha vida apresentou assim umas curvas sinuosas nos últimos anos e por meditar muitas

vezes sobre a finitude da nossa vida faz-me ter consciência desse estado de presença como

estou aqui contigo, saber que nós os dois não estamos aqui para sempre, saber que provavelmente

daqui a 50 anos não estaremos cá e isso faz-me entender a validade deste momento.

Estar inteiro em cada momento?

Exatamente, exatamente.

Onde é que andaste?

Tenho andado aí pelo mundo, tenho andado a viajar bastante, a fazer algumas experiências

de voluntariado, fazer viagens não tão centradas em mim mas mais centradas nas necessidades

do outro e descobrir que isso tem tido umas repercussões fortes em mim, entre as quais

a velocidade que quero ter na vida, deixar de ser uma coisa tão esquizofrênica, tentar

colecionar o máximo de coisas e ter essa visão sofrega da vida, acho que já estou mais calmo

neste momento.

Isso ajuda-me a aproveitar melhor os momentos.

O que é que essas viagens te dão?

Eu volto muitas vezes mais confuso do que quando parti, porque sinto que alcanço patamares

de consciência, que de outra forma quando eu sou devolvido ao dia a dia aqui do nosso

país, no Ocidente, que tenho que fazer um exercício constante de tentar colocar todos os

ensinamentos que vou aprendendo lá fora e isso é o mais difícil para mim.

Parto sempre com uma vontade incrível de conhecer outras realidades e em vez de saber

exatamente o que quero, fico ainda com mais dúvidas.

Pensar que podias morrer.

Vara Jesus, claro.

Apareces ter pressa de conhecer tudo o que há para conhecer.

A vida teve um volto fácil, não é?

Então eu percebi a semelhança do que diria com o fússil e um professor chinês, que nós

temos duas vidas e a segunda vida começa a partir do momento em que percebemos que

temos uma.

Não tenho outra forma de te dizer que eu sinto isso mesmo na pele.

Essa urgência é ter muito que ver com a quantidade de coisas que eu quero fazer na vida e que

infelizmente é uma coisa que eu quero fazer na vida.

A urgência é ter muito que ver com a quantidade de coisas que eu quero fazer na vida e que

infelizmente não vou ter tempo para fazê-las todas.

Portanto, para todas as cá conclusão que estou um bocado de sofrer no final.

No Cambodjo o contacto com os elefantes foi especial para ti?

Bastante.

E eu procurei os elefantes por uma razão.

Encontrei os últimos anos uma fotografia bem antiga de quando eu tinha 4 anos em cima

de um elefante africano.

Eu tinha uma cara muito assustada, um mil de 4 anos.

A foto era de 91.

E para baixo o meu pai escreveu que fantasia, que sonho, reticências.

Eu fiquei intrigado com essa foto porque anos mais tarde devia sofrer um período

controbado na adolescência em que sofrei de bullying, gozavam com as minhas orelhas.

E eu pensei assim, já que eu vou fazer esta viagem.

E gostava de ter um contacto com outra espécie que não humana, porque não visitar os elefantes

e tentar colocar em confronto um trauma que eu tenho do meu passado.

Será que eu vou tirar alguma coisa daqui?

Procurei o santuário de elefantes, mas que me mantivesse boas práticas.

Eu queria uma reserva natural onde tratassem bem os elefantes através de uma ONG.

Então procurei um projeto chamado Elephant Valley Project no Cambodja.

E é como se fosse um centro de reformadas elefantes.

Então eram 12 elefantes, são mais.

Eu acordava todos os dias, às 7h da manhã, e o meu trabalho era ser assistente de marrute.

É como eles chamam um cuidador de elefantes.

Uma vez por semana eu fazia medições corporais.

Por exemplo, ver qual é o perímetro da barriga, ver se tem alguma infeção no ouvido

e ajudar também a recolher batata doce, bananas, canas de açúcar,

porque eles tinham que comer cerca de 200kg por dia.

Então o meu trabalho era acompanhá-los e garantir que eles estavam a comer e a ser bem alimentados.

A qualquer coisa de pacífico que eu encontrava na presença desses animais

era muito impactante perceber o quão a nossa espécie é insignificante a relação a outras,

porque qualquer coisa que acontecesse, qualquer aneio que um elefante tivesse,

podia acabar com a minha vida ali, porque eu não tinha proteção nenhuma.

Mas ao mesmo tempo é entender em que casa é que eu estava e aquela casa era a casa deles

e eu tinha que respeitar o espaço deles.

Ao mesmo tempo, o respeito que eles têm por os elefantes impressionou-me bastante.

Isso faz com que relativize a nossa importância, o nosso lugar, aquilo que somos.

Sim, a pensar sempre na unidade, sabe?

Nós passamos demais e há tempos na nossa ilusão de que caminhamos separadamente.

E a verdade é que temos todos o mesmo fim.

Portanto, é sempre mais uma lição de humildade.

A cada viagem que faço fica um mais humilde e mais...

incapaz quando volto de produzir esse egoísmo.

Nós trabalhamos numa área com uma exposição mediática enorme

e esse é um dilema que eu tenho tentado resolver.

Por últimos anos, que é um artista precisa de ego para se mostrar de alguma forma

e eu, ao mesmo tempo, estou num processo de diluição desse próprio ego

que me afasta dessas coisas todas, então é um paradoxo.

O que é que aconteceu ao teu trauma?

Eu gostaria, foi mais um passo para tentar resolver.

Este é sempre um diálogo com a minha voz interior.

Dáis por ti a ter pena ou lamentar aquele puto, aquele puto Ângelo.

Não, de tudo.

Cada vez mais vejo que, perante as ferramentas que tive nessas fases da vida

fiz sempre o melhor que pude e vejo-se sempre com orgulho

porque presenciei coisas que não gostaria de ter presenciado

passei por coisas também que não gostaria de ter presenciado

mas, enfim, foram importantes para eu hoje em dia poder refletir nelas

e consegui ser uma pessoa melhor.

É como se a infância e a deslicência fosse o chão que nós pisamos para o resto da vida.

Com esse despojamento, com esse desapego e nessas viagens

tu vives de quem?

Com que economias?

Trabalho como vão dando.

Eu tenho tido sorte com isso.

Felizmente.

Só que não vejo a minha profissão como um trampolim

para acumular uma grande fortuna.

Porque não há coisas mais importantes do que isso, não é?

As melhores coisas da vida não são coisas importantes.

Se o que vamos levar das nossas vidas

são só as memórias e as conexões reais que fazemos

é só nisso que eu estou empenhado.

Não tem que comer numa suíte presidencial ou num triplex

e ter um carro xpt ou não.

Eu preciso do básico para viver, dos mínimos para garantir a minha sobrevivência

porque o resto me torna muito mais rico

mas, de uma forma,

eu lembro-me que o último mês que eu fiz no Tamboja,

depois do voluntariado, a minha viagem era para ter terminado

no 3º mês ou 4º mês

e acabou por prolongar-se até o 5º mês.

Eu pensei assim, vou voltar para Lisboa em dezembro 1º.

Um friso carassas.

Depois, não tenho trabalho ainda nenhum marcado.

Alugar uma casa na capital, iria ser muito caro.

E comecei a pesquisar porque é que eu não procuro

aqui um lugar para ficar um mês, um bungalow,

um lugar para ficar um mês.

E fui exatamente o que eu fiz.

Encontrei um bungalow onde eu pagava 10 euros por dia

mas, em frente ao Mardin, aquelas águas paradisíacas.

Eu pensei, ok.

Então, para 300 euros por mês

e, se eu voltar para Lisboa e gastar o triplo,

se calhar, vou ficar aqui.

A despedida do Nepal é marcante, para ti?

Sou muito, foi das experiências mais impactantes da minha vida.

O facto de estar há 2 meses

é que eu tenho que estar aqui.

O facto de estar há 2 meses com 3 turmas

e a viver com 150 monjas

não mostrei o budista perto do Nepal.

Foi muito impactante.

Inicialmente, eu tinha um objetivo.

Eu gostaria de pôr monjas a fazer teatro.

E eu achava que isso era uma tarefa impossível

porque não tinha referências.

Absolutamente nenhuma de pessoas tivessem feito o mesmo.

Então, tentei ir por outro lado.

E os contactos que eu fiz, era como o professor de inglês

porque eles aceitavam voluntários para ensinar inglês.

Então, eu fui nessa condição, meio que camuflado.

E aos poucos, eles foram percebendo o que eu fazia,

qual é que era a minha profissão.

E quando chegou ao momento de eu lhes propor,

gostaria de fazer um espetáculo de teatro com vocês.

E eles, prontamente, disseram que sim.

Então, numa das aulas, eu propunho-lhes,

vocês hoje vão para o quarto, vão pensar em situações

que gostariam de falar no espetáculo de teatro.

E inicialmente, a coisa não foi bem vista

pelo Campo, o que é o monge que geria o mistério.

Porque este estrangeiro está aqui

a fazer com que eles lidem com emoções.

Eles não estavam assim muito confortáveis.

Então, tinha que ser assim uma abordagem bem leve.

Mas a coisa deu certo e eles adoraram o espetáculo.

Fizemos o espetáculo final, conseguimos reunir os 150 monges

para estar na assistência.

Foi a primeira vez que eles tiraram a túnica deles

e puderam vestir roupas do acidente.

Estavam muito felizes com isso.

Eles não falam de sentimentos.

Então, chegou esta pessoa do outro lado do mundo

para pôr-los a tocar em uns nos outros.

Por exemplo, um põe uma venda e o outro

fica só a tocar na cara e a perceber como é a textura da cara.

Isso para eles no início era muito...

Não quero fazer isto.

É um mistério exclusivamente masculino.

Então, isso é uma afrontar masculinidade deles.

E no final, eles escreveram uma quantidade de cartas

que eu sabia que não podia ler à frente deles.

Fui para o quarto no último dia para ler essas cartas.

As coisas que eles diziam são tão impactantes

que depois dessa experiência me fizeram querer

porque eu poderia percer

porque já tinha a minha missão feita neste lugar

porque sinto-me valioso de uma forma

que de aqui não me sentiria.

E não me sinto mais um.

Sinto realmente que as pessoas me veem como eu sou.

Em vez de andarmos aqui distraídos,

como todos andamos aqui e a fingir

que nos ouvimos uns aos outros,

ou quando perguntamos se está tudo bem

ou se está realmente interessados no que o outro está a dizer.

E lá não havia tempo para isso.

Há tempo para olhar pelo outro.

Há ainda um momento nesta experiência

em que tu entregas a camisola da seleção.

Foi no último dia, boa.

Caramba.

Sabe que essa camisola da seleção tem uma história

porque quando eu fiquei em coma

depois precisei fazer fisiotrapia

quando sei do hospital,

dois meses depois de internamento,

a federação portuguesa de futebol

predispôs-se a ajudar-me com todos os tratamentos

que fossem necessários.

E foi aqui que entrou o mago da minha recuperação

chamado o António Gaspar

e a parte desse brinde que tive

ofereceram-me uma tixera da seleção com o meu nome.

Então eu achei que para fechar este ciclo

deveria levar a camisola comigo

para esta experiência do Impal.

E no último dia foi uma feliz coincidência

porque não sabia que eles eram tão aficionados por futebol.

Também lá o Cristiano Ronaldo

foi um ótimo cartão de visita

porque toda a gente conhecia, não é?

Então deles a tixerte no final como símbolo

de fechar um ciclo.

Eu já estava a viajar há uns três ou quatro meses.

A tixerte nunca saiu da mochila

e serviu-se só para esse momento

para deixar lá.

Foi uma passagem de disto muito.

O que é que significou para ti esse renascimento?

É a oportunidade de fazer as coisas agora

com uma outra visão,

com uma outra calma, a retirei assim

as coisas que não interessavam

e focar-me mais no caminho

da pessoa que quero ser.

Pensaste que podias morrer?

Várias vezes, claro.

A partir do momento em que acordei

do coma de quatro dias,

toda a gente que estava à minha volta

via os semblantes muito carregados

e eu não entendia bem o que estava a acontecer.

No início, tive que fazer um tratamento

que tinha que ser feito logo,

um tratamento numa câmara hiperbárica,

ou seja, acelerar a oxigenação das minhas células

para conseguir receber um encherto de pele

que eu precisava para conseguir salvar a minha perna.

Todo esse processo foi muito violento

nas primeiras semanas e entendia pelo semblante

das pessoas que a coisa não estava...

não estava famosa.

E via pela cara dos enfermeiros

e pela cara dos auxiliares

de enfermagem

que a coisa era séria.

O limiar da dignidade humana

que eu senti lá e lembro-me

perfeitamente desses momentos, Daniel,

como, por exemplo, fazer a minha higiene pessoal

as primeiras semanas, pós coma.

Não tinha autonomia absolutamente nenhuma.

E então tinha sempre duas pessoas,

duas mulheres ou dois homens,

a tratar da minha higiene pessoal,

ligado, por um lado, como malgália na uretra,

e por outro lado, fazer as minhas necessidades,

mas tinham que limpar o meu corpo.

Sentia-me como se fosse um verme, não é?

E isso era... era esmagador para mim

estar nessa posição.

Como assim chegar a esta idade

e não ter autonomia absolutamente nenhuma?

Ou, depois, quando me iam dar banho,

tinham que lavar tudo, não é, com a esponja?

E lembro-me perfeitamente de um momento em que

um enfermeiro, o Manel Agallardas,

depois de umas semanas em que...

eu tinha sempre que me concentrar bastante

para não desabar emocionalmente naquela coisa

de não conseguir mesmo lavar o meu corpo

e não conseguir fazer absolutamente nada.

Tinha que fazer tudo por mim.

Recordo um momento em que o Manel me deu a esponja

para eu me limpar pela primeira vez

e dito isto, esta distância parece uma coisa ridícula,

mas aquilo, naquele momento, o meu universo inteiro

estava concentrado naquela tarefa

e aquilo era o trampolinho, o início da minha recuperação,

o recuperar da minha dignidade

e o avançar para depois para a recuperação.

Português procuraste dar ânimo

às pessoas que estavam mais pessimistas?

Deve dizer que, nas visitas,

as pessoas tinham sempre a sequidade

de não passar essa negatividade,

porque eu entendia que

toda essa clima negativa

já gravitava ali à volta do hospital e na imprensa.

Portanto, sentia que, como estavam preocupados

com o meu bem-estar emocional,

as pessoas preocupavam sem ter sempre um sorriso na cara

ou, pelo menos, dizer coisas positivas.

Nas duas primeiras semanas, fui proibido

de aceder a telemóveis e revistas,

até, por exemplo, a televisão.

Se estava a dar um programa da manhã,

os enfermeiros vinham logo lá a desligar

porque ficavam com medo que se falasse alguma coisa de mim

e aquilo tivesse repercussões,

meu ânimo e tal.

Passado essas duas semanas,

foi-me dada a possibilidade de ter de volta

os meus aparelhos e eu decidi que não queria fazer.

Portanto, durante o período de entrenamento,

portanto, durante esses dois meses,

não vi absolutamente nada do que foi escrito

e do que foi dito,

só quando saí do hospital

e aconteceu uma coisa caricata, curiosa,

que é como se eu assistisse

ao meu funeral digitalmente.

Quando uma pessoa falece,

muitas pessoas escrevem uma boa experiência

que teve com essa pessoa e tal,

a notícia da minha morte apareceu eventualmente,

no período em que eu tive o entrenamento.

Felizmente deu certo, mas quando eu saí,

eu pude ver essas mensagens, esses péssimos

e tu é como se eu assistisse ao meu funeral digital

e como se eu tivesse um spoiler

do que vai acontecer quando de facto morrer.

O que é que foi o mais duro de tudo para ti?

Sentir-me completamente desventrado na minha intimidade,

Daniel,

considera-me um gajo obstinado

que só quer é fazer bem as coisas,

uma constante pulsão entre esconder-me e comunicar.

Essa é a minha expressão partística humana.

Sentir que quase na altura 15 anos de carreira

foram reduzidos a um ato,

é de um desalento enorme,

de ver como isso foi aproveitado

de forma escabrosa para os organismos dos mídia.

Foi muito impactante para mim e é muito violento,

sentindo-me bem massacrado.

Não é de toda a atenção que eu queria para mim.

Se parte das minhas atitudes,

ou trabalhos, ou entrevistas,

ou caminho todo que eu fiz até aqui,

me colocou neste lugar onde me julgaram,

onde disseram comentários em relação a uma coisa que fiz.

Se foi tudo reduzido a isso,

então provavelmente eu tenho que ficar mais resguardado

ou tenho que mostrar menos e ficar mais na minha,

porque sim, era um lugar que eu não queria estar

e não quero, mas infelizmente aconteceu.

Não posso fazer esse momento.

Portanto, é apanhar os cacos no chão

e tentar colar-me outra vez.

E hoje, como sentes que olham para ti,

como é que tu vives hoje com isso?

Com esse episódio tão traumático?

Depende das abordagens por cá.

Há pessoas que só me conheceram através desse incidente.

Portanto, eu continuarei a ser só isso,

independentemente do que eu faço,

porque não seguem o que eu faço.

Eles percebem o caminho que fiz

e a luta que insetei nestes últimos anos.

Portanto, são palavras de incentivo e galvanizadoras.

Passaram quatro anos e ainda há muitas pessoas

que me abordam a falar disso.

E por mais que seja uma coisa que eu já tenho ultrapassado,

em cada abordagem que me fazem com esse teor,

eu volto outra vez àquele lugar.

Não é uma coisa que me agrada muito,

mas eu sei que vem de um bom fundo quando me abordam.

Portanto, faz parte do jogo.

O que é que centes que tiveses de sorte?

Os profissionais que tiveram comigo, num hospital,

na prontidão com que me trataram,

nas pessoas que se juntaram à minha volta

para me ajudarem no meu recomeço.

A recuperação, como é que foi? Foi longa?

Foi uma recuperação longa, de quase um ano.

Passei para várias fases, não é?

A primeira, quase perder a vida,

depois da possibilidade de perder a perna,

depois da possibilidade de não andar mais,

depois da possibilidade de não correr mais,

eu fui passo a passo conseguindo ultrapassar essas dúvidas que havia.

Fisiotrapia diariamente, muita força de vontade.

Eu sabia que, de alguma forma, estava a pagar pelos meus pecados,

portanto era uma coisa que eu tinha que passar.

E é uma coisa importante.

Aceitava tudo que me propunham,

porque sabia que era para o meu bem, não é?

Foi um processo moroso, mas que, felizmente, consegui ultrapassá-lo.

E hoje, como é que estás?

Estou bem. Estou bem. Estou em paz.

different from above

Ainda tenho que fazer algum tipo de exercício.

Estou completamente funcional.

Felizmente, consegui recuperar a 100%.

Há possibilidade de fazer outra cirurgia,

mas é uma questão mais estética,

porque a cicatriz que tenho,

tem uma extensão de 90 centímetros,

que é praticamente metade do meu corpo.

E, como meu corpo foi aberto de uma vez só,

depressões estão meio irregular. Então, as operações todas que eu vim fazendo

pós-entrenamento foi para melhorar essas questões e tratar de várias partes da

perna. Portanto, é possível que eu tenha que vir a fazer mais uma. É sempre

muito chato, porque é uma montanha russa chata de se atravessar, porque é todo

o processo de fazer mais ou menos de dia geral, de ser operado. Foram muitas

operações. Sim, foram 12 até agora, 7 no hospital e depois 5 fora. Os altos e

baixos, não é? Porque depois, inevitalmente, acabo por ter peso e ficar em casa

mais 2 meses e é todo o processo de reconstituição da minha autoestima dos

2 anos seguintes, pós-entrenamento, pós-hospital, foram complicados.

O que é mais difícil? Recuperar a minha autoestima e a confiança

em mim próprio, porque, inevitalmente, ganhei vários medos e o objetivo era

conseguir acalmar essas vozes do interior, esses fantasmas que nos percebem

constantemente. Um fantasmo de culpa? Não culpa de ser insuficiente. E a

tua busca é muito para colmatar essa suposta insuficiência? Sim, calculo que sim.

Essa coisa de estar constantemente à procura do meu valor, de entender o que

é que realmente valho, que é o síndrome de impostor, não é? De sentir que faço

as coisas mas não merece bem o que vem depois. Não consigo receber um

ilugio, é uma estupidez. Com mais facilidade da minha importância a um

insulto, do que uma palavra ilugiosa, é como se eu tivesse um filtro para

qualquer coisa que me escrevam ou digam, eu não consigo processar simplesmente

quando é uma palavra ilugiosa. É uma coisa que eu preciso de resolver em mim.

Quando olhas para a cicatriz, estás sozinho? Sentes a benção da vida? Sentes a

sorte? Sentes o que? A cicatriz tem um estranho poder de lembrar que o meu

passado é real. Então eu tenho um orgulho, tenho mesmo orgulho, eu gosto

mesmo da marca com que fiquei depois do acidente, porque é isso. Eu já tive

aqui. Lembram-me todos os episódios que passei. Portanto, quando eu estiver

embaixo, lembraram-me sempre de que eu já tive lá embaixo, portanto, nada há

de ser tão mau como o que aconteceu. As viagens que fizeste depois disso

também te ajudaram a recentraste a sair do todo o barulho. As viagens começam

sempre com uma certa fuga aos condicionalismos sociais. Também, no meu caso,

há uma exposição mediática que tinha uma connotação que eu queria fugir e

então senti durante uma boa parte de tempo que Portugal era um pouco

claustrofóbico para mim, porque precisava de espaço para me reconstituir

sozinho. Poder lamber as feridas sozinho, fazer essa psicanálise comigo.

Como é que foi a viagem à China com o turma? Foi uma experiência bastante

engraçada, porque eu e minha irmã não nos vemos assim contata de frequência,

mas o hábito nos juntarmos no Natal. Então, quando eu fui ao norte,

a minha irmã tirou a pergunta, antes de nós nunca viajámos juntos,

porque é que não fazemos uma viagem para nos conhecermos enquanto adultos.

Deixei uma ótima ideia, começamos a ver países e então pensámos na China,

porque nós queremos muito ir ao Tibet. E quando começamos a pesquisar sobre o

Tibet, percebemos que a 600 km estava uma coisa chamada Monte Everest,

que é a maior montanha do mundo, e sabemos que havia a possibilidade de ir até

o primeiro acampamento de base que fica a 5.200 m. O Everest tem 8.848 m.

Então, isso pareceu uma boa forma de pôr à prova a nossa relação.

Começámos em Beijing, mas a real viagem começou através de uma viagem

de comboio que parte de Shanghai até Lhasa, que é capital do Tibet,

que é uma viagem de 48 horas sem paragens. E é ótimo porque é uma viagem

que começa nos zero graus, em Shanghai, e aos pobres a altitude vai supindo

até chegar aos 2 ou 3 mil em Lhasa. Foi uma série de peripécias que

aconteceram num mês de viagem com a Minha Nã, que foi bastante especial.

Somos personalidades diferentes, havia sempre uma discussão semanal,

mas foi bom, mas temos um outro entendimento como irmãos e adultos.

Dessa viagem à China, qual foi o momento mais emocionante?

O nascer do sol com uma temperatura de 26 graus negativos

foi muito importante para mim e para a minha irmã, porque foi uma sensação

de conquista passado um mês de viagem em que só comecemos temperaturas

negativas, sabíamos que íamos sofrer no Everest, e para além desses

26 graus negativos, a refeição do oxigênio fazia-nos sentir

constantemente cansados e as próprias extremidades do nosso corpo,

dedos, nariz, começavam a ficar roxas, e então nós passámos ali por

períodos de preocupação, mas ver o sol a nascer por trás daquela

ponta de granito, não é? Aquela era tão magnânimo e soberbo, era de uma

sumptuosidade tal que é difícil colocar em palavras.

Há muitos períodos de silêncio nessas viagens, muitas, muitas.

São autênticas aulas de psicanálise, porque muitas das viagens que faço

são sozinhas. A última viagem que fiz foi durante cinco meses,

em que eu tive acompanhado três semanas, o resto foram viagens

solitárias de autoconhecimento, ainda há muitas coisas para resolver

em ti ou cada vez menos, cada vez mais, porque a partir de momento

tem que se tapar um buraco, aparece outro, ainda sendo que tentamos

tapar um buraquinho, aparece uma outra questão, e uma outra questão,

mas acho que é isso que é viver, não é? Nós irmos desbloqueando e

desatando alguns nós, para ver se chegamos a algum ano.

Da Amazônia trouxeste o que, da aprendizagem?

Quando tive lá em 2016, propusmo fazer uma experiência de

sobrevivência com o Paulo Vintain, que veio comigo, nós não sabíamos

que íamos ter contacto com uma tribo indígena, o contacto com

essa tribo foi muito impactante, porque fez-me entender o verdadeiro

lugar da natureza, fez-me entrar em simbiose, com o mundo à minha

volta, de uma outra forma que nunca tinha estado antes.

Também no Brasil viveste uma experiência de internacionalização

profissional, como é que ocorreu? Correu francamente bem.

O processo até lá foi o mais interessante, eu recuperava

da décima segunda de cirurgia, quando o agente brasileiro me disse

que tinha um casting, uma self-tape que eu precisava de apresentar,

um vídeo gravado em casa, e que eu tinha 48 horas para o entregar.

Não me disse para o que é que era, basicamente, eu, nessas 48 horas,

saí do hospital, vim para casa, com duas moletas, sem conseguir

andar, e tinha três cenas para fazer. Nessas três cenas havia

uma pequena indicação, na primeira era um plano apertado,

ok, consigo fazer isto. Não tenha a menor dúvida de que você

é talentosa. A segunda, um plano médio,

não consigo parar de pensar em você. E a terceira cena dizia lá,

personagem anda pelo espaço, e eu pensava assim, como é que eu vou fazer

com o que eles não percebam, que eu estou impossibilitado.

Lá consegui fazer as cenas, envei para o meu agente brasileiro,

o que é certo é que no dia a seguir, o meu agente liga-me, e diz

que eu tinha ficado com o papel, e o que é que acontece nesses dias?

Maria João abriu o foseu, e aconteceu o velório, e o funeral,

e eu claro que obviamente tinha que estar presente no velório, na minha

ida ao velório, houve alguma imprensa, portanto, fui fotografado

a andar de moletas, e chegou ao Brasil, e então, dois dias

depois, o meu agente liga-me a dizer, eles viram que tu estás de moletas,

a série que vais fazer tem um grau disposição enorme,

então, nós queríamos pedir-te uma foto da tua cicatriz,

e um vídeo teu a correr. E eu pensei assim,

como é que eu vou fazer isto? Como é que eu vou fazer isto?

E lembrei-me, assim que fez o documentário sobre a minha recuperação,

e no final, eu apareço a correr na praia.

E enviou isso, eles deixaram estar ok, viram mais umas notícias,

e pediram para eles, por favor, que podes fazer um vídeo em casa,

para dar uns saltinhos, e dizer que está tudo bem,

baixei as moletas, dei assim tipo uns saltinhos,

cheguei à frente da câmera e disse, está tudo bem.

E foi assim que eu fiquei com o papel.

Está tudo bem.

Trabalhar-te como uma coordenadora de cenas íntimas,

uma coordenadora de intimidade.

Isto foi um cargo que surgiu depois do movimento mito nos Estados Unidos

para precaver alguns abusos que acontecem no trabalho.

E como a série tinha uma grande disposição do corpo,

e havia várias cenas de intimidade,

eles sentiram que fazia todo sentido

haver-se interesse com o ordinário.

Então, e foi a primeira vez que no Brasil tiveram esse cargo,

e foi muito interessante, Daniela, ver,

uma americana a ensinar os brasileiros

como se comportar na cama.

E isso encontrou alguma resistência no início.

Porque nós fazíamos alguns exercícios, imagina,

eu vou abraçar a atriz com quem vou contracenar,

então tinha que pedir, posso entrar no teu espaço?

Outra pessoa dizia, posso entrar numa espaço.

Então eu dizia, posso dar-te um abraço?

Vamos fazer um abraço com pélvis, um abraço sem pélvis.

E nós chegamos assim.

Há vários tipos de abraços, como assim?

Então, depois começamos a entender as diferenças de nós,

começamos muito mais calorosos e do toque.

Quando damos um abraço, damos um abraço completo.

A dos americanos ou outras culturas,

o abraço não pode ter contacto com a pélvis.

Ou seja, para ver uma certa distância, porque não há intimidade para isso.

Obviamente que era essencial ela ter estado lá,

e depois fomos trabalhando as liberdades de cada um,

as sedências de cada um,

e trabalhar essa coreografia

antes de irmos para as gravações,

para estarmos confortáveis com aquilo que estávamos a fazer.

Aqui a preparação é mais do box?

Aqui é mais do box.

Livá-las com o Paulo Seco,

e ele tem me dado uma ajuda preciosa,

porque cheguei com muitas dúvidas

se conseguia fazer isto em pouco tempo,

e acho que tenho saído bem.

E lembro-me de Rock e Balboa.

Sabe que era uma referência que eu e meu pai gostávamos muito de Rock e Balboa?

Eu passou nessa paixão.

Portanto, quando aceitei fazer este papel,

obviamente vieram bastantes mortes,

e nós tínhamos um sonho que eu ainda não concretizei,

porque, infelizmente, eles já não está cá,

que era, e em todos os filmes do Rocking,

eu fazia sempre uma corrida pela cidade de Filadélfia,

até subir a escadaria de Filadélfia e chegar lá acima,

e fazer um sinal de vitória.

E eu tinha esse sonho como o pai de fazer essa corrida

e subir essa escadaria.

Não consegui concretizar esse desejo,

mas tenho muita vontade de o fazer em honra ao meu pai.

Voltar a trabalhar com colegas com quem já trabalhaste

é um feliz reencontro, completamente.

É uma das coisas que me motiva,

para além da história, obviamente, e da composição da personagem,

é trabalhar num ambiente saudável e com pessoas que gostem.

Isso nasci que sempre aconteceu.

Acordo sempre com muita vontade de ir trabalhar,

precisamente porque são pessoas com quem me dou bem e gosto bastante.

Obrigado.

Mais uma vez.

Perda da Marismo Abreu, que aconteceu de 2020,

marcou-te, de que forma?

Ela que pôrou todas a segurança do hospital para te visitar,

ela que fez sempre um apoio, marcou-me muito.

Foi com o mínimo a me pesar e tristeza ver o que ali aconteceu.

A equipa que me salvou no hospital

foi a mesma equipa que esteve com ela também

e que ela não teve a mesma sorte que eu.

E ver que uma alma tão boa e tão pura,

se foi assim de um momento para o outro,

é muito injusto.

O que ela disse no hospital?

Diz-me coisas ótimas.

Demos novidades do ilenco,

dictavam todos a mandar força.

É para onde sempre palavras assim de incentivo e palavras bonitas,

de ânimo, para eu ter o espírito lá em cima.

Mas tão bonito.

Mas tão, estás tão lindo.

A natureza responde a muitas das suas perguntas,

mais do que as pessoas.

Algumas, não é?

Porque eu preciso da convivência humana para amadurcer

algumas coisas que penso sozinho,

acho que as coisas se componentam.

Por um lado procurar a companhia

para comatar o tédio da solidão,

mas ao mesmo tempo não se sentirmos suficados com a companhia

e procurar esses lugares sozinho.

Escreves-te sobre o alasca que gostas do lado cruel

que a natureza também tem,

em que medida que te atraias a esse lado.

Tudo que me põe em contato com a minha insignificância

e a experiência que eu tive numa alasca,

perante uma natureza tão inhóspita.

Com o Pedro Sosa, acabámos durante 15 dias

e tínhamos que fazer longas distâncias de carro

e passávamos por várias autostradas

e não devíamos glaciares gigantescos e planícies.

E um momento tenhas enormes.

E numa viagem de três ou quatro horas,

nós começávamos a viajar e dizer

que é incrível, brutal, espetacular.

Passado 20 minutos, perdíamos os adjetivos

porque era completamente embaixo bacante

a insignificância que nós sentimos

perante uma coisa que é tão grande

e que é mais um banho de humildade.

É hoje um homem mais feliz do que alguma vez foste

para ocorrer,

mas procuro não estar obcecado

com essa busca pela felicidade.

Sei que essas experiências que vou tendo

me vão enriquecendo como pessoa

e que isso será o combustível para a minha felicidade.

O que é que mais te orgulhos no teu percurso?

A forma como tenho ultrapassadas adversidades.

De ter a clara evidência de conseguir ultrapassar

essas adversidades com alguma inteligência.

De que é que já desiste isto?

De pessoas negativas,

de pessoas tóxicas

consigo olhar hoje para a minha vida

como se conseguisse,

selecionar exatamente o que deixo entrar.

E tenho cada vez mais essa perceção

e essa capacidade de perceber à distância

o que é que uma pessoa me vai trazer.

O que é que já fizeste pela última vez?

Bom, não me poria na mesma situação

que me levou à minha quase morte,

portanto isso provavelmente não voltaria a fazer.

E se tivesse a hipótese de fazer o que quisesse,

o que é que farias agora, hoje?

Tio, e viajar Daniel?

Porra, agora dar-me a volta ao mundo.

Tô há anos a dizer isso.

Quer dar-me a volta ao mundo e ainda não consegui.

Se pudesses regressar um momento do teu passado,

onde é que repissaries?

Talvez eu voltasse à minha ausliência

ali aos 13, 14 anos

para tentar responder de uma outra forma

ao bolinho de que fui Aldo.

Já conheço de cabezola.

Exato.

Agora é que vocês vão ver.

Não, não, não.

Mas pelo menos para aprender a defender-me,

a ter uma outra estrutura para aguentar.

Porque sei que essa experiência

foi fundamental nos alicerces da minha personalidade.

Se pudesse voltar atrás,

conseguia comatar melhor isso.

Só para estar melhor aqui hoje em dia.

As memórias mais fortes são as boas ou as mãos?

As boas, as boas sempre.

Tenho muitas boas memórias,

mesmo com relações passadas

e isso tento sempre olhar pelo lado positivo

do que essa pessoa me trouxe na vida.

Qual foi o pior dia da tua vida?

28 de agosto de 2019,

o dia em que dão entrada no Hospital Garcia de Horta

e entrou em coma durante quatro dias.

Para mim, foi o pior e o melhor dia da minha vida

porque isso acabou por editar o meu destino a partir daí.

Qual foi a melhor manifestação de amor que tiveram para contigo?

Foram tantas cartas que me escreveram,

pessoas que vinham visitar ao centro de fisioterapia,

vinham esperar porque viajaram de uma parte de Portugal

para me dar força.

Foram muitas nesse período

e encontrei ali o mundo de amor que até então não conhecia.

Você que eu vivia na idade do gelo

e foi preciso esse amor para me aquecer um pouco

ou para derreter um pouco esse gelo.

O tempo gosta mais de menos pessoas ou menos de mais pessoas?

Gosto mais de menos pessoas.

A vida vai sendo esse funil, não é?

As relações duradouras e as grandes amizades

nascem geralmente em períodos primários da vida,

ou seja, na adolescência,

porque temos muito tempo livre,

temos muito tempo para sentir tudo

e poucas responsabilidades.

E depois na vida adulta, algumas pessoas vão ficando pelo caminho

e vão ficando sós que importam.

Temos mais dificuldade em manter as relações da nossa vida adulta

porque a nossa vida é muito ocupada

e, portanto, quem vai ficando

é porque realmente merece estar.

O que tens mais medo de perder?

A vida.

Não quero...

Não quero perder a vida agora.

Não me apetece nada, pá.

Na princípia, estou fazendo uma novela agora, Daniel.

Falecer agora era uma coisa que não está nos meus próprios.

Se fosse garantido uma resposta a uma qualquer pergunta tua,

o que que tu querias mesmo saber?

As questões de onde é que vemos,

porque é que estamos aqui e para onde é que vamos?

Eu ando constantemente a tentar perceber

e a tentar responder estas perguntas.

Se houvesse uma pessoa que me conseguisse responder a isso,

eu já perderia muitas das minhas inquietações.

Morro-se e acabou.

Sendo a religiosa,

ou seja, não está desvinculada nenhuma religião,

eu comecei a flertar com algumas religiões

desde essa experiência que o Lucidante tive.

As vezes que eu fiz no Nepal,

eu comprei os livros sagrados de algumas religiões do Oriente,

o Dhamapada, do Budismo,

o Tauteking, do Taoísmo,

o Confuciunismo, os Analetos,

para conseguir entender estas questões.

Então aprendi que há várias formas de interpretar a morte

e uma delas foi uma das que presenciai lá,

um hábito Windu,

que é a cremação ao ar livre.

Portanto, imaginar que uma pessoa da tua família morre

e organiza-se uma cremação para toda a gente ver,

mas ao invés de ser uma coisa cristã ocidental,

de pesada e de chorar pelo fallecido,

não contratar umas bailarinas, uns músicos,

e vamos fazer isto um momento de celebração,

porque para o hinduísmo não existe morte,

existe um ciclo eterno entre vida e morte.

Isso é um ritual de passagem.

Acho que isso é uma ideia mais interessante da vida,

porque a religião acaba de ser um ensaio

para essa catástrofe que é a morte,

que nós não conseguimos processar,

por isso quero acreditar que existe mais alguma coisa.

Sendo-se aqueles que partiram,

gostaria de sentir mais.

Eu tenho alguns bloqueios e a forma como o processo a morte

ainda é uma coisa que é muito presente

e que eu preciso de resolver.

Eu fui lidando com a morte várias vezes durante a minha vida,

já não tenho a voz, perdi o meu pai, perdi o meu irmão,

e são coisas muito impactantes

e talvez para uma questão de sobrevivência,

sinto que não consegui processar ainda essas mortes.

Portanto, é um tema muito sensível,

mais cíntuas, mas não de forma tão presente quanto gostaria.

Alguém te deve um pedido de desculpas?

Acho que não.

Acho que tem as coisas saudadas

e se alguém tiver alguma coisa para dizer,

que venha a falar,

porque sinto que deixei tudo falado.

Próxima viagem será uma.

Uma viagem que gostaria de fazer,

mas esse país agora está em guerra.

Gostava de fazer a viagem do convoy transciberiano,

que começa em São Petersburgo e depois há duas rotas.

Uma delas termina em Piquim

e a outra vessa, acho que durante 12 dias,

a polícia inteira passa pela Iberia

e termina numa cidade chamada Vladivostok.

Eu quero fazer essa viagem

e depois talvez irá ao Japão.

Qual é o papel principal que este teu Fredo

quer ter aqui no nível?

A minha semência é um gajo combativo,

é um romântico, porque encontrar uma paixão de adolescência,

uma paixão antiga, uns primeiros amores,

quando não são bem resolvidos,

tem que fazer alguma coisa para encaixar.

E, então, ter contacto com essa personagem,

que é a Aurora, passado tantos anos,

avala um bocadas estruturas do Fredo,

porque ela era um homem bem casado,

com a vida instituída,

mas ao mesmo tempo eu acho que ela é uma força da natureza

e que é líder por natureza,

e as pessoas seguem-no.

Ou seja, ela tem uma voz que as outras pessoas dão um valor.

O que é que tu anos lutem saudades?

De não ter responsabilidades.

Às vezes gostaria só de dizer

não ter tanta coisa para responder,

tantos afazeres e condicionalismos sociais

para tratar e a poder voltar um pouco à adolescência,

por exemplo.

Se encontrasse aquele anjo de 13, 14 anos

e que sofre de bullying,

o que é que tu hoje dizias?

Diria para não perder a calma

que as coisas iam dar certo,

que ele ia encontrar alguns percalços na vida,

mas para manter o seu lado obstinado e determinado,

porque isso com certeza lhe daria e deu frutos.

O que é que dizem os teus outros?

Dizem que eu ainda tenho muito para descobrir neste universo,

muito por desvendar os mistérios do universo

e que nunca depender de mim

faria de tudo para ostentar desvendar

até o dia em que eu morrer.

Obrigado.

Foi?

Era, meu Deus.

Pô, estávamos em um combate agora?

Vamos, vamos, vou só calçar as dúvidas.

Vocês estáis preparados?

Você gosta de treinar?

Não, não.

Vamos ver então.

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Depois das curvas sinuosas que enfrentou devido a um problema de saúde. restou-lhe aplicar um gancho ao azar para mudar o seu destino. Hoje sente-se inteiro perante a vida, tendo a consciência que tudo é efémero: “É preciso entender a validade de cada momento”. Viajante compulsivo, afirma que tem “andado pelo mundo” não tem centrado nele próprio mas em busca daquio que são as necessidades do outro. Diz sentir-se confuso sempre que regressa de uma viagem ao pousar os pés no nosso país, na hora de ser “devolvido ao Ocidente, tendo a necessidade de “refletir” sobre o que aprendeu. Ouça mais um Alta Definição em podcast.   

 

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